Zona Sul
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Por — Rio de Janeiro

Quem frequenta bares e hotéis com cartas de drinques na Zona Sul já deve ter reparado uma movimentação feminina por trás dos balcões. Cada vez mais mulheres vêm ocupando espaço na coquetelaria, ambiente até há pouco tempo predominantemente masculino. Além de compor os menus de bebidas com os seus coquetéis exclusivos, elas conquistam prêmios em concursos do gênero.

Um dos nomes que se destacam nesse novo cenário é Laura Paravato, que assina a carta de seis casas: Maria e o Boi, Baduk, Tasca Miúda, Pabu Izakaya e Koba e Verso. Sua carreira começou em 2015, no Bukowski, quando estudava História na UFRJ e queria juntar dinheiro para uma viagem pela América Latina. Ela se apaixonou e mudou de carreira.

— Meu trabalho é voltado para a coquetelaria clássica, com técnicas modernas e utilizando ingredientes naturais e brasileiros. Busco preparar os ingredientes dar identidade ao produto final — avalia.

Laura conta que seu maior desafio no trabalho é ser mulher e mãe:

—Não só pelos horários e demandas, mas por ser um meio majoritariamente masculino, onde em geral homens impulsionam e aplaudem homens e o trabalho feminino segue em segundo plano e pouco reconhecido. Por outro lado, ser uma mulher em posição de liderança me fez desenvolver habilidades para liderar relações interpessoais, o que traz a esperança de que estamos criando um futuro melhor.

Laura Parvato: bartender assina a carta de seis casas  na Zona Sul — Foto: Divulgação/ Gabriel Savary
Laura Parvato: bartender assina a carta de seis casas na Zona Sul — Foto: Divulgação/ Gabriel Savary

A carioca Paula Diniz chegou a cursar duas faculdades, Ciências Sociais e Composição de Interiores, até investir no ramo da coquetelaria. Foi auxiliar de cozinha, o que, explica, ajudou-a a lidar com a pressão e os padrões e a aprender sobre a importância da apresentação da bebida. É ela que assina a carta de drinques do Babbo Osteria.

— Minha trajetória na coquetelaria começou logo após minha passagem pela cozinha, que me ajudou a conquistar mais espaços, graças ao aprendizado e aos insumos artesanais, mas também me deu um vislumbre do que é estar em uma profissão considerada masculina. Quase todo dia corrijo o nome da profissão, por me chamarem de “barman”. Fato é que sempre tive que validar meu trabalho muito mais que homens na mesma hierarquia que eu; trabalhar 12 ou mais horas por dia para provar que conseguia aguentar jornadas exaustivas — detalha.

Os homens nem sempre foram a maioria nesse universo. O primeiro bar de que se tem notícia no mundo foi criado na cidade de Kish, na antiga Suméria, onde hoje é o Iraque, 3.500 anos antes de Cristo. A gerente era uma mulher com o nome de Kubaba. Na época das tavernas também eram as mulheres que comandavam o negócio e até fabricavam a cerveja. Hoje, além de bartenders, elas se tornaram mixologistas conhecidas pela arte das misturas e a criação de experiências de sabor, além de disputarem o balcão com os homens.

Paula Diniz conta que até hoje corrige quando a chamam de "barman" — Foto: Divulgação/ Rodrigo Azevedo
Paula Diniz conta que até hoje corrige quando a chamam de "barman" — Foto: Divulgação/ Rodrigo Azevedo

Mercado masculino não intimida mais

Publicitária, jornalista e formada em coquetelaria e gestão de negócios de gastronomia, Marina Alice é quem assina a carta de drinques da recém-inaugurada Officina Local, em Botafogo. A carreira na área de Comunicação ficou de lado para que ela pudesse se dedicar aos ofícios de mixologista, bartender, consultora, educadora e curadora de insumos de pequenos produtores brasileiros.

— Quando decidi atuar na coquetelaria, percebi claramente que a assimetria na questão de gênero infelizmente ainda é muito presente no segmento de alimentos e bebidas. Da indústria aos balcões, passando por produtores e donos de estabelecimentos, é um mercado majoritariamente masculino e permeado por valores falocêntricos. Isso se manifesta na comunicação das marcas e até na percepção equivocada de que algumas bebidas seriam mais “de mulher” ou “de homem” — conta Marina Alice.

Marina Alice.Mixologista assina a carta com drinques brasileiros da Officina Local, em Botafogo — Foto: Divulgação/Any Duarte
Marina Alice.Mixologista assina a carta com drinques brasileiros da Officina Local, em Botafogo — Foto: Divulgação/Any Duarte

No Koral, a criadora dos drinques é Pamela Cavaleiro, de 27 anos, há nove na área. Sua carreira começou como recepcionista, bartender e subsommelière, até chegar à chefia.

— Tive a oportunidade de trabalhar com profissionais incríveis e renomados, que ajudaram a me transformar na profissional que sou hoje, chegando a mixologista e gestora de bar. No Koral tive a chance de criar do zero e imprimir minha personalidade no cardápio e na estratégia de ação orientada para benefício do negócio. Estamos abertos há três meses, mas ao todo eu já somo sete meses de dedicação à casa, realizando um trabalho com a certeza de que o que realizo hoje é reflexo de todos esses anos de história na área — diz.

Flávia Di é outra mixologista de renome. Em 2022, ela se destacou ao conquistar o Prêmio Gastronomia Preta na categoria Bartender, com uma versão autoral do coquetel Moulin Rouge. Flavia competiu ao lado de homens com um currículo extenso na coquetelaria, mas sagrou-se vencedora, tendo ganhado até moção de honra da Câmara do Rio. Hoje, integra a equipe do programa do GNT “Na piscina, com Fernanda Paes Leme“ e produz conteúdo para o site Receitas.com. Já deu palestras sobre suas receitas autorais de cerveja artesanal, geriu bares especializados em cachaças e cervejas artesanais e soma uma quantidade expressiva de cartas criadas, uma delas para o Zagga Pizza Bar.

— Um dos drinques disponíveis no Zagga é o vencedor do prêmio. Leva gim, coulis artesanal de morango com baunilha, calda de hibisco e mix de limões e alecrim e é aromatizado com casca de limão e finalizado com borda de mel com açúcar de hibisco — descreve a bartender.

Flávia Di: vencedora do prêmio Gastronomia Preta está em programa de TV — Foto: Divulgação
Flávia Di: vencedora do prêmio Gastronomia Preta está em programa de TV — Foto: Divulgação

Nomes femininos se destacam entre experts do Rio

Taynah de Paula acaba de assumir como chefe de bar do Elena e do Eleninha. Ela comanda a operação ao lado do premiado mixologista Alex Mesquita, que faz o criativo das casas. Assim como a maioria, ela também vem de outra área. Trabalhava com fotografia artística:

— Minha motivação veio das contas a pagar. É uma área muito carente ainda e com muita rotatividade, então, vi uma oportunidade de crescimento. Não importava muito quem era e nem a minha família ou o meu sobrenome, e sim o meu esforço e dedicação. Por sermos mulheres, temos que passar parte do nosso tempo provando que somos capazes, além de termos que nos impor muito mais do que o necessário — afirma.

Eleninha. Uma equipe de mulheres comanda o bar: da esquerda para a direita, Gabriella Moreti, Jéssica Cerqueira,Taynah de Paula, Evelyn Freitas e Milina Lopes — Foto: Divulgação
Eleninha. Uma equipe de mulheres comanda o bar: da esquerda para a direita, Gabriella Moreti, Jéssica Cerqueira,Taynah de Paula, Evelyn Freitas e Milina Lopes — Foto: Divulgação

Nascida e criada na comunidade, a bartender Isadora Abreu é a mulher do Mirante da Rocinha. O trabalho começou como freelancer de garçonete. Depois da pandemia, ela foi chamada para uma vaga de auxiliar de serviços gerais e só depois foi para o bar. Um dos sócios do restaurante ofereceu um curso de bartender e, desde então, ela busca se aprimorar.

— Vivo uma mistura de desafio e coragem, além de uma sensação boa quando vejo um cliente saindo satisfeito com o serviço. Para ser bartender mulher, você precisa aprender que nada é impossível. É preciso sempre se impor, ainda mais quando você tem um cargo de responsabilidade, porque muitas das vezes o seu colega homem não vai querer respeitar determinadas "ordens” sobre o que fazer no bar — divide.

No Isabel Lounge, bar do rooftop do Hilton Copacabana, quem comanda o balcão é Izabelle Mendes. Ela abre o espaço ainda pela manhã, prepara o serviço e os drinques clássicos e autorais da casa.

— A preparação de drinques é uma arte. Comecei como atendente e me encantei pela profissão ao observar os colegas bartenders trabalhando. Felizmente, a coquelateria está se renovando rapidamente e já é possível ver muitas mulheres na área. Acredito que isso esteja acontecendo por termos alguns diferenciais, entre eles maior cuidado, organização e zelo, e isso foi visto com bons olhos pelo mercado. Por outro lado, ainda há alguns desafios a vencer, como a conscientização do público, a importância no incentivo às mulheres para que sigam a profissão, o investimento em capacitação e a disponibilização de oportunidades para que possamos nos desenvolver e contribuir com nossos atributos únicos — assegura.

Experts.  As bartenders Laura Paravato e Paula Diniz estão entre os grandes nomes do momento — Foto: Divulgação/ Any Duarte
Experts. As bartenders Laura Paravato e Paula Diniz estão entre os grandes nomes do momento — Foto: Divulgação/ Any Duarte

Já no Sheraton Grand Rio Hotel & Resort, é Luciana Calixto que há anos faz os drinques harmonizados com os pratos italianos do restaurante do hotel.

—Trabalhar em bar é quase como ser um psicólogo. Muita gente para ali para tomar um drinque mas também para falar, conversar. É um trabalho voltado para o entretenimento, mas também é sobre acolhimento, ainda mais em hotel, lugar no qual muitos hóspedes estão sozinhos e querem companhia. É um prazer muito grande trabalhar nessa área em que as pessoas chegam se divertir — explica Luiana, que no momento está trabalhando na fermentação de jabuticabas para fazer um novo licor para os hóspedes: — Ser mixologista, para mim, é poder criar, entreter e compreender — define.

Priscilla Pulcherio, de 28 anos, é bartender há oito anos e começou na carreira para fazer uma segunda renda extra. Ela acabou trancando a faculdade de Engenharia para mergulhar no mundo da coquetelaria. Passou por hotéis e casas como Teto Solar, Stuzzi, Mixxing e Garoa, até chegar à chefia de bar do Dainer, além de consultora do Caju Gastrobar e do Otra.

Foi na pandemia que Uane Azevedo começou a trabalhar em bares. A ideia surgiu para aumentar a fonte de renda, mas em poucas semanas ela já estava apaixonada pela profissão e resolveu estudar e se aprofundar. Em agosto de 2022, foi para fazer um freelancer no Clássico Beach Club e está lá até hoje.

—O Clássico de Ipanema fica em um dos cartões postais do Rio, e trabalhar em um balcão de frente para o mar é um privilégio. Bartender ainda é uma profissão que é considerada por alguns como masculina. Dentro desse nicho ainda existe um preconceito e até um certo desdém de alguns colegas de profissão. Mas, hoje em dia é bem mais fácil observar que esse tabu já está sendo quebrado. As mulheres estão com tudo nos balcões de bares por aí — comemora.

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