Entrevistas
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Por Anna Luiza Santiago

Em seu aniversário de 91 anos, comemorado no último dia 14 de março, Manoel Carlos recebeu alguns amigos em casa e pediu o bolo de coco de uma tradicional confeitaria do Leblon, bairro onde mora há décadas e que se tornou um personagem de suas novelas. É no apartamento da Zona Sul do Rio que o autor passa a maior parte do tempo desde que se aposentou e teve o diagnóstico de Parkinson, há cerca de seis anos. Preocupado com seu legado, Maneco incumbiu a filha Júlia Almeida de preservar sua vastíssima obra e pediu para ela assumir a produtora Boa Palavra, criada por ele em 2005 junto com a mulher, Elisabety, que administrava tudo. Em entrevista à coluna por chamada de vídeo, a atriz e empresária conta como o pai tem lidado com a doença e diz que o desejo dele é ver seu trabalho tendo uma vida longa.

— Olha, (receber o diagnóstico) nunca é bom, né? Mas é uma doença que é tratável. Ele está muito bem assessorado por médicos e tem acompanhantes. Está sendo cuidado direitinho, tem minha mãe ao lado dele. Eles são casados há 50 e tantos anos, acho lindo esse relacionamento. Ela se aposentou junto com ele. A partir daí, me deram essa missão, que estou assumindo com muita responsabilidade e amor. Eu vou sempre vê-los. Meu pai gosta de ouvir música clássica, faz fisioterapia. Vive lá no universo dele junto com a minha mãe. Faz os exames dele, gosta de ler jornal e pegar sol olhando o Cristo (Redentor). O que ele quer mesmo é que o trabalho dele continue para as outras gerações. Eu entendi o que foi passado para mim — explica ela.

Júlia, de 41 anos, tem a ajuda de uma pequena equipe para organizar as mais de sete mil caixas contendo sinopses inéditas, livros, prêmios e fotos, entre outros objetos pessoais. São profissionais que ajudam a catalogar tudo, prestam assessoria jurídica e também trabalham na parte criativa com ela.

— Eu me casei, morei na Inglaterra durante um tempo, me divorciei e voltei para cá em 2020, um pouquinho antes da pandemia. Então, me passaram a função de cuidar da Boa Palavra. No começo do ano passado, meu pai sentou comigo e explicou que estava aposentado, minha mãe também. Ele quis as coisas dele organizadas. Estava uma bagunça. Fui criada vendo meu pai e minha mãe trabalhando juntos, como parceiros, criando e construindo esse legado. Minha missão é reunir esses arquivos todos, não só os que já viram, porque tem muita coisa nova, e fazer com que a nova geração tenha acesso à marca do Manoel Carlos. Ele está deixando um legado muito importante para o nosso país, não só para a História da televisão brasileira, mas para todos nós. Essa coisa que ele criou de colocar a Bossa Nova junto com o Leblon. Ele mudou a estrutura do bairro. Até hoje é tão misterioso o porquê das Helenas... Tem as histórias das famílias, as causas sociais em todas as novelas. Minha missão é trazer isso para o universo de hoje — afirma Júlia, que se divide entre esse trabalho e o gerenciamento de sua marca de roupas.

A partir do contato com o material, surgiram várias ideias. Já está sendo preparada, por exemplo, uma biografia sobre Maneco. O projeto, em fase de entrevistas, deverá ganhar um lançamento no ano que vem. Na próxima edição da Festa Literária de Paraty (Flip), na Costa Verde do Rio, no segundo semestre, será realizada uma leitura do livro de poemas "Bicho alado" ("Ele tem um amor muito grande por esse livro, foi feito antes de eu nascer", lembra ela). Em relação às sinopses inéditas, Júlia ainda não tem certeza do que fará:

— Cada projeto vai ser pensado de uma forma, com calma. Pode ser um filme, pode ser uma série. Pode ser que alguém desenvolva ali em cima uma história. A ideia é pensar em cada sinopse e obra inédita de uma forma singular. Sempre mantendo a raiz dele, mas, claro, tem que ter a linguagem dos dias de hoje.

Existe ainda o plano de fazer um documentário:

— Meu pai ficou muito conhecido pelas novelas, mas tem muito mais por trás disso. Ele foi ator, diretor do "Fantástico", produtor. Fez livros de poema. Ele transitou por tudo até chegar a escritor de novelas. E aí tem, claro, o Manoel Carlos como pai, como amigo. O porquê de ser tão querido neste meio. Ele é querido não só por ser o Manoel Carlos que abriu tanto espaço para os diálogos dentro das famílias. Acho que o público tem uma gratidão muito grande. Ele entrava na casa das pessoas e abria diálogos que a mãe não conseguia ter com o filho. Ele entendeu o poder da TV, falou sobre câncer, síndrome de Down, sexualidade, prostituição, racismo... Foi a primeira pessoa a colocar uma protagonista preta (numa novela das 21h: Taís Araujo em "Viver a vida"). Fez beijo gay. Isso tem uma importância para o nosso país, é fundamental. A Helena morava no Leblon, mas ele falava com o Brasil inteiro.

No dia do aniversário de 91 anos de Maneco, chegou ao Globoplay um episódio da série "Tributo" dedicado a ele. O público estranhou a ausência no documentário. Júlia afirma que não houve um convite ao pai. Já a assessoria de comunicação da Globo, em contato com a coluna após a publicação desta reportagem, nega: "O autor foi convidado a participar do episódio, assim como todos os homenageados do projeto 'Tributo'".

— Ele não sabia que ia acontecer, não foi convidado. Foi uma surpresa porque foi no dia do aniversário. A gente ficou sabendo por terceiros. E aí fomos sabendo em pedaços. Ele sentiu muita falta da Regina (Duarte) e do Zé (José Mayer) no documentário (ambos fizeram papéis importantes nas tramas do autor, mas não gravaram depoimentos inéditos). Ele agradeceu a todos os amigos que ficou sabendo que participaram, mas ele não assistiu, foi decisão dele. Eu achei lindo, fiquei emocionada. Agradeço muito a todos — afirma Júlia.

Ela acredita que o pai teria aceitado gravar:

— Eu não sei há quanto tempo estava sendo gravado. Acho que ele teria topado. Teria pelo menos colocado o dedinho dele de alguma forma ali. Mas foi muito bem-feito.

Segundo Júlia, o pai sempre manifesta um carinho especial por duas novelas: "A sucessora", estrelada por Susana Vieira em 1978, e "Sol de verão", de 1983, com Irene Irene Ravache e Jardel Filho. Ela diz que ele costuma assistir às reprises de suas obras, mas não tem acompanhado novas tramas, apenas telejornais:

— Ele escuta música clássica e jazz. É disso que gosta. Ele fala: "Minha filha, é com você, tem que me atualizar aqui. Não me encaixo neste mundo, então vai você. Coloca seu dedo aí porque você foi criada para isso".

Manoel Carlos com a filha Júlia Almeida — Foto: Arquivo pessoal
Manoel Carlos com a filha Júlia Almeida — Foto: Arquivo pessoal
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