Elio Gaspari
PUBLICIDADE
Elio Gaspari

Jornalista e escritor

Informações da coluna

Elio Gaspari

Elio Gaspari é um jornalista e escritor. Em 2016, foi homenageado com um Prêmio Vladimir Herzog.

Por

Em outubro do ano passado o advogado Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, representando a Associação de Delegados do Estado de São Paulo, pediu ao corregedor nacional de Justiça que recomende aos magistrados o respeito ao dispositivo constitucional que delimitou as jurisdições das polícias Civis e Militares.

O artigo 144 da Constituição é claro:

“Às polícias Civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de Polícia Judiciária e a apuração de infrações penais, exceto a militares.”

“Às polícias Militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos Corpos de Bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil”.

Contam-se às centenas os casos em que magistrados deferem pedidos de busca e apreensão solicitados pelas polícias Militares. Mariz de Oliveira é um respeitado criminalista e já foi secretário de Segurança de São Paulo (1990-1991). Conhece de cor e salteado os dois lados do balcão. O que ele pede é que o Conselho Nacional de Justiça recomende aos magistrados que não defiram pedidos encaminhados pelas PMs invadindo a competência das polícias Civis.

A questão foi remetida ao Tribunal de Justiça de São Paulo e em maio passado seu corregedor respondeu que, “em situações de urgência específicas”, os magistrados podem deferir pedidos de buscas e apreensões solicitados pela Polícia Militar, sempre apoiados pelos representantes do Ministério Público. É o jogo jogado, desde que se defina o que vem a ser uma “situação de urgência específica”. As estatísticas indicam que as palavras “urgência” e “específica” são sinônimos de negro e pobre.

Indo ao coração do problema, o juiz Luís Geraldo Sant’Ana Lanfredi, auxiliar da presidência do Conselho Nacional de Justiça, informou, em um parecer em que repisou a clareza da Constituição:

“Pesquisa recente realizada pelo Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense (Geni-UFF), a partir da análise de dados da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, informa que é no cumprimento de mandados de busca e apreensão, ao lado da repressão ao tráfico de drogas e armas, retaliações por mortes ou ataque a unidade policial, recuperação de bens roubados, entre outras, que pavimentam as operações policiais que resultam em chacinas.

Ou seja, mandados de busca mal realizados e executados tornam-se instrumento e tipo de circunstância que necessariamente antecede ou desencadeia massacres, violações, abusos de todas as ordens e têm levado o país, inclusive, a condenações em Cortes Internacionais.”

Lanfredi concluiu propondo que o corregedor Luis Felipe Salomão recomende aos magistrados “que se abstenham de proferir decisões de deferimento de pedidos de busca e apreensão domiciliar ou de outros atos privativos de Polícia Judiciária e investigativa requeridos diretamente pela Polícia Militar.”

Uma decisão final ainda deverá esperar novos pareceres e será votada pelo plenário do Conselho Nacional de Justiça antes que o pedido de Mariz complete um ano.

Intenção e resultado

De boas intenções, o reino de Asmodeu está cheio. Com a melhor das intenções, o governo de Dilma Rousseff criou a Comissão Nacional da Verdade. Ela resultou num relatório repetitivo, capenga e superficial. Listou o brigadeiro Eduardo Gomes, ministro da Aeronáutica de 1965 e 1967 entre os militares responsabilizados pela prática de torturas, colocando-o na companhia de assassinos que executaram prisioneiros que atenderam a convites oficiais da tropa. Onde? Nas matas do Araguaia entre outubro de1973 e outubro de 1974. Essa e outras insensibilidades jogaram uma parte da oficialidade no colo do ex-capitão Jair Bolsonaro.

Agora Lula 3.0 caminha para uma revisão na previdência dos militares. Trata-se de um vespeiro. Os inativos custam R$ 31,2 bilhões e os militares na ativa custam R$ 32,4 bilhões. Nele há penduricalhos e abusos, mas tudo gira em torno de uma realidade: os militares brasileiros ganham pouco. Faz tempo, quando um general da intimidade do presidente Ernesto Geisel reclamou, comparando seu salário com o de um paisano, ouviu: “Você é realmente muito burro, entrou para o Exército para ganhar bem?” Um general brasileiro vai para a reserva depois de pelo menos 35 anos de serviços bem avaliados, com R$ 37 mil de salário. É pouco e essa anomalia estimula governantes a criar as tenebrosas boquinhas para oficiais amigos. Num caso, um general, na reserva, recebia menos de R$ 20 mil líquidos, e reclamava, mas não mencionava a boquinha pela qual passara, rendendo mais de R$ 50 mil mensais.

Pode-se mexer nesse vespeiro desde que fique claro que as mudanças tornarão o sistema mais transparente e justo. Parece impossível, mas o marechal Castello Branco fez uma reforma profunda no sistema de aposentadoria dos militares, modernizou as forças e acabou com aquilo que ele chamava de os generais chineses. Seu amigo Oswaldo Cordeiro de Farias ficou 23 anos no generalato.

Era possível que um general de quatro estrelas ficasse mais de dez anos na patente. Castello criou uma escadinha de cotas compulsórias, pelo qual os quadros de generais de brigada, divisão ou exército, são obrigadas a uma renovação de 25% a cada ano. A mesma escadinha funciona para a Marinha e Aeronáutica. Disso resultou que ninguém fica mais de quatro anos numa patente, nem mais de 12 no generalato.

Os generais chineses viraram fumaça, ninguém reclamou e as três Forças modernizaram-se, menos do que precisavam, mas como era necessário.

A Temer o que é de Temer

A boa notícia é que o PT e o senador Sergio Moro estão falando em “pacificação”. A eles soma-se o ex-governador de São Paulo, João Doria, que passou pela política sem nunca ter esticado a corda.

É justo reconhecer que essa atitude foi a marca registrada de Michel Temer, antes, durante e depois de sua passagem pela Presidência da República.

Mágica besta

Se Lula tivesse dispensado o público de sua última catilinária contra Roberto Campos Neto, é provável que a última reunião do Copom tivesse mantido a taxa de juros em 10,5% ao ano, sem a goleada de 9x0.

Lula gosta de atribuir os humores do mercado à ação de especuladores. Alguém precisa avisá-lo de que falas contra o Banco Central fazem a alegria de quem fatura com a alta do dólar.

Ronaldo Caiado na pista

O governador de Goiás, Ronaldo Caiado, está na pista para a sucessão presidencial de 2026. Num só dia ele é capaz de descer no Ceará e em Santa Catarina.

Caiado carrega consigo um patrimônio eleitoral do agronegócio e, pela sua agenda de hoje, quer ser um candidato com foco na segurança pública.

Etiqueta e compostura

Lula deveria criar uma força-tarefa de diplomatas para ensinar aos hierarcas de seu governo que, dependendo da lista de convidados, eles não podem ir embora de eventos onde participam como anfitriões.

Em todos os casos, é falta de educação. Em alguns, chega a ser insultuoso.

Mais recente Próxima O governo caiu na real