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GERADO EM: 23/06/2024 - 00:05

Importância do Banco Central na inflação e metas

O artigo aborda a importância do Banco Central no controle da inflação, destacando o regime de metas e a atuação técnica da autoridade monetária. Também discute a polêmica em torno do mandato intercalado do presidente do BC e a definição das metas de inflação, sugerindo possíveis aperfeiçoamentos no sistema.

A atuação do Banco Central (BC) tornou-se assunto polêmico em função de críticas ácidas de Lula dirigidas a Roberto Campos Neto, como se a atuação dele fosse motivada pelo desejo de sabotar o governo. Ora, nada mais desrespeitoso e absurdo, principalmente se levarmos em conta que a forte subida de juros se deu ainda durante a campanha presidencial e que eles caíram no atual governo. Teria então Campos Neto sabotado a campanha de Bolsonaro, que o indicou, para beneficiar Lula? Óbvio que não.

Mas, deixando de lado ofensas e descortesias dirigidas a um servidor público exemplar, parece haver total incompreensão sobre o funcionamento do regime de metas de inflação, por parte de Lula e dos petistas mais exaltados.

Postas de forma bem simples, as metas e suas bandas de flutuação são definidas por um conselho monetário, composto pelos ministros da Fazenda e do Planejamento e pelo presidente do BC. São passadas como mandato ao banco, mandato este sujeito a cobranças futuras. O BC dispõe de modelos econométricos que relacionam taxa de juros e inflação futura. De posse da meta, calibra os juros, buscando alcançar o centro da meta. Parece tudo muito simples e mecânico, mas não é, já que imperfeições e ruídos podem complicar a atuação da autoridade monetária.

O primeiro complicador surge quando mudam as expectativas dos agentes econômicos com relação à higidez da política fiscal. A perspectiva de uma relação dívida/PIB em descontrole assusta o mercado, e se elevam os prêmios de risco. Decisões do Judiciário e do Executivo que implicam insegurança jurídica para os negócios em geral também aumentam prêmios de risco e fazem mover o câmbio, com reflexo na inflação. Por fim, a expansão exagerada do crédito em bancos públicos, principalmente se adotados juros favorecidos, também sobrecarrega o BC, obrigando-o a fazer mais esforço para obter o mesmo efeito.

Capa do audio - Linha Aberta - Carlos Alberto Sardenberg

A atuação do BC procura ser eminentemente técnica, operando com os instrumentos à sua disposição para alcançar o objetivo perseguido. Mas a política monetária sozinha não faz milagre. Inflação precisa ser obra de todo o governo, incluídos aí os três Poderes.

Isso posto, podemos analisar as questões do mandato intercalado do presidente do BC e da definição da meta de inflação, já que também são controversas e geram queixas de Lula e de seu entorno.

É sabido que o atual presidente do BC tem mandato até dezembro deste ano e que Lula indicará, para aprovação do Senado, um novo nome. Este ficará no posto até concluído o segundo ano do próximo governo. A sistemática de mandatos intercalados reproduz o que encontramos em outros países e objetiva garantir mais estabilidade e previsibilidade na política monetária. Parece funcionar bem em democracias mais maduras, em que práticas de política econômica básica pouco mudam com a alternância de partidos no poder. Mas e no Brasil? Aqui, não me dá a impressão de ser a melhor opção. Primeiro, parece ser mais democrática a escolha de um presidente do BC afinado com um presidente da República recém-eleito. Segundo, porque a lógica da sistemática parece obedecer ao duvidoso “Princípio Ulysses Guimarães”, segundo o qual os próximos serão sempre piores. Isso justificaria algum tipo de monitoramento do governo seguinte, pelo menos por algum tempo. Mas e se for ao contrário?

Outro ponto a merecer revisão, pelo que vemos no momento, é a formação do colegiado definidor das metas de inflação. Parece ser adequado envolver o presidente da República direta e formalmente na tomada de decisão. Presidindo um colegiado, com os mesmos três componentes de hoje a orientá-lo, ele se sentiria corresponsável pelas escolhas, garantiria melhor engajamento de toda a equipe ministerial e ficaria desconfortável em assumir uma posição crítica altamente prejudicial ao desempenho do BC.

Em suma, temos um regime de metas robusto, fundado na técnica, como demonstraram os integrantes do Comitê de Política Monetária em decisão recente interrompendo a queda dos juros básicos diante da deterioração do quadro fiscal. Mas aperfeiçoamentos podem ser desejáveis para que tenhamos mais engajamento dos governantes de plantão em todo o processo de combate à inflação.

*Rubem Novaes é economista com doutorado na Universidade de Chicago

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