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GERADO EM: 24/06/2024 - 00:02

Investimento em ciência no Brasil: urgência na mudança

O Brasil precisa de mais investimento em ciência para evitar a queda na produção científica. Recursos insuficientes e baixos valores de bolsas desmotivam os jovens a seguir carreiras científicas, sendo essencial uma mudança urgente na política de financiamento.

Vivemos um momento da História em que a sociedade valoriza cada vez mais a ciência, sobretudo devido às contribuições dadas aos mais variados setores, talvez mais bem exemplificado pelo desenvolvimento de novas vacinas e novas terapias, como a terapia gênica. Quase todos os países vêm ampliando o investimento em ciência e tecnologia. A China é um bom exemplo e já ultrapassou os Estados Unidos na produção científica global.

O Brasil fez grande esforço no sentido de se inserir entre os líderes da produção de conhecimento. Para isso, contou com o apoio de três agências de fomento do governo federal (CNPq, Capes e Finep) e das fundações estaduais de amparo à pesquisa. Em 2023, cerca de 60% dos recursos que chegaram aos grupos de pesquisa vieram das fundações estaduais.

Há hoje um crescente pessimismo na comunidade científica brasileira, representada principalmente pelos líderes de centenas de grupos de pesquisa atuando em todas as instituições científicas do país. Esses grupos foram responsáveis por 2,64% da produção científica mundial em 2020. Nos últimos anos, essa produção caiu para 2,36% e 2,19% (em 2022 e 2023, respectivamente).

Quem atua na área sabe que é difícil crescer 1% ao ano, mas é muito rápida a queda. Enquanto, no período de 2020 a 2023, nossa produção científica caiu 9,2%, Arábia Saudita, Índia e China cresceram 63%, 38,6% e 31,9 %, respectivamente. Como companheiros de perda de produção temos Rússia (20%) e Argentina (7,1%). Creio que dispomos de todas as condições para reverter o quadro atual caso mudanças ocorram na política de financiamento.

Capa do audio - Vera Magalh��es - Viva Voz

Temos de comemorar o retorno integral dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). No entanto é preciso reverter com urgência a redução dos recursos orçamentários do Tesouro Nacional para o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, para o CNPq e para a Capes. Os recursos do FNDCT não devem ser usados para suprir perdas orçamentárias das agências. Ele deve priorizar o fortalecimento dos grupos de pesquisa, sobretudo com olhar atento à legislação específica de cada fundo. Hoje são destinados a “programas estratégicos”, mas sem um olhar para as atividades que ocorrem nas centenas de laboratórios brasileiros, com a opção equivocada de apoio prioritário a grandes projetos que não impactarão em curto prazo a recuperação da atividade científica.

Temos ainda outro seriíssimo problema que requer solução de curtíssimo prazo. A cada ano menos jovens se dirigem à carreira científica devido aos baixos valores das bolsas para programas de mestrado, doutorado e pós-doutorado e também porque não existem bolsas em número suficiente para atender às necessidades dos cursos de pós-graduação, mesmo daqueles considerados de mais alta qualidade.

Finalmente, é preciso dizer que a situação tende a piorar nos próximos anos caso não haja mudança substancial no processo decisório de alocação dos recursos existentes para a pesquisa científica no Brasil. As decisões precisam ser tomadas por comitês constituídos por pesquisadores ativos de grande experiência. É fundamental que ocorra, o mais rapidamente possível, a descentralização de parte dos recursos do FNDCT para as fundações estaduais, que devem aportar recursos complementares, visando a melhorar as condições de infraestrutura para que as centenas de grupos de pesquisa atuantes no país possam sobreviver e dar continuidade a seu trabalho. Um alerta: importantes pesquisadores vinculados às nossas instituições planejam migrar para o exterior. Muitos que lá estão há poucos anos não planejam regressar.

*Wanderley de Souza, professor titular da UFRJ, é integrante da Academia Brasileira de Ciências, da Academia Nacional de Medicina e da Academia de Ciências dos Estados Unidos

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