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A retomada do relacionamento americano com a China, iniciada pelo governo Nixon e planejada por Henry Kissinger, objetivava transformá-la em aliado. Com a adoção do sistema capitalista, imaginou-se que o país enriqueceria, e isso formaria ampla classe média e promoveria sua democratização

Com as reformas de Deng Xiaoping e a consequente revolução produtiva, o objetivo parecia estar próximo. Movida por um grande setor estatal e pela expansão da iniciativa privada, a China se integrou à economia mundial e tornou-se a segunda maior potência econômica, ajudada pela entrada na OMC (2001). Apesar do risco das ambições em relação a Taiwan, a ascensão era vista com otimismo.

Isso mudou, especialmente com a conquista do terceiro mandato de cinco anos por Xi Jinping, rompendo a tradição de dois mandatos. Xi tornou-se um autocrata e passou a defender a superioridade do modelo chinês. Nasceu, então, um sentimento antichinês, particularmente nos Estados Unidos, cujas raízes estão no desemprego no Ocidente, decorrente em grande parte da importação de produtos mais baratos da China e da transferência de fábricas para a Ásia. A estagnação da renda da classe média favoreceu a ascensão de políticos populistas de direita, como Donald Trump, e provocou o Brexit.

Daí a guerra comercial com a China. Os Estados Unidos impuseram elevadas alíquotas nas importações chinesas, aumentadas recentemente para produtos tecnológicos ligados à energia limpa. Proibiram empresas de semicondutores, como Intel, de vender para a China, pois os chips são vistos não apenas como centrais na economia do futuro, mas como fonte da superioridade do Ocidente. Desde sempre, o poder deriva do domínio da tecnologia. De sua parte, a China criou barreiras na internet e nas redes sociais. As ameaças a Taiwan têm crescido, com manobras militares e declarações agressivas.

Capa do audio - Bernardo Mello Franco - Conversa de Bastidor

A velocidade da difusão tecnológica aumentou significativamente com a tecnologia digital, com a internet e, mais recentemente, com a inteligência artificial (IA). Novos materiais são descobertos e testados em modelos sofisticados de IA. Na medicina, o entendimento do comportamento celular e das moléculas conhecidas criou medicamentos e procedimentos para a cura de várias doenças, especialmente o câncer e doenças autoimunes.

Cientistas chineses desenvolveram, usando IA, uma máquina de ressonância magnética que gera imagens quase tão boas quanto as atuais com um campo magnético muito menor. A máquina custará cerca de US$ 25 mil, o que resultará numa revolução na medicina social. Hoje, mais de 30% dos artigos científicos são escritos por chineses, chegando a 60% em alguns campos da ciência. A transformação ocorre tanto nas universidades ocidentais quanto, principalmente, nas chinesas. A Universidade Tsinghua, assim como as de Pequim e Xangai, está entre as melhores em pesquisa científica.

Apesar de a colaboração científica ser a melhor forma de aumentar o conhecimento e difundir a ciência, a China pode seguir em frente se vier a ser impedida de participar da área de alta tecnologia. Não se descarta uma guerra total, tragédia que atingiria a todos. Os Estados Unidos e o Reino Unido têm dificultado a entrada de alunos e cientistas estrangeiros, num movimento insano de bloqueio ao desenvolvimento científico. Já é tarde e contraproducente fazer isso. A crítica dos que acusam Nixon e Kissinger de ter criado um inimigo em potencial pode mostrar-se correta.

O Brasil precisa entender, acompanhar a evolução dessa nova realidade e preparar-se para suas eventuais consequências para a economia nacional.

*Maílson da Nóbrega, sócio da Tendências Consultoria, foi ministro da Fazenda, Gil Fawichow, engenheiro especializado em finanças, trabalhou no Banco ING e em outras instituições financeiras

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