Na última segunda-feira, o engenheiro ucraniano Kudin Yevhen, de 38 anos, fazia um trabalho de manutenção no Hospital Pediátrico Okhmatdyt quando o local foi um dos alvos de uma série de ataques aéreos que deixaram, segundo informações do governo do presidente Volodymyr Zelensky, ao menos 38 mortos em todo o país.
De acordo com um monitor de direitos humanos de uma missão das Nações Undias, o hospital foi atingido por um míssil de cruzeiro russo Kh-101. O Kremlin, porém, nega as informações e alega que os danos foram causados por um míssil de defesa antiaéreo ucraniano. O ataque foi condenado por dezenas de países, entre eles o Brasil, que, diferentemente de outros governos, não citou a Rússia.
Em Kiev, não existem dúvidas sobre a responsabilidade do governo de Vladimir Putin. Para ucranianos como Yevhen, “não há surpresas, pois os ataques russos muitas vezes atingem civis. Não estou em choque, estou com raiva”. O engenheiro ficou levemente ferido em um de seus braços e ombro, e ainda lembra como, após a explosão, viu "muitos feridos. O chão do hospital estava coberto de sangue".
A seguir, o depoimento do sobrevivente ucraniano:
Lembro muito bem o momento do ataque. Primeiro, ouvimos várias explosões bastante fortes, que vinham de regiões próximas ao hospital. Em seguida, ocorreu uma explosão muito forte do lado de fora da janela do lugar onde eu estava. De repente, desse lado ficou escuro pela poeira que surgiu após a explosão. Uma onda de choque destruiu a janela, e seus pedaços ficaram espalhados pela sala do hospital, e alguns chegaram até o corredor.
Naquele momento pensei “merda!” e rapidamente me afastei da janela. Estava trabalhando no hospital, consertando equipamentos médicos. Lá estavam muitos pacientes e médicos. É o maior hospital infantil que temos na Ucrânia.
Antes da explosão, muitas pessoas passavam pelo corredor, havia vários preparativos para cirurgias, havia muito movimento. Depois da explosão, vi muitos feridos, o chão do hospital estava coberto de sangue.
Muitas pessoas precisaram de primeiros-socorros e, naquele momento, um incêndio começou num dos andares do prédio. Não vi mortos, porque eles estavam sob os escombros do hospital atingido pelo míssil.
No meu caso, fiquei levemente ferido. Pouco depois da explosão, vi que tinha sangue no meu braço e ombro esquerdos. Uma médica me viu e disse que tinha algo errado com a minha orelha, mas decidi deixar para cuidar disso depois. Não foram ferimentos graves.
As autoridades do hospital anunciaram a retirada, e lembro que havia muita fumaça, muita poeira, muito sangue e destruição no prédio. As pessoas carregavam crianças nos braços para levá-las para fora do hospital. Fiquei surpreso porque não havia pânico, os médicos tentavam ajudar as vítimas, que eram muitas.
Na rua, as pessoas começaram a mexer nos escombros para tentar achar vítimas, e isso foi um ato muito corajoso, porque existia o risco de que outro míssil caísse no local. É o que se espera de um canibal. Nada nos surpreende, infelizmente. Os mísseis russos atingem frequentemente civis.
Sinto muito pelas crianças afetadas e pelas crianças que em breve precisarão de cuidados hospitalares. Lamento muito pelas vítimas, porque eram pessoas que ajudavam crianças. É impressionante que algo assim aconteça no século XXI.
Não é choque, é raiva.
Inscreva-se na Newsletter: Guga Chacra, de Beirute a NY