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Por O Globo, com agências internacionais — Paris

A decisão do presidente da França, Emmanuel Macron, de dissolver a Assembleia Nacional e convocar eleições parlamentares antecipadas, após a derrota para a extrema direita na votação para o Parlamento Europeu, pegou líderes políticos e analistas de surpresa, que passaram a questionar o cálculo do líder francês para se aventurar em uma campanha, chamada às pressas, em um cenário aparentemente adverso.

O Reagrupamento Nacional, de Marine Le Pen, conquistou cerca de 31,37% dos votos nas eleições ao Parlamento Europeu, alcançando seu melhor resultado no pleito na História, à frente do Renascimento, de Macron, e do Partido Socialista, da prefeita de Paris, Anne Hidalgo. O resultado foi comemorado por Le Pen, que disse que "quando o povo vota, o povo ganha". O presidente afirmou que não podia "fingir que nada aconteceu" ao anunciar a dissolução da Assembleia Nacional e convocar as eleições.

As movimentações políticas para desenhar as alianças que irão às urnas em 30 de junho e 7 de julho (datas do primeiro e segundo turno, respectivamente) começaram nesta segunda-feira, enquanto as atenções seguiam voltadas para Macron, na tentativa de entender seu cálculo político. As hipóteses vão desde o vislumbre de uma vitória final sobre Le Pen antes das eleições presidenciais de 2027 até a de uma derrota calculada.

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Ambiente doméstico

Uma ala mais otimista de observadores aponta que a decisão do presidente vislumbra uma vitória plena, que amplie a maioria de seu grupo político na Assembleia Nacional, em que já detém o maior número de cadeiras de um único partido. O Renascimento tem 270 dos 577 assentos do Legislativo, onde tem maioria com apoio de siglas centristas. Em janeiro, o aliado de primeira ordem do presidente, o ex-ministro da Educação Gabriel Attal, foi conduzido ao cargo de premier.

A margem maior permitiria a Macron não apenas governar pelos próximos três anos com uma base governista reforçada, como também seria um atestado de que a população francesa, em se tratando de política interna, não está de acordo com as bandeiras ultranacionalistas e extremistas do grupo político de Le Pen.

Presidente da França, Emmanuel Macron, ao anunciar realização de eleições legislativas em junho — Foto: Ludovic MARIN / AFP
Presidente da França, Emmanuel Macron, ao anunciar realização de eleições legislativas em junho — Foto: Ludovic MARIN / AFP

Macron venceu Le Pen em todas as disputas eleitorais desde que se tornou presidente, em 2017 — apesar de a líder radical ter melhorado o seu percentual a cada pleito. Uma nova vitória, especialmente uma que aumentasse o número de cadeiras do centrista, teria um peso simbólico após o resultado nas eleições do bloco europeu.

Fatores de ordem prática podem jogar a favor do presidente: como a eleição acontece em um prazo curto, forças políticas tradicionais, com maior mobilização de base e já no poder, podem se beneficiar do período reduzido de campanha, cuja reta final dividirá atenções com o início dos Jogos Olímpicos de Paris.

Além disso, a votação europeia não costuma acompanhar a mesma dinâmica das eleições nacionais, de modo que os resultados de domingo não são vistos como decisivos pela grupo de Macron, ainda mais considerando que o sistema de votação da França joga a favor do presidente francês.

No primeiro turno, vários partidos competirão para atingir um limite mínimo de votos, podendo vencer diretamente só quem conseguir uma maioria absoluta. Seguem para o segundo turno, em 7 de julho, os que obtiveram a maior votação em cada cadeira, cenário que poderia fazer com que eleitores de diferentes espectros políticos se unam para evitar uma vitória de um candidato da extrema direita. Esse mecanismo também se aplica às eleições presidenciais, que até agora não permitiram nenhuma vitória da extrema direita para o Palácio do Eliseu.

— Não se trata da mesma eleição, nem da mesma forma de votação, nem da mesma participação — disse Jean-Philippe Derosier, professor de direito público na Universidade de Lille, em entrevista ao New York Times.

Achatamento de extremos

Fontes próximas ao presidente francês afirmam que a decisão de Macron foi influenciada pela sua experiência nas comemorações dos 80 anos do Dia D, quando pessoas o abordaram e se queixaram de que a disputa política havia se tornado muito agressiva. Nesse sentido, as novas eleições seriam parte de uma tentativa de aumentar a representação ao centro, mesmo sem ampliar diretamente sua base aliada.

Nesta segunda hipótese, o foco do presidente não estaria apenas em derrotar Le Pen e os partidos mais radicais que conquistaram maioria nas eleições europeias, mas também retirar cadeiras e isolar facções mais à esquerda, como a liderada por Jean-Luc Mélenchon, terceiro lugar nas últimas eleições presidenciais francesas, quando concorreu em uma aliança com o tradicional Partido Socialista, de centro-esquerda, um crítico dos planos reformistas mais à direita de Macron.

Em um primeiro momento, a estratégia pode estar surtindo efeito no que diz respeito à esquerda. Em uma primeira declaração nesta segunda-feira, a prefeita de Paris afirmou ser contrária a uma nova união com o partido de Mélenchon nessa nova disputa. Resta saber se, com a separação, os votos do grupo se dividirão entre as duas siglas ou migrarão para os centristas, como pretenderia Macron.

O círculo íntimo do presidente, segundo fontes ouvidas pela Bloomberg, considera que o partido de Le Pen está longe de conquistar um número de votos que garanta a maioria e o controle da Assembleia Nacional.

Marine Le Pen, líder do Reunião Nacional, e Jordan Bardella, presidente da sigla, antes de declarações à imprensa — Foto: JULIEN DE ROSA / AFP
Marine Le Pen, líder do Reunião Nacional, e Jordan Bardella, presidente da sigla, antes de declarações à imprensa — Foto: JULIEN DE ROSA / AFP

Derrota como vitória

Uma última hipótese parte de uma visão mais pessimista: a de que Macron sabe que vai ser derrotado. A lógica por trás da derrota consentida seria a de oferecer ao eleitorado, até 2027, um vislumbre do que seria um governo francês liderado pelo partido de Le Pen. A ideia seria expor o grupo político radical a uma situação de governo, sem sujeitar o país a uma Presidência radical, e demonstrar que teria pouco a oferecer como partido de situação, não passando de uma oposição virulenta, sem propostas reais.

"Em outras palavras, Macron, que está limitado a este mandato e deixará o cargo em 2027, pode estar flertando com a noção de que três anos no cargo para o Reagrupamento Nacional — transformando-o de um partido de protesto em um partido com as onerosas responsabilidades de governo — iria travar sua ascensão inexorável", escreveu o analista Roger Cohen, no New York Times.

Em sentido similar, o colunista de opinião da Bloomberg, Lionel Laurent, afirmou que o Reagrupamento Nacional teria dificuldades para agir como governo, sobretudo considerando inconsistências internas que cresceram nos últimos anos.

"Tem sido difícil compreender o que o Reagrupamento Nacional representa, depois de anos abandonando suas políticas mais tóxicas para ampliar o seu apelo. [O partido] Já não quer abandonar a UE depois da confusão do Brexit (saída do Reino Unido do bloco europeu), mas quer exceções francesas à legislação da UE. Já não quer abandonar a zona de livre circulação de Schengen, mas quer uma 'fronteira dupla' para a França e a UE, envolvendo controles sistemáticos. Já não apoia a reforma [da Previdência] aos 60 anos, mas também não apoia a subida de Macron para os 64 anos", escreveu Laurent.

A última vez em que a França realizou eleições parlamentares antecipadas foi em 1997, quando o então presidente Jacques Chirac antecipou a votação em busca de apoio para as mudanças necessárias para se qualificar para o euro. O resultado: o grupo de Chirac perdeu a maioria, e ele foi forçado a nomear o chefe do Partido Socialista rival como primeiro-ministro. A medida é sempre um risco, alertaram analistas.

— Não é uma aposta, é [uma jogada] audaciosa — disse o consultor para assuntos europeus Yves Bertoncini, em entrevista a Bloomberg. — Normalmente, agentes que fazem movimentos como esse não têm muitas cartas na manga. (Com Bloomberg, NYT e El País)

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