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Por — Berlim

Os planos do príncipe Heinrich XIII de Reuss de tornar-se o monarca de um renascido reino alemão começaram a desmoronar em 7 de dezembro de 2022. Naquele dia, o empresário descendente de uma antiga família nobiliárquica que remonta ao século XII foi preso junto com mais 24 pessoas, sob acusação de estarem por trás de um complô de grupos neonazistas para derrubar a República. Passados 17 meses, ontem teve início o mais novo capítulo dessa improvável saga antidemocrática num tribunal de Frankfurt, com Heinrich XIII de Reuss e oito de seus comparsas levados ao banco dos réus para responderem pelo plano de invadir o Parlamento com um grupo armado, prender os deputados e o presidente Frank-Walter Steinmeier, iniciando, assim, um golpe de Estado.

Com um longo histórico de envolvimento com ideias monarquistas, antissemitas e obscurantistas, o príncipe, de 72 anos, é acusado — no segundo julgamento de membros do grupo — de cometer alta traição e integrar uma organização terrorista. Mas ele e seus cúmplices não são os únicos a reivindicarem o retorno de uma monarquia alemã. Os conspiradores integram um amplo movimento ultrarradical da extrema direita que a imprensa e o governo chamam de “Reichsbürger” (Cidadãos do Reich). A designação abriga uma constelação de organizações espalhadas pela Alemanha que rejeitam a república democrática estabelecida após a Segunda Guerra. Seus membros alimentam teorias conspiratórias da primeira década do pós-guerra, dizem que nunca terminou o Terceiro Reich de Adolf Hitler (1933-1945) e acham que os alemães vivem até hoje sob ocupação dos Aliados.

— Pessoas da extrema direita começaram a agir em redes pequenas, mas maliciosas — explica Tobias Ginsburg, jornalista que passou oito meses infiltrado no Reichsbürger. — As teorias da extrema direita alcançaram vários lugares e plantaram todo tipo de semente. Hoje, ouvimos discursos neonazistas saindo da boca de pessoas que não pensam ser neonazistas.

Rede espalhada pelo país

Num relatório de 2023, o Escritório Federal para a Proteção da Constituição da Alemanha estimou em 23 mil os “cidadãos do Reich” operando numa rede heterogênea de pequenos e microgrupos, redes virtuais e grupos suprarregionais de indivíduos. É um crescimento expressivo dos 10 mil contados em 2016, e a estimativa ainda é tida como conservadora por estudiosos.

Desde que o termo “Reichsbürger” chegou ao conhecimento de observadores nos anos 1990, o movimento se capilarizou na sociedade alemã. O governo afirma que um terço dos membros é de mulheres, por exemplo, um índice alto no espectro do radicalismo de extrema direita.

Além do conspiracionismo, as organizações Reichsbüger abraçam o racismo e o antissemitismo e flertam com o esoterismo. Podem ser mais ou menos estruturadas e capitalizadas. Nos casos mais extremos, ameaçam políticos, enviam cartas agressivas a instituições públicas ou estabelecem seus próprios “territórios” e grupos armados.

“A presença dos ‘Reichsbürger’ aumentou notavelmente nos últimos anos”, escreveu ao GLOBO Stephan Meyn, da Associação de Cidades e Municípios da Baixa Saxônia. “Isso se manifesta na forma de disrupções das operações de prefeituras locais, incluindo pedidos insensatos, provocações contra funcionários e insultos. Mas, também, por meio da compra de propriedades com o objetivo de criar seus próprios refúgios fora da esfera do poder estatal.”

Constituição de 40 páginas

Um policial morreu em 2016 e outro ficou ferido no ano passado ao serem alvo de tiros disparados por membros do movimento em operações de investigação no sul da Alemanha. Investigadores afirmam que os Reichsbürger sob julgamento tinham em mãos € 500 mil, além de um arsenal de mais de 1,2 mil armas e quase 150 mil munições.

Em Rutenberg, vilarejo de 180 habitantes no estado de Brandemburgo, a primeira família de “colonos” do Reichsbürger chegou em 2021. Na época, prometiam iniciar um pequeno negócio de agroecologia e turismo num celeiro. Contam os moradores locais que, em alguns meses, carros de várias regiões passaram a trazer dezenas de pessoas para trabalhar numa construção aos fins de semana.

Na semana da tentativa de golpe em 2022, a comunidade compreendeu que os novos vizinhos pretendiam montar uma base para uma das organizações do Reichsbürger, o “Reinado da Alemanha” (KRD, na sigla em alemão). O KRD tem, inclusive, um simulacro de Constituição, com 40 páginas suntuosamente adornadas ao estilo monárquico e assinadas por um autoproclamado imperador. Para derrubar a República, seus membros se estabelecem em zonas rurais, criam relações sociais e tentam espalhar sua ideologia.

— A nossa sorte foi que identificamos a situação cedo — disse Vera Müller-Plantenberg, moradora de Rutenberg. — Alguns moradores pensavam que eles não fariam nada de grave. Depois, ficou claro que a ideia de um reinado pode parecer ridícula, mas é, na verdade, muito perigosa.

Em 2023, a comunidade formou a Aliança pela Democracia de Rutenberg. Espalharam vários cartazes pelo vilarejo contra o KRD, que acreditam ter freado a expansão local do movimento.

Hoje, permanecem cerca de dez conhecidos “cidadãos do Reich” em Rutenberg, ocupando ao menos uma propriedade e tentando obter acesso a mais 44 hectares por uma cooperativa local. Já a aliança democrática tem 50 membros e coopera com prefeitos de vilarejos próximos penetrados pelos Reichsbürger. Amanhã, receberá um prêmio do governo alemão.

— Nós nos sentimos na responsabilidade de informar sobre as estratégias daqueles que lutam contra a ordem democrática e liberal. Queremos defendê-la e vivê-la — continuou Müller-Plantenberg, membro da aliança.

Antes visto mais como grupos excêntricos do que um risco político ou de segurança, o Reichsbürger passou, desde 2022, a ser mais frequentemente discutido como uma expressão aguda e perigosa do ascendente ultraconservadorismo na Alemanha.

Réu morou no Brasil

O governo alemão chama o movimento de “incompreensível do ponto de vista objetivo” e o condena vocalmente. Em crescimento nos últimos anos, o partido de extrema direita Alternativa para a Alemanha (AfD), entretanto, aprendeu a discursar para o Reichsbürger. Uma ex-parlamentar da legenda, Birgit Malsack-Winkemann, está entre os réus no tribunal de Frankfurt.

— Desde 2016, o AfD disseminou a ideia de que a Alemanha não é um Estado soberano, mas está sendo guiada por um grupo clandestino de políticos comprados pela Otan e pelos EUA. Este é um ponto crucial do começo do partido, e até seus membros proeminentes espalharam essas teorias — aponta Ginsburg.

Outros dois julgamentos sobre o caso correm paralelamente este ano — um em Munique, previsto para junho, e outro em Stuttgart, que começou em abril. Entre o total de 27 réus está ainda Rudiger Wilfred Hans Von Pescatore, que morou no Brasil e foi proprietário de empresas em Santa Catarina. Ele é apontado como aspirante a líder do braço militar dos golpistas.

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