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Por — Buenos Aires

O presidente da Argentina, Javier Milei, completou seis meses de governo no último dia 10, num panorama ainda incerto para o país. Passado meio ano no cargo, o chefe de Estado, que na última sexta-feira disse, durante uma palestra em Madri, ser “um liberal num país de esquerdistas”, tem poucas vitórias políticas para comemorar, mas continua contando com um robusto apoio social. Os projetos de lei enviados pela Casa Rosada ao Congresso ainda não foram aprovados, em grande medida, pela resistência de grupos peronistas. Sem poder avançar com suas reformas nas questões trabalhista e de privatizações, entre outras, Milei mantém seus eleitores — os mais e os menos entusiasmados — engajados com as conquistas na área econômica.

Em abril, a inflação foi de 8,8%, acumulando quatro meses consecutivos de queda — depois de chegar a 25,5% em dezembro. Alguns preços, segundo dados oficiais, registraram deflação, alimentando um clima de esperança entre eleitores do presidente e líder da ultradireita argentina. Mas a esperança convive com a angústia dos setores de classe média e dos mais pobres, que têm cada vez menos poder aquisitivo. Argentinos como a garçonete Ayelen Antunes, de 33 anos, foram obrigados a cortar despesas e fazer opções que antes não eram necessárias.

— Ou compro roupa ou saio com amigos, as duas coisas é impossível — afirmou a garçonete, que nas eleições do ano passado votou em branco, mas está rodeada de pessoas que optaram pelo peronista Sergio Massa e vivem angustiadas, segundo ela, porque temem perder direitos como a educação pública.

Já o aposentado Mario Saccone votou em Milei e não se arrepende, apesar de ter reduzido drasticamente o uso de seu carro devido aos permanentes aumentos no preço da gasolina.

— Se Milei não der certo, o que nos resta é o abismo — disse o aposentado de 72 anos.

Mario Saccone, aposentado — Foto: Janaína Figueiredo
Mario Saccone, aposentado — Foto: Janaína Figueiredo

‘Milei está fazendo o que a Argentina precisa fazer e mudando o rumo’

“Eu era eleitor da aliança Juntos pela Mudança [do ex-presidente Mauricio Macri], mas hoje agradeço que seus candidatos não tenham sido competitivos na eleição de 2023. Estão todos brigados entre si, é um desastre. Milei era um desconhecido, eu sequer o conhecia muito da TV e nunca tinha ouvido seus discursos. Mas votei nele porque achei, e continuo achando, que era o melhor candidato. Acho que ele fez o que devia ser feito, e continua fazendo. É duro, mas do que a Argentina precisa é reduzir as despesas do Estado e deixar de emitir dinheiro. O país precisa mudar de rumo, baixar a inflação, e isso está acontecendo. Os aumentos de preços e tarifas de serviços públicos que estamos vivendo, e que são muito elevados, eram previsíveis. Estava tudo errado até Milei assumir a Presidência. Mas ouvimos barbaridades, como pessoas dizendo que o acidente de trem ocorrido na capital, na semana passada, foi culpa de Milei. O presidente está indo muito bem, vai conseguir aprovar as leis que enviou ao Congresso, talvez com algumas modificações. Hoje, nenhum economista pode discutir com Milei: ele rebate todos com bons argumentos. A Argentina está melhor, e vejo que existe um projeto de país. Todos estamos fazendo sacrifícios, mas era necessário. Sou aposentado e quase não saio mais, o dinheiro não dá para isso. Não tenho uma boa aposentadoria e dependo de minhas economias. Outro dia, comprei um casaco porque estava com desconto e me ofereceram seis parcelas sem juros. Sem essas facilidades, não posso nem comprar roupa. Tenho um carro de 2018, mas uso pouco, porque a gasolina aumentou muito. Meu condomínio está caríssimo, e as taxas imobiliárias, uma fortuna. Está bem difícil, mas os valores estavam muito desatualizados. O Estado emitia dinheiro de maneira descontrolada para financiar subsídios que não eram sustentáveis. Fui muito afetado por todas as crises argentinas e espero que este governo seja diferente. Porque, se Milei não der certo, o que nos resta é o abismo. Hoje não vejo uma alternativa ao presidente. O peronismo nos decepcionou muito, mas Milei nos deu esperanças.”

Mario Saconne, aposentado

Ayelen Antunes, garçonete — Foto: Janaína Figueiredo
Ayelen Antunes, garçonete — Foto: Janaína Figueiredo

'O país votou por uma mudança, mas a situação ficou mais difícil’

“Nas eleições do ano passado, votei em branco porque nenhum dos candidatos me convenceu. Muitas pessoas que conheço, amigos e familiares, votaram no candidato do governo naquele momento, o ex-ministro da Economia Sergio Massa. Fiquei na dúvida, mas nossa situação era tão ruim que para mim era uma ideia muito estranha votar no ministro que comandava um governo que era um verdadeiro desastre. Acho que eu senti o que muitas pessoas sentiram, mas esse sentimento não chegou, no meu caso, ao ponto de votar em Milei. O que ficou muito claro para mim na última eleição presidencial, em 2023, foi que muitas pessoas queriam uma mudança em nosso país, e eu também queria. Ouvi muita gente dizer que não votaria em Milei, mas que, sim, desejava uma mudança. As pessoas estavam cansadas dos políticos tradicionais, dos mesmos de sempre, e muitos votaram no presidente sem pensar nas consequências que seu voto teria. Hoje, seis meses depois, vejo que a situação econômica não melhorou. Os preços aumentam muito, e os salários não acompanham, estão sempre atrasados. Para mim, a situação piorou bastante. O salário cada vez rende menos, e tive de mudar hábitos em minha vida cotidiana. Antes eu podia sair com amigos e comprar alguma roupa quando precisava. Agora devo optar: ou saio ou compro roupa. Ninguém sabe até quando vamos estar assim e é difícil ter esperanças. Meus amigos e familiares que votaram em Massa estão muito zangados com Milei. Conheço muita gente que trabalha e estuda em universidades públicas, e são pessoas que estão preocupadas e revoltadas, temem que a educação pública seja privatizada. Acho que a maioria das pessoas está contra o governo, embora muitas delas tenham votado em Milei. E isso tem a ver basicamente com o sufoco pelo que estamos passando os que pertencemos às classes média e baixa. Os pobres, então, estão passando fome. Para nós, a situação piorou muito, porque a inflação continua alta, os preços aumentando muito e temos cada vez menos poder aquisitivo.”

Ayelen Antunes, garçonete

Donato Ramos, vendedor de flores — Foto: Janaína Figueiredo
Donato Ramos, vendedor de flores — Foto: Janaína Figueiredo

‘O governo está dando passos positivos, e alguns preços já caíram’

“Votei no presidente Javier Milei no ano passado convencido de que era a melhor opção naquele momento para a Argentina, e continuo achando a mesma coisa. Sou peruano, mas voto na Argentina há muitos anos. Hoje tenho esperança, vejo o país tomando um rumo diferente, adotando decisões duras, mas necessárias. As pessoas estão otimistas, sobretudo nos bairros de classe média alta. Em outras regiões, por exemplo onde moro, no bairro de Lugano, a situação está mais apertada para muita gente e muitas vezes é complicado ser otimista. Eu, pessoalmente, acho que estamos dando passos positivos, sobretudo no tema da economia. Alguns preços, inclusive, já caíram, notamos isso quando vamos ao supermercado. Ver os preços caindo na Argentina é algo que não acontecia há muito tempo, já tínhamos esquecido o que era a deflação. Na década de 1990, tivemos queda de preços em alguns momentos, mas, desde a mudança de século, a inflação é um dos problemas mais graves no país. Outros preços continuam aumentando, nada muda de um dia para o outro, temos de ser pacientes. Esta semana, comprei margaridas e me cobraram mais do que o dobro da semana passada. Temos de reajustar os preços ao público, mas, em bairros como Palermo e Belgrano, as pessoas conseguem absorver esses aumentos. Nos bairros mais pobres, é mais difícil. Sabíamos que seria assim, que teríamos muitos meses de enormes sacrifícios. Estávamos preparados, e Milei sempre disse o que faria, ninguém pode dizer que ele mentiu a seus eleitores. Mas tudo o que fizeram antes deu errado, então temos de dar uma oportunidade a um presidente novo, que não vem da política tradicional. Por enquanto, acho que ele está indo bem, apesar das dificuldades que muitos estamos passando. O governo está cortando ajudas sociais que levaram muitas pessoas a não trabalhar e a viver do Estado. Tudo isso, que estava errado, começou com [o então presidente Juan Domingo] Perón na década de 1940. Milei está mudando coisas que precisavam ser mudadas há décadas. Hoje vejo que a Argentina tem futuro, e fico feliz pelos meus dois filhos.”

Donato Ramos, vendedor de flores

Laura Golbert, socióloga — Foto: Janaína Figueiredo
Laura Golbert, socióloga — Foto: Janaína Figueiredo

‘Um presidente que não acredita no Estado é algo que assusta’

“No ano passado, votei no peronista Sergio Massa para não votar em Javier Milei. Não foi um voto positivo, não morria de vontade de votar em Massa, mas achei que era a melhor opção naquele momento. Massa cometeu muitos erros na campanha, entre eles distribuir muito dinheiro entre os peronistas para conseguir votos. Fez uma campanha muito ruim, gastou dinheiro do Estado que não deveria ter gastado e acabou perdendo a disputa final com Milei. Durante a campanha eleitoral, eu acreditava que Milei representava um perigo real para a Argentina, por ser quem é, por suas alianças políticas, e por estar rodeado de pessoas que considero perigosas, entre elas o ex-presidente Mauricio Macri (2015-2019) e a atual ministra da Segurança, Patricia Bullrich. Todos representam uma direita linha-dura, e não compartilho nem um pouco de suas ideias. Milei, por sua vez, me parece uma pessoa desequilibrada emocionalmente. Não gostei de como ele discursou em sua posse de costas para o Congresso, vejo gestos e sinalizações perigosas para nossa democracia. Pela primeira vez, desde a redemocratização da Argentina, sinto que a democracia está ameaçada. E Milei me parece cada vez mais perigoso, em muitos sentidos. Sua aliança com os EUA, com figuras como Donald Trump e a ultradireita global... Sua serra elétrica não era apenas um elemento de campanha, ela de fato era real e está prejudicando, principalmente, os mais pobres. Milei adota medidas contra os setores mais vulneráveis, e me preocupa o que ele fará em outras áreas, entre elas a da energia nuclear, lítio e petróleo. Uma pessoa que não acredita no Estado me assusta. Claro que é positivo que tenha conseguido conter a escalada da inflação, mas isso se sustenta? Porque isso foi conseguido às custas dos mais pobres, dos aposentados. Os governos anteriores foram muito ruins, mas acho que poderíamos superar a crise com métodos melhores. Não sabemos o que nos espera, mas a sensação é de que a Argentina está desmoronando. A oposição não tem líderes, e nossa única esperança são as novas gerações.”

Laura Golbert, socióloga

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