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O operador do principal porto do Haiti, em Porto Príncipe, anunciou a suspensão das atividades depois de relatar tentativas de ataques das gangues que desde a semana passada se uniram para tentar forçar a saída do premier Ariel Henry do poder, e que põem em xeque a capacidade do já combalido Estado haitiano seguir funcionando, mesmo que minimamente.

Em comunicado, a Caribbean Port Services, única empresa que atua no terminal, citou "atos maldosos de sabotagem e vandalismo" cometidos por grupos armados, que invadiram as áreas de armazenamento e saquearam contêineres, inviabilizando as operações.

Mapa do Haiti — Foto: Editoria de Arte
Mapa do Haiti — Foto: Editoria de Arte

Segundo o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários, o porto da capital haitiana é hoje "a única forma para transportar alimentos e medicamentos para organizações humanitárias e de desenvolvimento" ao redor do país, e onde há hoje "24 caminhões com equipamentos, insumos médicos e comida" retidos.

"O sistema de saúde está perto do colapso. Muitas unidades médicas fecharam ou reduziram drasticamente suas operações por causa da preocupante escassez de remédios ou a falta de profissionais", diz comunicado.

A paralisação, alerta o escritório, terá consequências graves para a população.

— Também estamos preocupados porque é extremamente difícil acessar o nosso armazém de material médico, não só pela situação no porto, mas também porque é impossível continuar com os procedimentos administrativos de desembaraço aduaneiro — disse Mumuza Muhindo Musubaho, coordenador de projeto da Médicos Sem Fronteiras (MSF) no Haiti. — Temos medo de ficar sem medicamentos e suprimentos médicos, que são absolutamente essenciais para atender às enormes necessidades que enfrentamos neste momento.

Militar patrulha rua de Porto Príncipe, em meio a ataques coordenados de gangues armadas — Foto: CLARENS SIFFROY / AFP
Militar patrulha rua de Porto Príncipe, em meio a ataques coordenados de gangues armadas — Foto: CLARENS SIFFROY / AFP

Desde a semana passada, algumas das principais gangues que dominam boa parte do Haiti anunciaram uma união para realizar atos de violência e tentar forçar a saída do premier Ariel Henry, no cargo desde a morte do presidente Jovenel Moïse, assassinado em 2021. Além de ostentarem armas em público, sem qualquer resistência das forças de segurança, os criminosos atacaram prédios públicos, delegacias e invadiram a maior prisão do país, libertando mais de três mil presos, incluindo condenados por homicídio e sequestro. Na segunda-feira, eles avançaram contra o aeroporto Toussaint Louverture, em Porto Príncipe, mas foram repelidos pelos militares. Desde então, todos os voos domésticos e internacionais estão suspensos.

Em resposta, o governo declarou estado de emergência e um toque de recolher no domingo, inicialmente previsto para durar até quarta-feira, mas ampliado até pelo menos 3 de abril. Desde o início dos ataques, 10 pessoas foram mortas e mais de 15 mil saíram de casa em busca de segurança.

Com um Estado frágil há muitos anos, instituições ineficazes, sem eleições desde 2016 e sem um presidente desde 2021, o Haiti acumula crises, especialmente, sociais — segundo dados do Banco Mundial, 63% da população vivem com o equivalente a R$ 18 por dia, e 34% com menos de R$ 10 por dia. O Unicef estima que 5,2 milhões de pessoas precisem de ajuda para sobreviver, incluindo 4 milhões de crianças.

Líder de gangues, Jimmy "Barbecue" Cherizier, ao lado de homens armados antes de entrevista coletiva em Porto Príncipe — Foto: CLARENS SIFFROY / AFP
Líder de gangues, Jimmy "Barbecue" Cherizier, ao lado de homens armados antes de entrevista coletiva em Porto Príncipe — Foto: CLARENS SIFFROY / AFP

Pelo lado político, o premier Ariel Henry, que assumiu o poder após a morte de Moïse, é considerado incapaz de ao menos começar a enfrentar os problemas nacionais. Segundo um acordo firmado localmente, ele deveria ter dado início, ainda no ano passado, a um processo para a realização de eleições em 2024, e deveria ter deixado o poder em fevereiro. Ele alega que o país não tem condições para uma votação, citando o aumento da violência armada desde o final de 2023.

Durante os ataques da semana passada, Henry estava no Quênia, tentando viabilizar o envio de policiais para uma missão de estabilização autorizada pelo Conselho de Segurança da ONU, em outubro do ano passado. Apesar do aval de Nairóbi, a Justiça local tem impedido que os cerca de dois mil policiais sigam para a ilha caribenha — alguns dos agentes que se voluntariaram inicialmente teriam desistido, segundo a BBC.

Mesmo assim, o premier disse ter conseguido um "acordo", sem revelar detalhes. Henry ainda não conseguiu voltar ao Haiti: depois de desistir de pousar em Porto Príncipe e de ter o pouso negado na República Dominicana, ele seguiu para Porto Rico, um território não incorporado dos EUA, de onde não sabe quando sairá.

Além da pressão interna, os EUA demonstram impaciência com a crise e com a permanência de Ariel Henry no cargo. Em conversa com o premier, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, exigiu uma transição "urgente" de poder, citando a "necessidade de um governo mais inclusivo que inclua mais forças políticas e tenha força para conduzir o país no período eleitoral".

— Precisamos fazer mais e de forma urgente. A crise no Haiti tem proporções que demandam uma resposta global, da mesma forma como a comunidade internacional está respondendo aos desafios na Ucrânia e em Gaza — disse o secretário de Estado adjunto para assuntos do Hemisfério Ocidental, Brian Nichols, em um evento do Council of Americas.

Impacto da violência

Segundo pesquisa da MSF, 40% das mortes do Haiti entre agosto de 2022 e julho de 2023 foram ligadas de alguma forma à violência, com uma assustadora taxa de 0,63 homicídio por grupo de 10 mil pessoas por dia. Esses padrões são semelhantes aos vistos em áreas controladas pelo grupo terrorista Estado Islâmico na Síria em 2017, ou aos documentados em meio à perseguição do Exército de Mianmar contra a minoria Rohingya.

Pessoas caminham diante de tribunal incendiado por gangues em Porto Príncipe — Foto: CLARENS SIFFROY / AFP
Pessoas caminham diante de tribunal incendiado por gangues em Porto Príncipe — Foto: CLARENS SIFFROY / AFP

O caso de Cité Soleil, maior comunidade de Porto Príncipe, mereceu destaque: 13% dos moradores afirmam ter presenciado atos de extrema violência, incluindo homicídios e linchamentos. Outro número que representa a situação crítica são as 40% de mulheres que reconheceram não terem feito exames pré-natais por medo de sair na rua. No período também foi registrada uma forte alta dos casos de violência sexual, com pelo menos quatro mil mulheres em busca de cuidados junto à organização.

“Estou acostumado a ver corpos no chão. Acostumado a ver corpos carbonizados. Acostumado a ouvir disparos”, afirmou, em depoimento ao estudo, um funcionário da MSF no Haiti. “Estou falando de terror, de violência armada, de violência física, de violência psicológica. Estou falando de miséria.”

Os números são de um período que antecedeu o que a ONU considera um dos maiores saltos de violência no país em anos. Janeiro, por exemplo, foi considerado o mês mais mortal em dois anos, com 804 homicídios — em todo o ano de 2023, foram contabilizados 4,7 mil assassinatos no país, números que, para a MSF, estão subestimados. A organização afirma que, no ano passado, contabilizou 2,3 mil homicídios apenas em Cité Soleil, uma área que reúne 9% da população haitiana.

Diante da nova onda de violência, a MSF afirma que suas instalações estão lotadas, e a capacidade de leitos precisou ser ampliada, inclusive para atender crianças.

"Quando você é um pai de família e vê uma menina de dois anos chegando com um ferimento de arma de fogo, é realmente chocante", afirmou um funcionário da MSF, citado no estudo. "É chocante ver crianças em idade escolar, que não têm nada a ver com as gangues, sendo baleadas e terem balas em seus corpos."

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