O governo da Argentina anunciou, nesta segunda-feira, que quem participar de protestos com bloqueios de ruas deixará de receber os programas de assistência social. A declaração foi feita pela ministra do Capital Humano, Sandra Pettovello, dois dias antes da primeira manifestação após a posse de Javier Milei, o "Argentinazo", que relembra os 39 mortos nos protestos de 19 e 20 de dezembro de 2001, ano da pior crise econômica, social e política que o país já viveu.
— Os únicos que não irão receber os (auxílios) são os que vão ao protesto e bloqueiam as ruas — advertiu Pettovello em um discurso.
Pettovello também mirou os organizadores das manifestações:
— Informamos que todos aqueles que tenham promovido, instigado, organizado ou participado dos bloqueios perderão o diálogo com o Ministério do Capital Humano — disse a ministra da nova pasta que absorveu as anteriores de Educação, Cultura, Trabalho e Desenvolvimento Social. — Quem bloqueia não recebe.
Na Argentina, existe uma grande quantidade de programas de assistência social. Alguns desses são recebidos de forma direta, na conta bancária do beneficiário. Outros são recebidos através de uma organização que funciona como intermediária entre o Estado e o cidadão. A ministra anunciou que começarão a auditar as organizações sociais e que o objetivo é eliminar essa intermediação.
Além disso, como já havia feito o ministro da Economia, Luis Caputo, ratificou que duplicará a ajuda para as famílias com filhos menores de idade e aumentará em 50% o auxílio para compra de alimentos, duas medidas destinadas à população mais vulnerável.
A primeira grande manifestação após a posse de Milei ocorrerá no aniversário do "Argentinazo" — onda de protestos contra o governo, entre 19 e 20 de dezembro de 2001, que levaram à queda do então presidente Fernando de la Rúa.
Novas medidas
Os anúncios de Pettovello ocorrem depois que a ministra da Segurança, Patricia Bullrich, apresentou, na semana passada, o Protocolo de Ordem Pública, conhecido como "Protocolo Antipiquetes", que tem como objetivo impedir o bloqueio do tráfego pelas manifestações.
— Se não há ordem, não há liberdade, e se não há liberdade, não há progresso — disse Bullrich.
Além de prever o uso da Polícia Federal, da Gendarmeria (de natureza militar) Nacional, da Prefeitura e da Polícia de Segurança Aeroportuária, o protocolo contempla que os realizadores das manifestações paguem os custos da operação.
Novas medidas contra protestos na Argentina:
- As quatro forças federais de segurança, o Serviço Penitenciário e polícias provinciais vão intervir em protestos, bloqueios e piquetes que bloqueiem total ou parcialmente as vias.
- Não há novas leis na mesa: segundo Bullrich, as forças vão aplicar as normas já existentes, e que segundo ela não estavam sendo observadas.
- Não será mais adotada a estratégia de usar vias alternativas para desviar o trânsito. "Se a via for bloqueada, a via será desbloqueada", afirmou a ministra.
- As forças atuarão de maneira "necessária" e "adequada ao grau de resistência", e elas só vão deixar o local quando a via estiver desobstruída.
- Todos que participarem de protestos considerados ilegais serão identificados e poderão ser processados; veículos usados nos atos poderão ser apreendidos caso não estejam devidamente documentados; estrangeiros com residência temporária serão encaminhados ao serviço migratório.
- Agentes em estações ferroviárias terão o poder de apreender materiais considerados suspeitos, como pedaços de pau e máscaras que dificultem a identificação.
- Danos ambientais serão levados a um juiz específico.
- A presença de crianças e adolescentes em manifestações que bloqueiem vias públicas está vetada, e os responsáveis por levar os menores aos atos serão processados.
- Os gastos relativos a danos e ao emprego das forças de segurança serão enviados aos organizadores dos atos, como associações sindicais e partidos políticos.
- Será criado um cadastro nacional de organizações que realizem protestos em vias públicas.
A ação contra os protestos, ou "piquetes", como são chamados em espanhol, era algo previsível por parte do governo de Milei. No discurso de posse, ele disse que "aqueles que fecham as ruas não podem cobrar", uma frase que se tornou uma espécie de mantra na pasta de Segurança Pública. Ao declarar as palavras, ele também fez uma defesa das forças de segurança, que agora devem ter mais poderes para desfazer manifestações.
Protestos nas ruas são uma imagem comum na Argentina, especialmente no Centro de Buenos Aires, não importa o viés ideológico das lideranças de ocasião na Casa Rosada. De acordo com a consultoria Diagnóstico Político, houve 568 protestos com fechamento de ruas no país em novembro, sendo 50 apenas na capital federal. Em junho e em agosto, o número superou os 800 atos, e lideranças agora de oposição não se mostraram intimidadas pelas novas regras, chamadas de "repressoras", "ofensivas contra os trabalhadores" e "ilegais".