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Tentativa de fuga deixa cinco mortos no aeroporto de Cabul durante retirada de estrangeiros após Talibã tomar o poder; veja vídeo

Centenas de afegãos foram para o aeroporto em busca de voos de fuga, mas apenas voos militares estão decolando da capital afegã; americanos assumem responsabilidade por duas mortes
Soldado americano aponta arma para afegão que aguarda voo para fugir do país Foto: WAKIL KOHSAR / AFP
Soldado americano aponta arma para afegão que aguarda voo para fugir do país Foto: WAKIL KOHSAR / AFP

CABUL E WASHINGTON —  Ao menos cinco pessoas morreram durante um tumulto no aeroporto internacional de Cabul nesta segunda-feira, segundo testemunhas, quando soldados americanos faziam a segurança do perímetro para acelerar a retirada de diplomatas e cidadãos ocidentais.

As cenas de caos aconteceram quando centenas de afegãos, apavorado, foram para o aeroporto em busca de voos de fuga e tentaram embarcar nos aviões destinados à remoção de estrangeiros, um dia após o Talibã retomar a capital afegã , quase 20 anos depois de ser expulso do poder pela invasão americana de outubro de 2001.

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Em uma entrevista coletiva em Washington, o porta-voz do Pentágono, John Kirby, disse que a resposta de militares dos EUA resultou na morte de "dois indivíduos" que teriam atirado nos americanos, mas que não há indício de que sejam integrantes do Talibã. Vídeos de autenticidade não confirmada mostram ao menos duas pessoas caindo de um avião militar americano após se esconderem na roda ou nas asas de uma aeronave.

Multidão tenta escapar do Talibã pelo aeroporto de Cabul, nesta segunda-feira (16 de agosto). Imagens mostram o que seriam pessoas caindo do trem de pouso de um avião de transporte C-17, da Força Aérea dos EUA.
Multidão tenta escapar do Talibã pelo aeroporto de Cabul, nesta segunda-feira (16 de agosto). Imagens mostram o que seriam pessoas caindo do trem de pouso de um avião de transporte C-17, da Força Aérea dos EUA.

Os EUA estão na última fase da retirada de suas forças de combate do Afeganistão, mas mantiveram o controle do aeroporto internacional de Cabul e do espaço aéreo da capital mesmo depois de o Talibã entrar na cidade e ocupar o palácio presidencial após a fuga do presidente pró-Ocidente, Ashraf Ghani, no domingo. Embora Washington tenha decidido esvaziar a embaixada e remover seus cidadãos, eles não chegaram a ser alvo de nenhuma ameaça explícita dos talibãs, que têm afirmado que não atacarão diplomatas estrangeiros.

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Após as decolagens terem sido suspensas em meio ao caos na tarde desta segunda (manhã no Brasil) para que a pista fosse esvaziada, o Pentágono informou na madrugada de terça (noite de segunda no Brasil) que o aeroporto foi reaberto. Mais tropas americanas estão sendo enviadas ao local para reforçar a segurança, segundo havia informado mais cedo Jon Finer, vice-conselheiro de Segurança Nacional dos EUA.

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A multidão começou a se dirigir ao Aeroporto Internacional Hamid Karzai ainda antes do dia escurecer no domingo, tentando embarcar nos últimos voos comerciais antes que fossem cancelados. Dezenas de pessoas pularam muros e cercas enquanto soldados americanos, muitos com armas em punho, protegiam a remoção de seu pessoal.

As pessoas chegaram a se agarrar à fuselagem de aviões militares que taxiavam na pista, enquanto se preparavam para decolar.

Em um vídeo compartilhado nas redes sociais, cuja autenticidade não pôde ser confirmada, é possível ver três corpos no chão, perto do que aparenta ser uma entrada lateral. Outra testemunha disse ter visto cinco corpos. Com o cair da noite desta segunda em Cabul, disse um repórter da al-Jazeera no local, o Talibã criou um cordão para impedir que as pessoas cheguem ao terminal do aeroporto e dispara para o alto para afastar a população da região.

Os Estados Unidos abriram mão de sua grande base militar em Bagram, a cerca de 60 km ao norte da capital, há semanas, em uma etapa da retirada de suas tropas do país. Logo, o aeroporto de Cabul é a única rota de fuga para os americanos, algo que causa ira em muitos afegãos:

— Esse é o nosso aeroporto, mas nós estamos vendo diplomatas serem retirados enquanto nós esperamos na incerteza completa — disse Rakhshanda Jilali, ativista de direitos humanos, à Reuters.

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O caos no aeroporto vem horas após o Talibã afirmar que a "guerra chegou ao fim" e emitir uma série de comunicados afirmando que seus soldados receberam a ordem de não atirar ou atacar ninguém. Em seu Twitter, Suhail Shaheen, um dos porta-vozes do grupo, disse que "a vida, a propriedade e a honra de ninguém devem ser prejudicadas, mas sim protegidas".

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No domingo, o Pentágono autorizou o envio de mil soldados adicionais para o Afeganistão para ajudar na retirada de cidadãos americanos e afegãos aliados, expandindo sua presença militar no país para quase 6 mil soldados nas próximas 24 horas. Durante a madrugada, o Departamento de Estado confirmou que todo o seu pessoal diplomático, incluindo o embaixador Ross Wilson, foram levados para o aeroporto de Cabul, onde a missão americana funciona agora. A bandeira do país também foi retirada do complexo em que fica a embaixada.

O governo americano estima ainda que haja cerca de 88 mil aliados afegãos, como intérpretes e ativistas, e seus parentes que deram entrada em pedidos de visto especiais para ir para os EUA. Cerca de 2 mil deles, segundo a Secretaria de Defesa, foram resgatados até o momento e, à Reuters, um funcionário do governo americano disse que Washington estuda removê-los temporariamente para as bases militares Fort McCoy, no Wisconsin, e Fort Bliss, no Texas.