Patrícia Kogut
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Kate Winslet ganhou um Emmy em 2021 com “Mare of Eastown”. Ela interpretava uma policial. Era uma espécie de “mulher de verdade” levada ao paroxismo: cansada, fora de forma para correr atrás dos bandidos, triste e, sobretudo, sem glamour. “O regime”, estreia do Max, exige da atriz uma chave oposta a tudo isso. Criada por Will Tracy, que era do time de roteiristas de “Succession”, essa série era a mais esperada da temporada. Serão seis episódios (lançados todo domingo, às 23h). Por ora, há um disponível na plataforma. Merece a sua atenção.

Esqueça Mare. Agora, é quase como se Kate Winslet encarnasse a “mulher de mentira” por excelência. Sua personagem, Elena Vernham, lidera um país fictício da Europa Central. É uma autocrata de manual, cercada de puxa-sacos.

Do figurino à caracterização, ao tom de voz e ao gestual, tudo transmite cálculo milimétrico. Vernham não é nenhum dos líderes que conhecemos (no sentido da imitação literal). Mas reúne traços de vários deles, numa citação de espectro amplo. A governante é um composto de Putin, tem um pouquinho de Erdogan e um quê de Stalin. Essas características estão na aversão aos Estados Unidos e ao Ocidente, na obsessão com a ideia de que pode ser assassinada por alguém do círculo próximo e no culto à personalidade. Numa sala do seu palácio, ela conserva o corpo embalsamado do seu pai, morto um ano antes e que também era político. Ela faz pensar no mausoléu de Lênin, na Praça Vermelha, em Moscou, e no Memorial de Mao Tsé Tung, que atrai filas e filas de visitantes em Pequim. Como tudo nessa produção é puro simbolismo, o pai da ditadora está apodrecendo. Ela nota isso graças a manchas amarronzadas que surgem em sua testa.

O maior inimigo de Vernham, no entanto, é invisível: toxinas transmitidas por fungos que se espalhariam pelo ar. Para protegê-la desse perigo que talvez seja imaginário, ela convoca um militar de baixa patente que participou de uma ação sanguinária. Zubak (Matthias Schoenaerts) tem como missão medir a umidade em torno dela o tempo todo com um dispositivo portátil.

Zubak é um representante legítimo da ideia da “massa de manobra”: Vernham explica que o contratou por ele ser “um ninguém”. Espera submissão irrestrita: tenta convencê-lo de que até dormindo ele sonha os mesmos sonhos que ela.

“O regime” promove uma viagem por caminhos surreais inspirada por figuras e situações extraídas dos noticiários. Ela mistura linguagens e signos. O primeiro episódio é interessante e também causa estranheza. Como em todas as produções que optam pela hiperestetização, o público que prefere o realismo mais “sujinho” e carregado de emoção pode não embarcar.

De qualquer maneira, Kate Winslet — majestosa e dominando tudo, na ficção e no seu trabalho de atriz — faz uma festa.

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