As moquecas de Salvador

Pois já comi no Canindé, em São Paulo, galinhada melhor do que a do Alex Atala. Caipirinhas de barracas de praia muitas vezes ganham das dos hotéis chiques

Por — Salvador


Salvador, Bahia Paul R. Burley / Wikimedia Commons

Acabo de voltar de Salvador e, se fecho os olhos, a memória me leva direto de volta ao gostoso borbulhar das moquecas que lá comi. A primeira, no restaurante Amado — do veterano chef Edinho Engel —, foi uma injeção de felicidade. Farta em todos os sentidos, deliciosa. Realçada por boas risadas com amigos e um vinhaço. A segunda, de camarão, foi num sábado de sol à beira da piscina do hotel Fera Palace. Sem medo de ser baiana, ao contrário de tantas versões para turistas com pouco ou nenhum dendê, servida com farofa bem amarela e crocante.

A terceira, na Cantina da Lua, também era das boas. Pudera: o octogenário Clarindo Silva, primeiro magro eleito Rei Momo, anos atrás, segue cuidando de perto desse clássico fundado no centro histórico em 1945.

Gosto mais ainda de moquecas com ingredientes “pobres”. Por isso a quarta da série, no restaurante Ori, foi a que me levou ao céu. Da mesa eu já sentia o cheirinho de ovos frigindo na manteiga. Eles chegaram submersos no caldo grosso e borbulhante, entremeados com peixe e camarão. A farofa? Crocantíssima! O arroz? Perfumado com coco. Se o grau de gostosura não me surpreendeu foi porque o chef Fabrício Lemos estava na cozinha... O craque que também comanda com sua mulher (e patissière) Lisiane Arouca o premiadíssimo Origem e os restaurantes do Fera Palace.

A lei da probabilidade, no entanto, me pegou. Ao pedir a derradeira, no conhecido Bar da Mônica, aos pés da Gamboa, favela à beira-mar, estrepei-me. Rodelas de banana-da-terra viscosas, peixe magro de carne escura, caldo ralo e sem gosto, farofa molenga, tudo errado! Justo ali, onde vi pescadores carregando baldes cheios de polvo, lagosta e peixe recém-saídos do mar! “Que injustiça”, dirão os haters, “comparar a moqueca de uma favela às de gente famosa e premiada!” Pois já comi no Canindé, em São Paulo, galinhada melhor do que a do Alex Atala. Caipirinhas de barracas de praia muitas vezes ganham das dos hotéis chiques. Em se caprichando, (quase) tudo dá...

Mais recente Próxima Por uma Páscoa sem ovos brilhosos