O advogado Frederick Wassef era dono do imóvel em Atibaia onde o policial aposentado Fabrício Queiroz foi preso, em junho de 2020. Essa foi uma das polêmicas envolvendo o advogado do clã Bolsonaro, que é um dos alvos, nesta sexta-feira, de uma operação da PF que investiga um suposto esquema de venda de presentes dados ao Estado brasileiro durante missões oficiais no exterior.
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Na época da prisão de Queiroz, Wassef assumiu em entrevista à revista "Veja" ter escondido o ex-assessor parlamentar de Flávio Bolsonaro com o objetivo proteger o então presidente Jair Bolsonaro e o filho, o senador Flávio, já que Queiroz poderia ser assassinado “por forças ocultas” e, com isso, a família do ex-presidente seria investigada.
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Segundo Wassef, Bolsonaro não sabia da sua decisão de ajudar Queiroz em meio à investigação pelo esquema da rachadinha na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), da qual o ex-assessor parlamentar e o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) já eram alvos.
No ano passado, o advogado se valeu da proximidade com o clã presidencial para tentar se tornar ele próprio um político. Candidato a uma vaga na Câmara federal por São Paulo, ele não obteve sucesso na empreitada. Utilizando na campanha o apelido de "anjo" dado por Fabrício Queiroz, conquistou quantidade insuficiente para sagrar-se vitorioso. Com 100% das seções totalizadas, foram apenas 3.628 votos.
A publicação de “estreia” no Instagram, no lançamento da campanha eleitoral, anunciava: “O anjo chegou”. O apelido era como o ex-assessor parlamentar se referia ao advogado em conversas com seus familiares obtidas pela polícia com autorização judicial.
Em novembro de 2021, em meio à pandemia de Covid-19, o advogado foi barrado no Supremo Tribunal Federal (STF) por não ter apresentado comprovante de vacinação. A Corte comunicou, na ocasião, que o documento era exigido a todos que frequentassem o tribunal. Em sessão daquele dia, a Segunda Turma do STF deu duas vitórias a Flávio Bolsonaro. Primeiramente, negou pedido do Ministério Público (MP) do Rio de Janeiro para devolver a investigação das "rachadinhas" para a primeira instância. Com isso, foi mantida a decisão do Tribunal de Justiça (TJ) estadual que deu foro privilegiado a Flávio. Depois, anulou quatro dos cinco relatórios feitos pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) que embasaram a investigação das "rachadinhas".
Em fevereiro de 2022, Wassef tornou-se réu pelos crimes de racismo e injúria racial, por decisão da 3ª Vara Criminal de Brasília. Procurado, na época, Wassef negou as acusações e se disse vítima de perseguição e "fraude processual". A denúncia descreve dois episódios envolvendo Wassef em uma pizzaria em Brasília. Em um deles, ele teria dito a uma funcionária, segundo a denúncia: "Não quero ser atendido por você. Você é negra e tem cara de sonsa e não vai saber anotar meu pedido". No outro, Wassef teria chamado a funcionária de "macaca".
A denúncia pede ainda a condenação de Wassef ao pagamento de danos morais no valor de R$ 20 mil à vítima e R$ 30 mil de danos morais coletivos à sociedade, além da condenação nos crimes previstos no Código Penal e na lei dos crimes resultantes de preconceito de raça e cor.
Carreira na advocacia e relação com os Bolsonaro
A relação com a família começou em 2016, quando a candidatura de Jair Bolsonaro à Presidência ainda era tratada como um devaneio político. Muito antes de a campanha começar, segundo um assessor do presidente, Wassef aparecia seguidas vezes no gabinete do então deputado em Brasília dizendo-se “amigo dos maiores PIBs do Brasil” e prometia apresentá-los a Bolsonaro. À medida que a relação foi se estreitando, o advogado passou a atuar como mentor das estratégias jurídicas da família.
Entre outros casos, deu conselhos sobre as ações movidas pela deputada Maria do Rosário (PT-RS) contra o então deputado e sobre as movimentações atípicas de R$ 1,2 milhão feitas por Queiroz entre 2016 e 2017.
A suposta proximidade de Wassef com a cúpula do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, segundo contou um interlocutor próximo do presidente, foi um dos motivos que levaram Bolsonaro a ser transferido ao hospital paulista depois de ter levado uma facada em Juiz de Fora, em 2018. Também por essa razão, o ex-motorista Fabrício Queiroz teria sido internado no hospital para a retirada de um câncer.
Até a ascensão dos Bolsonaro ao Planalto, Wassef estava longe de ser um advogado famoso no país. O marco inicial de sua carreira foi o ano de 1992, data de seu registro na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Seu nome constava em poucos processos judiciais. Em entrevista à ÉPOCA em 2019, Wassef mencionou quatro criminalistas com os quais teria trabalhado. Procurados pela revista, dois não responderam e os outros negaram qualquer relação profissional com ele.
Wassef parece ter ganho alguma visibilidade a partir da união estável que teve com a empresária Maria Cristina Boner Leo. Segundo pessoas próximas, José Luís Oliveira Lima e Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, conhecidos criminalistas do país, só conheceram Wassef porque ele era marido de Boner. Um dos processos que Wassef assina envolve a separação litigiosa da empresária com seu ex-marido Antonio Bruno Di Giovanni Basso, ex-vice-presidente de contas de mercado governamental da Microsoft. A relação amorosa entre o advogado e Boner começou antes que o casamento da empresária chegasse ao fim.
Wassef, que enfrentou quatro cânceres e foi desenganado, cultiva uma paranoia: existiria um complô envolvendo Basso, pessoas ligadas à ex-mulher, jornalistas e criminosos interessados em acabar com sua reputação. A razão seria o sentimento de vingança do ex-marido, que foi condenado e preso por extorsão, processo no qual Wassef foi assistente da acusação.
Um caso profissional na carreira chama a atenção. Há quase três décadas, quando tinha 26 anos, Wassef foi advogado de Valentina de Andrade, líder de uma seita que acreditava em contatos com extraterrestres e que Deus era maligno. Acusada de participação num crime que envolvia a morte de crianças em rituais de magia negra, nunca foi indiciada. No meio da investigação, a prisão temporária de Wassef chegou a ser pedida sob a alegação de que ele convivia com os membros da seita, o que não chegou a ser apreciado pela Justiça.
Por iniciativa própria, Wassef chegou a ir à delegacia para se defender. Em seu depoimento no dia 14 de outubro de 1992, contou que se aproximou de Andrade depois de ler um livro chamado Deus, a grande farsa, escrito por ela. Confessou ter sentido “grande curiosidade” pelo assunto e que, após a leitura, procurou-a e trocaram correspondência por três anos até se tornarem amigos. Wassef, no entanto, nega ter feito parte do grupo — embora tenha narrado à polícia os encontros dos quais participava com integrantes.