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Por — O Globo

"Toda a região em alerta para calor extremo! Evite sair nos horários mais quentes!" Esse foi um dos avisos enviados aos moradores de Pindamonhangaba, no interior de São Paulo, durante a onda de calor que tomou o país na terceira semana de setembro. Em alguns bairros da cidade, a temperatura passou dos 40ºC.

Para mapear os locais de risco, a prefeitura passou a monitorar dados coletados por sensores de temperatura e umidade instalados em sete pontos. O cruzamento e análise das informações eram feitos por inteligência artificial (IA), e os alertas foram disparados pelo aplicativo da prefeitura.

— A partir dos 37ºC nós já ficamos em alerta — conta o secretário de Tecnologia, Inovação e Projeto, Danilo Velloso, que coordenou a implantação do sistema. — Os sensores também ajudam a definir ações. Agora estamos cruzando dados de ilhas de calor com o de árvores para definir um plano de arborização.

A tecnologia usada pela cidade paulista foi desenvolvida pela iNeeds, que também fabrica bueiros inteligentes e sensores de encostas. A startup faz parte de um segmento que cresce diante do avanço dos desafios climáticos: são as chamadas “climatechs”. Em 2022, o segmento abocanhou US$ 70 bilhões em capital de risco, segundo a consultoria Holon IQ, uma alta de 89% em relação ao ano anterior. E o uso de IA vem ajudando o segmento a criar soluções.

Da estiagem que seca o Norte aos ciclones que arrasaram o Sul do país, a IA ajuda empresas de diferentes setores a se prepararem para eventos extremos. Isso inclui fazer previsões de longo prazo, cruzar variáveis climáticas e econômicas, e analisar cenários específicos para uma indústria.

Dos mares às florestas

A i4sea, da Bahia, e a catarinense Quiron são duas dessas startups que estão prevendo eventos extremos. A primeira monitora a zona costeira brasileira e gera alerta às empresas sobre tempestades e condições do mar. O Porto de Santos, o maior da América Latina, é um dos clientes. Já o foco da Quiron está nas florestas, especialmente para prevenção de queimadas.

Mateus de Oliveira (dir.), CEO e cofundador da i4sea, empresa que usa IA para monitorar a costa — Foto: Divulgação/i4sea
Mateus de Oliveira (dir.), CEO e cofundador da i4sea, empresa que usa IA para monitorar a costa — Foto: Divulgação/i4sea

— Nós regionalizamos modelos de previsão global até chegar a uma escala super localizada de microclima. Também traduzimos as informações (para os clientes). Por exemplo, sobre a necessidade de interromper a operação de navios de determinados tamanhos — conta o oceanógrafo Mateus de Oliveira, CEO e cofundador da i4sea.

A frequência maior de eventos extremos na costa brasileira é algo que já aparece no radar da empresa. Segundo a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), ao menos cinco portos brasileiros têm risco elevado para ameaça climática, considerando o aumento do nível do mar até 2030.

Quiron, de Santa Catarina, usa IA para prever risco de queimadas — Foto: Divulgação/Quiron
Quiron, de Santa Catarina, usa IA para prever risco de queimadas — Foto: Divulgação/Quiron

Com processamento de dados brutos geoespaciais, a Quiron usa informações de satélites para ajudar empresas na prevenção de queimadas em floresta. Negócios de papel e celulose estão entre os principais clientes da startup, que atua no Chile, Portugal e Brasil, e monitora 500 mil hectares. A IA entra para processar os dados, explica Gil Pletsch, CEO da Quiron:

— Para fazer a predição do risco de incêndio, levamos em consideração informações como relevo, densidade da vegetação, nível de perda de água e dados meteorológicos para os próximos dez dias. Na prática, as informações ajudam na tomada de decisões, para restrição de acesso à área e operação de aceiros, por exemplo. Atuamos de forma preditiva para combater o incêndio antes de ele acontecer.

Preço das 'commodities' e análise de crédito

Ter uma visão ampliada desses movimentos que mexem com o clima é estratégico para economia brasileira, que tem uma matriz energética que depende prioritariamente da água e cerca de um quarto do PIB que vem da agricultura. No ranking ND-GAIN, que mede a resiliência climática dos países, o Brasil vai mal: aparece na 86ª posição.

O tema está no radar das lideranças empresariais. Uma pesquisa da Accenture no Brasil mostra que a emergência climática ocupa o segundo lugar entre as preocupações mais citadas por executivos de nível sênior. Felipe Bottini, diretor executivo de Sustentabilidade da Accenture América Latina, diz que o uso de modelos preditivos deve "preencher um espaço relevante" entre as tecnologias de adaptação climática no setor privado.

Em um escritório na Vila Madalena, em São Paulo, 17 pessoas da MeteoIA trabalham com processamento de dados atmosféricos e oceânicos para mapear efeitos em determinadas indústrias. Um dos projetos atuais é para o agro: a previsão de chuva e temperatura no longo prazo para medir a produtividade de commodities. O setor está entre os mais vulneráveis ao impacto de eventos extremos, como estiagens, chuvas intensas e geadas.

— Nós perguntamos aos clientes o que eles precisam que a gente desenvolva, que tenha a ver com o clima, e criamos uma cadeia de modelos de IA para fazer essa previsão — explica Gabriel Perez, cofundador da MeteoIA.

Thomas (esq.) e Gabriel (dir.), cofundadores da MeteoIA, em São Paulo — Foto: Maria Isabel Oliveira
Thomas (esq.) e Gabriel (dir.), cofundadores da MeteoIA, em São Paulo — Foto: Maria Isabel Oliveira

Entre as indústrias que se beneficiam com a visão de mais longo prazo sobre o clima, está a financeira. O tema tem entrado no radar de bancos centrais, incluindo o brasileiro. Em resolução de 2021, o BC determinou que as instituições financeiras incluíssem efeitos das mudanças climáticas em suas políticas de gerenciamento de riscos.

Em parceria com a Sipremo, o Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) usa redes neurais de IA para calcular risco do clima em concessões de crédito. As ferramentas da startup computam o nível de exposição dos projetos durante o período em que eles ficarão vinculados ao banco, incluindo fatores como vulnerabilidade a alagamentos e deslizamentos.

— Eles nos passam o local, o período e a atividade que vai ser feita. Nós conseguimos mostrar os graus de suscetibilidade climática naquele período, para aquela localidade e finalidade, com base nos eventos que monitoramos — afirma Gabriel Savio, CEO da Sipremo.

As IAs que 'lêem' o futuro do clima

Apesar dos avanços recentes, o uso de IA na ciência do clima não é exatamente novo. Os registros do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostram que pesquisas nessa linha vêm sendo feitas desde o fim da década de 1980. A diferença, agora, é que os desafios para predição climática aumentaram. Os sistemas computacionais que rodam modelos de IA também se tornaram mais potentes, o que ampliou a possibilidade de uso.

Rafael Santos, coordenador de Pesquisa Aplicada e Desenvolvimento Tecnológico do Inpe, estuda o tema há mais de 30 anos. Ele diz que os modelos matemáticos convencionais para predição climática são indispensáveis, mas têm limitações, principalmente diante das alterações que vêm acontecendo na dinâmica do planeta e da necessidade de previsões mais localizadas.

— Como você coloca no modelo matemático o desmatamento aumentando e as pessoas colocando fogo na floresta? É tão complexo que exigiria equações matemáticas cada vez maiores, que usam recursos computacionais caríssimos. Com a IA, nós medimos o que aconteceu antes e depois, para criar inferências sobre o que vem pela frente.

Escritório da ClimaTempo, em São Paulo; empresa usa IA desde 2009 para previsão climática — Foto: Divulgação/ClimaTempo
Escritório da ClimaTempo, em São Paulo; empresa usa IA desde 2009 para previsão climática — Foto: Divulgação/ClimaTempo

Além de instituições de pesquisa e startups, a aliança entre IA e clima tem avançado também entre as big techs que vêm liderando os esforços mais recentes em inteligência artificial. Google, Microsoft e NVIDIA são algumas das empresas com projetos na área)

Para Santos, a IA não irá substituir nem os modelos climáticos tradicionais, nem os pesquisadores que os aplicam, mas é um complemento que vem se mostrando eficiente. Gilca Fernandes, diretora de Inovação, Pesquisa e Desenvolvimento da Climatempo concorda:

— Na Climatempo, começamos a trabalhar com IA em 2009 para prever a vazão de rios. O que tem dado certo é a combinação dos modelos meteorológicos, dos dados históricos e da inteligência artificial. E aí você começa a ter resultados interessantes.

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