As operadoras querem trazer de volta uma proposta antiga derrubada sucessivas vezes no Congresso: a desregulamentação das coberturas assistenciais para garantir produtos de preços mais baixos, dizem especialistas. Para eles, a aprovação dessa pauta em ano eleitoral é vista praticamente como fora de questão. Ainda assim, caso aprovada, poderia ter algum impacto em aumento de filas no Sistema Único de Saúde (SUS).
- Cobertura limitada, prontuário unificado e outras mudanças na lei: O que os planos de saúde pedem e os deputados querem em troca
- Entenda: Por que os planos de saúde suspenderam os cancelamentos unilaterais? Valerá para todos?
A escalada de contratos coletivos rescindidos unilateralmente por operadoras ao longo dos últimos meses tem um peso central nesse debate, diz Mario Scheffer, professor do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP e especialista em saúde suplementar:
— Sempre que tem uma oportunidade política, as operadoras requentam essa demanda de desregular o reajuste e a cobertura dos planos. Agora, querem legalizar o que já vinham fazendo por meio de rescisões unilaterais de contratos (de planos de saúde coletivos), que é expulsar beneficiários tidos como gastadores, não lucrativos — diz Scheffer. — A meta é alterar a lei para excluir, a priori, essas pessoas desses novos planos.
Na prática, continua o especialista, a exclusão dessas pessoas já vem sendo feita pelas operadoras de saúde, por meio da rescisão unilateral de contratos ou de reajustes abusivos de mensalidade, que acabam forçando o beneficiário a cancelar ou migrar para outro plano de menor valor.
Desde 1998, com a Lei dos Planos de Saúde, as empresas do setor ficaram obrigadas a oferecer cobertura para os procedimentos previstos pela regulação e listados a cada dois anos pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) em um rol assistencial. Foram proibidas de negar entrada de beneficiários por idade, condição de saúde e outros fatores.
Atualmente, as empresas podem elaborar planos assistenciais de acordo com 12 diferentes modalidades. Cada uma deve atender aos procedimentos de cobertura obrigatória. A mais simples delas é a de cobertura ambulatorial, que cobre consultas médicas em clínicas ou consultórios, exames, tratamentos e procedimentos sempre ambulatoriais. Está coberto ainda o atendimento emergencial nas 12 primeiras horas.
‘Deixa de ser plano’
Especialista em saúde pública e professora do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva (Iesc) da UFRJ, Lígia Bahia diz que, ao restringir a cobertura a consultas e exames de baixa complexidade, o produto deixaria de ser plano de saúde:
— É um benefício de saúde e não condiz com a lógica do pré-pagamento como garantia para um risco futuro. Se tirar o risco, para que pré-pagamento? A lei regulamenta os planos de saúde. Empresas que constituem um fundo de saúde, isso é uma atividade diferenciada, que requer garantias, solvências.
Analistas frisam que, em ano de eleições, dificilmente parlamentares vão se comprometer a mexer na lei e restringir cobertura a usuários.
- Bem acima da inflação: Planos de saúde individuais terão reajuste de até 6,91%
Ligia diz que deve ocorrer algum impacto no SUS.
— Não é que vai sobrecarregar o SUS, porque ele já funciona como um resseguro dos planos de saúde — frisa ela. — Mas a pessoa faz exame por esse novo plano e, depois, precisa recorrer a um especialista, fazer um procedimento, ser internada? Vai para o SUS. E aí, ela perdeu tempo. E isso vai retardando tratamentos e tornando a fila do serviço público mais demorada.