Vim a Roma pela primeira vez com 19 anos, com meus pais e minhas irmãs, numa maratona de museus e lugares históricos — mais que turístico o objetivo da viagem era educativo. Em cada cidade que visitávamos aqui na Itália havia um guia para nos levar para um banho de arte, cultura e história, quase sempre exaustivo. Mas valeu como um intensivão universitário que serviu para toda a vida, um grande privilégio que mereceu minha eterna gratidão, por aprender a ver arte, por estudar in loco os movimentos da história, pelas cidades ancestrais e pelas paisagens deslumbrantes. Obrigado, pai, por me abrir essas portas e janelas da arte e da civilização e me dar uma base sólida para começar a vida adulta.
Cinquenta anos depois volto a Roma, depois de ter morado aqui por quatro maravilhosos anos e ter voltado inúmeras vezes, com as filhas, com os netos, e agora para apresentá-la à minha amada, que é de origem italiana mas ainda não conhecia a Cidade Eterna. Assim como eu, ela é louca pelo grande cinema italiano, de Fellini, Visconti, Bertolucci, Dino Risi, Antonioni, Pasolini, esses artistas que nos revelaram mundos de dramas e comédias que formaram gerações. Vamos fazer até um passeio nostálgico a Cinecittà, o Projac italiano, onde se pode ver os cenários e figurinos desses filmes que fizeram história, como o “mar” de plástico de Fellini de “E la nave va” e o vestido de Anita Ekberg entrando na Fontana di Trevi em “A doce vida”.
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Morar aqui, de 1983 a 1987, foi uma experiência transformadora, saindo do Brasil nos estertores da ditadura para viver em uma democracia civilizada, em que todas as correntes políticas estavam representadas, desde a Direita Nacional, de ex-fascistas, até o Partido Comunista de Enrico Berlinguer, criador do “eurocomunismo”, independente de Moscou, tudo que era inconcebível no Brasil dos militares, um sonho para a geração que tinha 20 anos em 1964.
Roma é o paraíso dos fotógrafos, para onde a câmera apontar é bonito. Os estilos arquitetônicos de todas as épocas desde o Império Romano se misturam e se integram, numa harmonia de ocres e terracota, de laranjas e rosas, cenários medievais de filmes de Pasolini, cenários eternos de filmes românticos, cenários dos anos dourados do cinema italiano e dos filmes americanos de Roma Antiga com corridas de bigas e lutas de gladiadores no Coliseu. Tudo isso vem à cabeça e ao coração quando se caminha por essas ruas milenares da capital do Império, onde foi construída a civilização ocidental como a conhecemos pelos filósofos, políticos, militares, poetas, escritores, escultores e pintores que viveram aqui.