Cultura Música Comportamento

'Sou um menino gay que se veste de drag. Não posso ocupar o espaço das trans', diz Pabllo Vittar, que lança 'Batidão tropical'

Novo disco é inspirado no forró eletrônico: 'É sobre o Norte e o Nordeste, tem forró, tem tecnobrega', conta a cantora, que tem mais seguidores do que RuPaul
Pabllo Vittar anunciou seu novo trabalho, 'Batidão tropical' Foto: Divulgação
Pabllo Vittar anunciou seu novo trabalho, 'Batidão tropical' Foto: Divulgação

Pabllo Vittar tem apenas cinco anos de carreira. É pouco tempo, mas não nos dias de hoje, num mundo regido pelas redes. Pabllo já se encaixa no conceito de popstar. Contabiliza hits e, em tempos pré-pandemia, colecionava shows lotados pelo país e apresentações em festivais internacionais. Ainda que todo esse público conheça sua imagem forte e feminina, ela gosta de lembrar que não é uma mulher trans. Por isso, pede a gentileza de ser tratada no feminino somente quando está “montada”:

— Eu sou um menino gay que se veste de drag. A gente vive no país que mais mata trans e travestis no mundo. Eu não posso ocupar o espaço de visibilidade delas. As trans são marginalizadas e passam por coisas que eu nunca passei e nunca vou passar. Neste mês do orgulho gay, então, é mais importante ainda reforçar essa mensagem.

Pabllo concedeu a entrevista ao GLOBO sem maquiagem nem roupas femininas:

— Então… quando estou assim, de gay ( risos ), eu gosto de ser tratado no masculino. Mas quando eu estou montada, prefiro no feminino, né? Afinal, eu passei horas me maquiando para alguém me chamar de macho? É fogo ( risos )...

Quando surge como a drag queen, ela está notadamente mais glamourosa que o maranhense Phabullo Rodrigues da Silva, o rapaz de 27 anos que mora com a mãe, em Minas, na mesma casa onde cresceu, apesar do sucesso e dinheiro

— Está ouvindo os passarinhos? Bem-vindo a Uberlândia — diz Pabllo, via Zoom.

Pabllo Vittar lança novo trabalho, inspirado no tecnobrega Foto: Divulgação/Ernna Cost / O GLOBO
Pabllo Vittar lança novo trabalho, inspirado no tecnobrega Foto: Divulgação/Ernna Cost / O GLOBO

O clima bucólico disfarça seu ritmo agitado. Hoje, às 21h, ela lança “Batidão tropical”. O quarto álbum chega às plataformas digitais, território no qual é parte da realeza. No Spotify, está entre os cinco brasileiros mais seguidos, perdendo apenas para outros pesos-pesados, como Anitta e Luisa Sonza. É a drag mais seguida do mundo, com 11 milhões de devotos no Instagram. Mais do que o dobro de RuPaul. A Time a listou como um dos dez líderes na cultura da próxima década. A cantora Dua Lipa diz que “Pabllo é brilhante” e avisa que aguarda um dueto. E a icônica revista "Attitude" a estampa na capa deste mês. Chegou a dominação mundial?

— “I can’t stop me” — diz Pabllo, às gargalhadas, citando a faixa do grupo sul-coreano Twice, algo como “nem eu consigo me parar”.

'Indestrutível' : 'A música tem uma mensagem forte para nossa comunidade', diz Pabllo Vittar

O bom humor de hoje contrasta com os perrengues da adolescência. Contando com o apoio da mãe, Verônica Rodrigues, Pabllo gostava de usar lápis nos olhos para ir à escola, aos 13 anos. Se o look ousado a aproximava das meninas, provocava a ira de rapazes:

— Uma vez, esvaziaram o pneu da minha bicicleta, e eu só repetia mentalmente: “Pelo menos não quebraram a minha cara”. E minha mãe dizia: “É só o começo. Prepare-se.”

Preparada, Pabllo se apresentou pela primeira vez aos 18 anos, numa boate de Uberlândia, para onde se mudou com a família aos 2. Inspirava-se em drags paulistanas como Márcia Pantera e Verônica. E era só o começo mesmo.

O DJ Johnny Luxo lembra de quando recebeu, em 2019, um vídeo de agradecimento de Pabllo por ter tocado “Open bar”, primeiro hit dela, numa festa da turma da moda:

— A Pabllo é vital neste tempo em que reacionários tentam deslegitimar os direitos dos LGBTQIA+.

Num momento em que a isenção é tema de debates no meio artístico, Pabllo assume uma posição: defende o impeachment de Bolsonaro.

— Sou contra cobrança, mas acho necessário que os artistas se posicionem — diz.

'Rapariga mesmo'

A música “Triste com T” (de “tesão”), do novo álbum, narra a lua de mel de uma noiva deixada no altar. “É o que dá ser piranha”, diz Pabllo no teaser:

— Sou rapariga mesmo. Não namoro porque gosto de ficar com muita gente. Fico com mulheres, homens héteros, homens gays… Gosto de corpos.

Falando em corpo, Pabllo dispensa enchimentos nos sutiãs. Diz que esquentam muito. E só mostra incômodo com uma curiosidade que desperta ao postar fotos de biquíni:

— Não adianta, posso estar vestida no Gucci mais incrível que todo mundo só quer saber onde escondi meu pau...

Ainda que a monogamia não seja lá seu forte, musicalmente é fiel a Rodrigo Gorky, do Bonde do Rolê, que tem assinado suas produções mais recentes. Em “Batidão tropical”, Pabllo e Rodrigo entregam dez faixas, bem calcadas no forró eletrônico, na intenção de realçar as raízes culturais da drag.

— “Batidão” é sobre o Norte e o Nordeste, tem forró, tem tecnobrega… E ando ouvindo muito Zé Ramalho. O Zé é incrível. Ai, manda um beijo para ele na matéria, por favor!

Feito.