Música
PUBLICIDADE
Por — Rio de Janeiro

Lá se vão 25 anos desde que Teresa Cristina surgiu cantando com os olhos fechados de tanta timidez no icônico (e extinto) Bar Semente, no coração da Lapa carioca. Ali, ela encorpou o levante que ajudou a revitalizar o bairro boêmio e soprar a brasa do samba na cidade, que andava meio apagada.

De lá para cá, a cantora e compositora de 55 anos, nascida em Bonsucesso, criada na Vila da Penha e que aprendeu a falar cantarolando músicas de Roberto Carlos, se consolidou com uma das maiores intérpretes de samba do país. Despontou também como importante voz política da cultura durante a pandemia, quando suas lives deram o que falar.

É esta trajetória que ela celebra com show nesse sábado (11), ao lado do Grupo Semente que a projetou, no Circo Voador. No repertório, a primeira música que cantou no palco da Lapa tem lugar garantido: "Mãe solteira", de Wilson Baptista.

"Meu mundo é hoje" (do mesmo Wilson Baptista e famosa na voz de Paulinho da Viola), "Carrinho de linha" (Walter Queiroz) e "Pra que discutir com Madame?" (Janet de Almeida e Haroldo Barbosa), além de um pout-pourri de sambas de terreiro da Portela, Império, e "uma macumbinha" completam a noite.

Nesta entrevista, Teresa, que também faz show na próxima segunda-feira (13), ao lado da orquestra Johann Sebastian Rio, dentro do projeto "Fim de tarde In Concert", na Sala Cecilia Meireles, lembra a teimosia com que enfrentou as críticas no início de sua carreira, quando definiam seu repertório como “empoeirado”. Revela que, como mulher negra, o amor é um lugar de dor em sua vida e conta ainda que, se antes evitava o tema justamente por isso, agora, com o protagonismo feminino no samba, se sente provocada a cantar sobre “os boys lixo”.

Você sempre se debruçou sobre o passado do samba. Ao olhar para trás, o que sente em relação a sua trajetória?

Fico feliz. Olhar para trás é algo que me acompanha desde o início da minha carreira, quando fui olhar para trás do samba. Cantar um repertório que ninguém estava interessado, falar de Noel, Candeia, Wilson Baptista, Nelson Cavaquinho... Recebi muita crítica. Sou de signo de água (peixes): a gente não guarda rancor, guarda o nome (risos). Diziam que era um repertório cheio de poeira: "Pra que cantar música velha?", questionavam.

Tinha certeza do seu caminho ou as críticas te encheram de dúvidas?

Tive mais certeza quando criticaram. Sou do contra. Não gosto que ninguém me diga o que fazer. Para isso, só sendo meu pai, minha mãe ou minha irmã. Tento aprender com as críticas. O que me serve, administro. O resto funciona como combustível de ódio para fazer exatamente o contrário. Foi assim que virei Vasco, que comecei a fazer live quando todo mundo dizia que não aguentava mais live na pandemia.

Assim como o carnaval, acredito que cantar samba é acordar gente. Por isso, me chateei quando falaram que eu cantava samba empoeirado. Aqueles sambas não mereciam estar empoeirados. Tenho muito orgulho de termos trazido para o imaginário das pessoas "Calo de estimação" e "Dona Joaninha", do Zé da Zilda. Samba de 1945.... Música não tem idade, é que nem perfume. Na verdade, vai além. Porque perfume para de ser fabricado. Pega um Herivelto Martins...

Mas, voltando, poder ver meus erros de longe é bom, as coisas que não faço mais...

Por exemplo?

Cantar de olho fechado. Eu perdia um montão de coisa. Podia ganhar introspecção. Interpretavam aquele gesto como se fosse uma coisa abstrata. Era simplesmente medo.

Você realmente teve uma evolução tremenda na sua postura em cena. Cantar, sempre cantou bem, mas era econômica na performance. Hoje, engole o palco. Concorda que fazia falta uma presença mais forte? Como foi se soltando?

Cansei de apanhar, era muita gente batendo. A internet estava começando e já começou no ódio. Tinha a coluna do (site) Samba & Choro. Não falavam uma coisa boa, era só marretada. "Essa mulher não tem emoção, parece que está morta", diziam. De tanto ouvir aquilo, falei: "Que saco, é só não ir me ver".

Mas algumas coisas me ajudaram. Quando gravei o segundo DVD, chamei a (coreógrafa) Márcia Rubin para ajudar a me soltar. Ela teve a maior paciência, fez um trabalho incrível, me deu várias ideias. Mas quando fui gravar, não fiz nada do que ela disse. E me senti culpada. Encontrava com ela e pensava: "Meu Deus, o que ela deve achar de mim?".

Não consegui executar naquele momento, mas levei para a vida. A coisa de mostrar o alinhavo antes do vestido pronto. E de não ter medo de se colocar vulnerável. Fiz tudo o contrário do que ela falou, mas esses ensinamentos me fizeram bem como pessoa.

O (ator) Julio Adrião me ensinou outra coisa que nunca mais esqueci: "Quando você estiver de um lado do palco, olha para o outro. Assim, consegue contemplar quem te vê aqui e quem te vê lá".

A consciência do seu poder em cena caminhou junto com o aumento da percepção sobre o seu lugar no mundo como pessoa preta? Da afinidade com as questões raciais e a consciência política que a faculdade de Letras te deu? Já vi você dizer que a universidade te tirou a ignorância de ser contra as cotas...

Meu letramento racial começa com Candeia, que me foi apresentado na infância e eu não dei importância. Também veio de dentro para fora: comecei a me achar bonita como mulher, isso lá pelos 33 anos. Comecei a cantar com 30. Gente do movimento negro reclamava que o Semente era branco. Eu não entendia porque ficavam indignados porque eram brancos tocando samba. Tive um olhar ignorante para essas pessoas, não houve um encontro, uma conversa. Durante muito tempo, o movimento negro não me considerava negra. Em alguns lugares, até hoje não consideram.

Como assim?

Fui chamada para participar do prêmio de uma revista preta. Concorria como melhor cantora. Fui a São Paulo, aluguei roupa, cheguei de limosine. Na hora de sentar, não havia lugar para mim. Seu Jorge, que ia cantar, ficou puto, fez o maior escândalo. E entendi que só me arrumaram um lugar porque ele ameaçou cancelar a participação

Sabe onde me colocaram? Numa cadeira ao lado do técnico de som. Sempre tinha sido invisível para essa revista. Quando me indicaram, achei que a capa da invisibilidade tinha caído. Só que não. Comecei a achar que era implicância por eu cantar com grupo branco.

Fui estudar, ler. A faculdade e a política do movimento estudantil me fizeram entender que muita gente que estava naqueles anos 2000 no Semente anteviu as perdas que a gente teve.

Quando você fecha os olhos, que memórias surgem fortes daquela temporada antológica no Semente?

Lembro do Seu Antonio, que vendia bebidas na porta. Era apaixonado por mim e eu por ele. Me defendia. Também lembro da Regina, que levava uma bandeira velha do Fluminense e prendia no ventilador de teto. Os dois já morreram.

Uma vez, levei o Élton Medeiros ao Semente. Aquela caixa de som que era a mesma para o retorno dos músicos e para o som do público... Ele sentou, ouviu duas músicas e disse: "Mas esse som é péssimo". E foi embora (risos). Nem sei porque levei...

Também fico fragmentada quando penso naquela época. Foi uma coisa muito do nada. Lembro o dia em que cheguei para o Bernardo (Dantas, músico) e falei: "Vamos fazer um show cantando Candeia".

Foi algo que "recebeu", sopraram no seu ouvido...

É. Porque samba é isso: ancestralidade, é alguém falando no seu ouvido o tempo todo. Por isso, às vezes tem gente que quer ser sambista e não rola. O samba até acontece em qualquer situação. É que nem futebol: se a gente pegar uma pedra, colocar dois chinelos, vamos jogar. Se a gente batucar nessa cadeira ou bater na palma da mão, vai ter samba.

Fui numa roda outro dia e o cara meteu um Lulu Santos. Depois, Legião Urbana. Super gosto, mas era uma roda de samba, gente. Tem que ter respeito, pedir licença, saber que aquilo está acontecendo porque já aconteceu muita coisa antes. Primeiro, fiquei com raiva, depois, abismada. No final, pensei que Nelson Sargento estava certo: "Mudaram toda a sua estrutura/ te impuseram outra cultura e você nem percebeu" (cita trecho do samba "Agoniza, mas não morre").

Lembro do meu primeiro encontro com Jamelão. Foi antes de eu começar a cantar. Em 1998, a Mangueira apresentou o enredo sobre o Chico Buarque e fui no barracão ver o Chico, que chegou com o Chiquinho (Brown, neto do compositor) pequeno no colo. Aquele bando de fotógrafos... De repente, passa o Jamelão com aquele bando de elásticos na mão. Ninguém notou que ele chegou. Pensei: "Poxa, imagina a cabeça dele, grande nome da Mangueira... Vou lá pedir um autógrafo". No que ele vira e fala: "Dá um tempo, minha filha, acabei de chegar, vai encher outro". Tomei o maior passa fora (risos). Ele era conhecido por isso, né?

Depois, fiz um show com ele e Alaíde Costa cantando Ary Barroso no Teatro da UFF. A maestrina foi muito cruel com as cantoras. Não quis reescrever arranjos, queria nos obrigar a cantar no tom das partituras que tinha. Falei que não ia cantar. Depois, soube que ela só reescreveu os meus arranjos. As outras cantoras tiveram que cantar no tom dela. Fiquei com ranço dessa mulher. E o Jamelão me vingou. Ele estava lá sentado com os tais elásticos da mão e ela disse: "Não vai entrar no palco com esses elásticos, né? O senhor está sempre assim com eles na mão?". Ele: "Quando não estão aqui, estão no saco". Tive vontade de dar um beijo na boca dele (risos).

Na hora do ensaio com a orquestra, ele sentou do meu lado e começou a roncar. Tipo dois segundos depois. Eu tinha que passar por ele, pular sobre as pernas. E pensava: "Caramba, ele vai me dar uma porrada". Fiquei uns cinco minutos ensaiando como ia levantar pulá-lo. Quando passei a primeira perna, ele solta: "Teresa da praia não é de ninguém" (ela cantarola a música de Tom Jobim e Billy Blanco). Ou seja, acompanhou todo o meu medo, estava só esperando.

Neste dia, molhei meu figurino todo de tanto chorar com ele cantando "Folha morta". Depois do show, ele ficou procurando um pedaço de pau para bater no técnico de som que tinha tirado todo o grave da voz dele (risos).

Conversar com você é que nem com sambista antigo: uma coleção de histórias...

E o dia em que a Norah Jones foi ao Semente? Falaram: "Vai chegar uma grande diva do jazz americano". E eu: Cadê a negona?". Fiquei esperando uma preta. Falei: "Pô, reservou mesa e não veio". Quando ela foi embora, disseram: "Pô, Teresa, nem foi falar com a mulher". Quando me disseram que era aquela branca baixinha, cabeçuda, eu disse: "Tá de sacanagem". Pô, um metro e meio a garota.

Dissociar samba de política é algo impossível para você, como ensinaram Zé Keti e Leci Brandão?

Como gostar de Silas de Oliveira e não ligar para política? Olha as letras do Zé Keti, a importância dele no Teatro Opinião. Como a pessoa pode ouvir um negócio desses e falar: "Você está misturando política com samba?". Sai da minha frente, não admito.

Acha que aquele ditado "política, religião e futebol não se discute" provocou um estrago no país?

Muito! Basta olhar para o Congresso...

Você costuma ir muito além da política partidária na sua atuação como artista. Já vi você dar bronca no palco, dizendo: "Cadê os homens pretos com as mulheres pretas?", reclamando que muitos estavam com brancas...

Se for namorado, tudo bem, mas paquera na hora é foda. Essa é uma questão que me incomoda desde a infância. Os primeiros homens por quem me apaixonei eram pretos e nenhum deles me quis. Casei a primeira vez com um homem branco. Depois, morei de novo com outro. Tive minha filha com outro homem branco. Cansei.

Cansou dos brancos ou de não ser desejada pelos pretos?

Dos dois. Cansei de ver mulher preta belíssima, maravilhosa, sozinha. Fico olhando umas que levaram no mínimo 40 minutos para sair de casa. O cabelo, a pele, olha a mulher sambando, olha como é inteligente falando. Como essa mulher está sozinha? E tá lá um homem preto no pé de uma mulher feia que só é branca. Dá raiva. E quanto mais retinto, parece que mais branca, ruiva, loura é a mulher. Às vezes, o cara até tem um filho com uma mulher preta, mas que a gente não sabe nem quem é.

A sambista Giselle Sorriso diz que os sambas da Zona Sul, Lapa e arredores embranqueceram e elitizaram.

Acho que o samba está mais preto por quem faz. Essa ideia aí é na plateia, tipo Pedra do Sal. O samba começou nas mãos negras, salve algumas exceções. Não podemos esquecer de Noel, Alcides Histórico, Alberto Lonato, uma porrada de branco que fez samba bom.

O que me incomoda, quando a gente fala que a branquitude está invadindo, não é sobre a cor da pele, mas é gente que vai no samba porque está na moda. Que chega na beira da roda sem saber cantar um samba, fica conversando ou no celular. Isso faz muito mal para o samba. Temos uma roda como o Terreiro de Mangueira que nem é preta, tem muito branco, e sabem muito. Para mim, as melhores rodas do Rio são Terreiro de Mangueira e Terreiro de Criolo.

A cantora Teresa Cristina — Foto: Divulgação
A cantora Teresa Cristina — Foto: Divulgação

Na sua roda de samba Pagode Preta só tem mulher tocando. É um movimento disruptivo no sentido de que mexe com o imaginário popular. Porque quando se pensa em pagode, a imagem cristalizada é a grupos masculinos, de homens tocando. Se a gente pensar que o samba surgiu das mãos de Tia Ciata, demorou para a mulher ocupar esse lugar...

Temos que ocupar, e não tem volta! O que as mulheres precisam é de horas de voo. Show, agenda, incentivo... Aquele "P" que não é de pinto, mas de patrocínio (risos). Estou lutando para o Pagode Preta rodar o Brasil. Mas é difícil. São nove mulheres no palco.

Tem samba específico de mulher? O feminino mexe pelo menos com o repertório, né?

Não acho que tenha gênero. Mas numa roda de mulher, ninguém vai cantar "Faixa amarela" ou "Amélia".

Você já cantou?

Já cantei muito. Sabe o que já cantei no Semente? "Se essa mulher fosse minha/ eu tirava do samba jajá/ Dava uma surra nela que ela gritava chega". Como é um samba de roda, pegava fogo.

Teve uma ficha que caiu e depois provocou uma avalanche em mim. Foi na casa da Memélia (Maria Amélia, mãe do Chico Buarque). A gente fazia muito samba lá. Um dia, cantando música de carnaval, puxamos "o teu cabelo não nega, mulata" (cantarola). E ela: "Essa música não, é racista". Fiquei com vergonha de ter sido chamada atenção por uma mulher que admirava tanto. Ela tinha razão.

E aí puxou o fio para você problematizar várias músicas.

Não dá mais para cantar várias delas. Mas, aí, vamos entender: os caras viraram protagonistas de um movimento criado por uma mulher, todos geniais. E qual a razão de se fazer um samba? Fez porque está apaixonado? Pode até ser... Mas o samba que vai fazer sucesso não é da mulher que te quis. É o da que te fez sofrer, que te deu um pé na bunda. E o quão magoado esse cara está? Ele tem que falar mal dessa mulher se não aquela paixão não vai embora. Então, entendo. "Leviana/ Sinto muito, mas vai tratar da sua vida" (cantarola). Entendo que precisou chamar a mulher de leviana, ela machucou o coração dele. Mas temos que falar dos 'boy lixo'?

O protagonismo das mulheres no samba te inspira a compor sob esse prisma?

Tem muitas dicas. Como compositora, percebo que tinha um olhar masculino por admirar todos esses homens. Por que nunca quis fazer uma música para Alcione, que está cantando relacionamento abusivo desde que se entende por gente? Por que isso nunca passou pela minha cabeça? Porque tinha esse olhar machista também.

Isso mudou e, hoje, reflete nas suas composições.

Sim. Falo pouco de amor na hora de compor. Porque o amor para mim sempre foi um lugar fragmentado, estilhaçado, de vários gatilhos. Queria falar de orixá, da natureza. Mas estou sendo provocada a tentar falar dos homens. Assim como eles falam da gente.

Recentemente, você saiu em defesa das compositoras Doralyce e Silvia Duffrayer (esta última integrante do Samba Que Elas Querem), que fizeram uma versão feminista da música "Mulheres", de Toninho Gerais. Ele pediu que elas retirassem das plataformas e você postou: "Vai mandar prender todo mundo"?

É, mas a história não foi bem assim... Doralyce me marcou, me mandou mensagem, mas depois fui conversar com Toninho. Ele pode ter errado em várias coisas na vida, mas nessa história faltou respeito com o compositor. Não se pode fazer uma paródia e ignorar o autor da versão original. Música tem letra e melodia, intensão verbal. Não dá para colocar no Spotify e não mencionar o autor. Elas pediram autorização para a gravadora. Gravadora e editora não são artistas. E nem boazinhas.

Elas o acusaram de machismo...

É fácil, a gente está querendo tacar pedra em alguém. Mas não é assim. Eu não sabia da história direito, e isso é uma coisa doida de internet: as armadilhas.

Por que o amor é um lugar de dor para você?

Mulher preta, né? Infância e adolescência difíceis. Gostava de discoteca e parei de frequentar porque nenhum cara me chamava para dançar música lenta. Fui para o metal porque não tinha isso. Era vai se foder pra lá e você pra cá. Tive pouquíssimos namorados e havia essa coisa desde pequena: "Ah, o cabelo é feio, a cara é feia". Quando fiz 15 anos, engordei muito. Aí ainda era: "É gorda, é preta". Via minhas amigas com namoradinho e eu sem. A minha vida foi me dizendo: "Ninguém te quer". Então, virei CDF.

Sou uma pessoa solitária até hoje. Adoro fazer coisas sozinha. Falam da solidão da mulher negra. Não é assim comigo. Mas é foda não receber um olhar de desejo... E numa hora que seu corpo está cheio de hormônio, eu louca para dar beijo na boca. O primeiro menino que gostei era preto e nem olhava na minha cara. Na adolescência, a mesma coisa. Aí eu falei: "Bom, vou esperar qual homem vai me olhar e aí vejo se quero ou não". E nisso foi branco. E fui feliz.

O pai da sua filha, Lorena (de 14 anos) é legal?

É. É um cara com que tive um relacionamento curto. Namoramos dois meses. É francês, mora em Paraty, é um bom pai para a Lorena. A gente não se conhece direito. É uma pessoa muito diferente de mim, outra cultura. Depois que terminei o namoro, soube que estava grávida. Mas ele me deu uma filha linda. Lorena fez prova agora para o Pedro II e escreveu redação sobre racismo, falando sobre máscara social. Quando ela leu, fui chorar escondida no banheiro.

Mas deu para curar um pouco a ferida dessa lacuna no amor?

Deu. Hoje, me acho bonita. Comecei a achar admirando a beleza de outras mulheres negras. Porque quando era criança, o padrão de beleza na TV era branco. Lembro que as mulheres pretas que eu achava bonita, e acho até hoje, são Donna Summer e Diana Ross.

Referências de quem adorava música disco...

Isso. Depois que saí da disco, entrei no rock, que é um lugar branco. Eu gostava de novela, de cinema. Os filmes que tinham artistas negros eram muito violentos ou de escravidão. Não aguento mais filme de escravidão! Com preto chefe de gangue ou prestes a ser enforcado. Quero ver comédia açucarada com elenco negro.

Já fui muito a única preta do meu grupo de amigos. Hoje, quando estou num grupo que tem mais gente preta do que branca, dá um alívio. Fui para a expo Favela com Silvio Almeida, Anderson Quack, Preto Zezé. Por que isso não acontece sempre? Tem impressões que a gente precisa trocar. Se não, fica parecendo que o mundo todo é branco. Já foi. Já era.

No Dia das Crianças, você fez um post tocante sobre o privilégio de quem teve uma infância documentada...

Poxa, Maria, é um negócio que não posso mudar. Cada vez que alguém diz que tem uma foto minha na Uerj, eu com 18 anos, digo: "Cadê?". Queria me ver neném. Recém-nascida, com 2 anos. Tenho uma única foto, com 3, 4 anos. Depois que fiz esse post, a quantidade de gente que veio me procurar... A Selminha Sorriso me chamou aos prantos.

Ali eu quis dizer que não tenho pela minha condição. Meus pais não tinham como fazer isso. É claro que não é só gente preta, várias pessoas brancas não têm. Mas a maioria têm. Também não aguento mais estar falando com gente do meu perfil e pessoas vindo dizer: "Sou branca e não sinto isso". Irrita.

Você tem feito posts exaltando mulheres negras. Qual é o critério para a sua curadoria?

Fico pesquisando. Quero falar de todas as mulheres. Estou colocando as pretas primeiro porque a gente já fica no final da fila para tanta coisa... Acho importante elogiar mulher. Estamos no meio de uma onda de misoginia. Não aguento mais ver homem falando: "Mulher assim assado, que toma cerveja, eu não quero". Amigo, ninguém te quer, tu é feio. Mas esse cara está falando para uma porrada de homem. Quero instigar outras mulheres a se elogiarem. Cresci com essa coisa de Emilinha ou Marlene? Gal ou Bethânia? Ficam alimentando esse negócio de que uma cantora tem que ser rival da outra. Aí, vem o machismo e não quer nem saber: fode todo mundo.

O que o projeto "Teresinha", em que canta canções famosas na voz de Maria Bethânia, te trouxe de novo?

Me fez muito bem. Cantar o repertório da Bethânia dá uma empoderada. Sinto que mudei um pouquinho. Dentro. Na hora de cantar o verso mais alto, de respirar um pouco diferente para, na hora daquele verso, daquele rancor, daquele odizinho, a voz sair mais alta. Isso foi a Bethânia que me ensinou.

Mais recente Próxima Grammy 2024: saiba como assistir ao anúncio das indicações ao prêmio
Mais do Globo

Agenda

Cidade na Flórida, a apenas 40 quilômetros de Miami, conta com boas opções de de hospedagem e gastronomia

'Veneza Americana': Fort Lauderdale tem belas praias, jogos de Messi e tour por canais com mansões de famosos

Presidente do clube revelou que projeto da nova casa rubro-negra prevê dois setores sem cadeiras e com preços populares

Estádio do Flamengo: como é a "geral" nas arenas modernas do Brasil e mundo; veja

Nessa região, que vem enfrentando períodos de seca cada vez mais severos, cientistas identificaram recentemente a primeira zona árida do Brasil

Cactos gigantes estão sendo plantados para evitar desertificação da Caatinga; entenda

O jogo entre Alemanha x Dinamarca acontecerá neste sábado (29), às 16h (de Brasília), a partida terá transmissão do Sportv e Globoplay

Alemanha x Dinamarca: Saiba onde assistir, horário e prováveis escalações do jogo da Eurocopa 2024

Ao contrário dos demais companheiros, camisa 7 esteve bem desde o início do jogo e comandou goleada

Paraguai x Brasil: Em melhor partida pelo Brasil, Vinícius Junior tira companheiros de começo lento; leia análise

Textor aguarda resposta definitiva de clube americano com otimismo

Botafogo espera fechar compra de Almada neste sábado

Atacante pediu à diretoria para ir a jogo no Maracanã e reafirmou o desejo de vestir a camisa rubro-negra

Gabigol apresentará propostas de clubes interessados ao Flamengo para definir saída imediata

Atacante André Luiz já atuava por empréstimo ao Estrela Amadora e assina até 2028

Flamengo acerta venda de joia da base para o futebol português