Leo Aversa
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Leo Aversa

Fotógrafo e colunista.

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Leo Aversa

A luta parece tão inglória como eterna. Todo dia, toda hora preciso afastar o meu filho adolescente do celular. Já tentei a democracia dos argumentos racionais, já tentei a ditadura das ordens ameaçadoras. Nada funcionou. A situação só foi para a frente quando instalei um aplicativo de controle parental: após espernear muito, ele se conformou que só pode usar o seu aparelho durante o tempo que determino. Mesmo assim não resolveu de vez, quando não tem o celular nas mãos ele fica perdido e é preciso obrigá-lo a ler um livro ou ver um filme.

Não tá fácil.

Veja bem, leitor, não se trata de um caso patológico ou fora da — atual — curva. Ele pratica esportes, tem muitos amigos e vai bem na escola. Ainda assim percebo que o ritmo frenético e descerebrado dos tiktoks da vida prejudica —e muito — sua concentração. O sem-fim de vídeos curtos, que vão do nada ao lugar nenhum, viciam mais que nicotina. É o tal algoritmo do engajamento em ação. Pelo que observo é um problema comum aos seus amigos. Pelo que leio — a última coluna do Daniel Becker, por exemplo — é uma questão para muitos pais.

Mas afinal, quem ganha com essa desgraça?

Meia dúzia de bilionários. Só. Para que possam trocar de avião todo ano e tirar férias em órbita, estamos condenando uma geração inteira à indigência intelectual, a carregar o celular como uma prótese. O que não me entra na cabeça é por que 99,99% da população tem que se ferrar para que 0,01% viva num luxo pornográfico.

Alguns dirão que o problema é apenas meu, que bastaria assumir a minha responsabilidade como pai e arrancar o celular do meu filho. Sim, mas isso poderia isolá-lo dos amigos, da turma, o que é o apocalipse para um adolescente. E não, não salvaria os outros. Não é uma questão individual, como vociferam os adeptos do “cada-um-por-si”. É problema coletivo, uma epidemia, e deve ser tratada como tal.

E aí é que entra a minha queixa, por assim dizer: não é hora de um esforço coletivo, coordenado, como se fez com o cigarro? Não é o momento de pressionar os políticos para tal? Aqui no Rio, o prefeito proibiu celular na escola. Uma atitude simples e eficiente, aplaudida por todos. Dá para ir mais longe. Na Europa já há um movimento político consistente para que a população tenha mais controle sobre sua vida on-line, para que o tal algoritmo não se torne um algoz.

Sabemos que o único interesse das redes é ganhar fortunas vendendo nossas informações pessoais e que para nos prender às telas utilizam qualquer meio necessário, por mais nefasto que seja. Desde inflamar o ódio a promover uma polarização deletéria. Não há nenhuma preocupação moral: vão implodir a civilização e a democracia se isso representar mais lucro para a tal meia dúzia.

É o que queremos para nós e para os nossos filhos? Permitir que seja destruída nossa capacidade de concentração e o livre arbítrio, para virar massa de manobra de algum bilionário irresponsável? Devemos tomar esse destino como inevitável, feito uma tempestade ou um terremoto?

O problema não é só meu ou seu, leitor, é de todos. Ainda dá tempo.

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Semana passada escrevi “Partido Comunista Operário” e não “Partido da Causa Operária”, como é o correto. Peço desculpas ao PCO. O revisionismo pequeno-burguês foi involuntário.

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