Antônio Gois
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Antônio Gois

Um espaço para debater educação

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Antônio Gois

Jornalista de educação desde 1996. Autor dos livros 'O Ponto a Que Chegamos'; 'Quatro Décadas de Gestão Educacional no Brasil' e 'Líderes na Escola'.


Num intervalo de 11 dias, duas importantes pesquisas sobre analfabetismo foram divulgadas. Há três semanas, o Censo de 2022 do IBGE revelou o retrato do analfabetismo adulto. Na semana passada, foi a vez de o Inep/MEC publicar estatísticas sobre a qualidade da alfabetização de crianças. Mesmo sendo metodologias e públicos distintos, a comparação entre os dois levantamentos diz muito sobre o passado e o futuro da educação brasileira. O olhar para o retrovisor reflete a vantagem histórica do Sul e Sudeste, mas o futuro aponta para resultados mais promissores no Nordeste.

O IBGE calcula a taxa de alfabetização de adultos perguntando para toda a população acima de 15 anos se sabe ler e escrever um simples bilhete. Como o problema é concentrado nas gerações mais idosas, é um indicador que reflete muito mais o passado do que o presente das políticas educacionais. Dos 100 municípios com melhores indicadores, 85 são do Sul e 15 do Sudeste. O maior destaque é o Rio Grande do Sul, com 56 das 100 melhores cidades. Já o Inep calcula a alfabetização adequada de crianças no 2º ano do fundamental a partir de testes padronizados. O mesmo exercício nas 100 melhores cidades traz quadro bastante distinto, pois são 63 do Nordeste, 17 do Sul, 15 do Sudeste, quatro do Centro Oeste e uma do Norte. O destaque aqui é o Ceará, com 38 cidades, seguido do Piauí (16).

Olhar apenas para o topo do ranking de cidades pode gerar distorções, por serem, em geral, municípios pequenos. Mas o quadro não se altera quando comparamos médias gerais nas 24 unidades da federação onde é possível fazer a comparação em ambos os levantamentos (não há dados para DF, AC e RR na pesquisa do Inep). Na alfabetização adulta, o Ceará figura entre os cinco piores, com 14% de iletrados acima de 15 anos. Quando o foco é na qualidade do letramento infantil, porém, as redes municipais cearenses lideram, com 85% de alunos com alfabetização adequada.

Em contrapartida, São Paulo apresenta apenas 3% de iletrados adultos, sendo a terceira melhor UF nesse quesito. Mas, com apenas 52% de crianças plenamente alfabetizadas no conjunto de suas redes municipais, o estado mais rico da federação fica apenas na 15ª posição no levantamento do Inep. O Rio de Janeiro, que aparece como quarta melhor UF na alfabetização de adultos, fica apenas em 14º no levantamento de crianças plenamente alfabetizadas (52%).

No caso do Rio, os piores resultados estão em redes municipais da Baixada, como Nova Iguaçu (33%), Belford Roxo (35%), São João de Meriti (38%), Mesquita (38%), Queimados (38%) e Japeri (39%). Na capital, o percentual é de 56%. Em São Paulo, a capital puxa para baixo a média estadual, com 38% de crianças plenamente alfabetizadas na rede municipal paulistana, bem atrás, por exemplo, de Fortaleza (74%), Curitiba (70%), Goiânia (67%), Vitória (66%) ou Recife (62%). Outra rica cidade paulista também deixa a desejar: Ribeirão Preto (39%).

Pode-se ponderar que os dados do Inep são apenas das redes municipais e que, em cidades com maior proporção de habitantes na classe média, parte significativa das crianças estão na rede privada. Mesmo assim, era de se esperar que Estados e municípios mais ricos, portanto com maior possibilidade de investimento por criança, não apresentassem em sua rede pública um abismo tão grande em relação a entes federativos com orçamentos mais modestos e de maior passivo histórico educacional.

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