Renata Agostini
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Renata Agostini

Repórter especial em Brasília e colunista do GLOBO. Formada em jornalismo pela UFRJ, passou pelas redações de Folha, Estadão, CNN, Exame e Veja.

Por — Brasília

RESUMO

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GERADO EM: 26/06/2024 - 04:30

Crítica da secretária à PEC das Drogas

A secretária do Ministério da Justiça critica a PEC das Drogas, considerando-a um equívoco e uma cortina de fumaça diante da descriminalização do porte de maconha pelo STF. Ela alerta para os problemas na aplicação da lei e destaca que a criminalização não resolve o consumo de drogas no país.

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de descriminalizar o porte de maconha deveria levar o Congresso a repensar o avanço da PEC das Drogas, afirma a Secretária Nacional de Política sobre Drogas do Ministério da Justiça, Marta Machado. Enquanto ministros e o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva têm evitado se posicionar sobre o tema, a secretária é taxativa ao classificar a proposta em discussão no Legislativo como um "equívoco" e uma "medida populista".

— Engessar a política de drogas a nível constitucional é problemático, porque impede que a própria política seja atualizada ao longo do tempo — disse ao GLOBO. — A PEC paralisa o debate. Ela bloqueia a possibilidade de o próprio Legislativo se reunir e pensar outra solução mais à frente.

Horas após o Supremo formar maioria contra a criminalização do usuário, o presidente da Câmara, Arthur Lira, formalizou a decisão de instalar a comissão especial que irá analisar a PEC. Trata-se do último passo para que a proposta possa ir à votação no plenário. O colegiado terá 34 integrantes e precisará debater o tema pelo prazo regimental mínimo de dez sessões.

Para Marta Machado, os parlamentares deveriam se preocupar neste momento em analisar como sanar os problemas de aplicação da lei que foram apontados pelo STF durante o julgamento em vez de debater como colocar na Constituição a criminalização do porte de drogas.

— Em 2006, o legislador fez o movimento de dizer: "usuário não deve ter pena de prisão'’. A aplicação da lei acabou mostrando que houve aumento do encarceramento, porque os juízes, por um viés de raça e classe, têm mais facilidade de classificar como traficante uma pessoa negra, de uma classe social baixa, mesmo que usuária. Foi um efeito não esperado da legislação. Todos os votos, mesmo os que negaram provimento ao recurso, apontaram sérios problemas e injustiças na aplicação da Lei de Drogas — afirmou Machado.

Marta vê viés "populista" na proposta porque ela não mudaria o quadro atual no país. Ela lembra haver diversos estudos mostrando que a criminalização não tem o poder de barrar a escalada do consumo de drogas e ainda cria estigma no usuário, afastando-o do tratamento. De acordo com a secretária, a PEC é uma "grande cortina de fumaça" sobre o que é "realmente importante discutir na política de drogas".

— Colocar a criminalização na Constituição é algo que nenhum país tem, seria uma excepcionalidade brasileira. Nem os países mais radicais, com pena de morte para crime de droga, colocaram isso na Constituição. A proposta não nos ajuda a resolver nenhum dos grandes problemas que a gente tem hoje no Brasil— afirmou. — O álcool é uma droga lícita e um problema na sociedade. Temos drogas lícitas sendo usadas pra outros fins. Tivemos o caso recente de uma pessoa que morreu em Manaus pelo uso da cetamina, que é um produto veterinário. A PEC não nos ajuda a resolver nada disso.

Machado cita que, no caso dos cigarros eletrônicos, há debate no Congresso para a legalização.

— O mesmo Senado está fazendo o caminho oposto no caso dos chamados vapes. A Anvisa acabou de reforçar proibição, dizendo que ainda não há parâmetros seguros pra liberar a venda. E vemos justamente uma movimentação oposta, sob o argumento de que, quando legalizar, a gente vai conseguir controlar e não vender para adolescente.

Proposta pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) , a PEC das Drogas prevê que seja definido como crime o porte e a posse de todas as drogas em qualquer quantidade. Ela foi aprovada no Senado e já teve o aval da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. Para avançar, é necessário que passe pela comissão especial.

Ela foi proposta como uma resposta do Congresso ao julgamento iniciado no STF. Por maioria de votos, a corte descriminalizou nesta terça-feira o porte de maconha para consumo pessoal. A decisão da Corte significa que o uso da substância deixará de ser um crime e passará a configurar um ilícito administrativo. Os ministros ainda não definiram qual é a quantidade que será usada para que se diferencie traficante de usuário. Isso deve ocorrer nesta quarta-feira.

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