A Procuradoria-Geral da República (PGR) avalia se há elementos para entrar com um recurso contra a decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli, que anulou as provas obtidas no acordo de leniência da Odebrecht e declarou que a condenação de Lula foi um “dos maiores erros judiciários da história do país”.
Segundo a equipe da coluna apurou, a PGR está buscando nas 135 páginas da decisão de Toffoli os elementos novos em relação a decisões já tomadas anteriormente pelo ministro Ricardo Lewandowski nesse mesmo caso.
O processo em que Toffoli anulou as provas da Odebrecht é baseado,em parte, nas mensagens entre o então juiz federal Sergio Moro e procuradores da Lava-Jato de Curitiba, captadas pelo hacker Walter Delgatti Neto e apreendidas na Operação Spoofing, da Polícia Federal.
Por ora, o entendimento na PGR é de que um recurso teria que se basear em argumentos ou informações novas.
Isso porque o Supremo já firmou algumas posições nesse caso, quando ele estava sob a relatoria de Ricardo Lewandowski, e portanto não vale a pena questionar o que os ministros já decidiram de forma colegiada.
A decisão de Toffoli é monocrática, ou seja, foi tomada unicamente por ele. Um eventual recurso será examinado pela Segunda Turma, que costuma votar contra a operação.
Em fevereiro do ano passado, a mesma Segunda Turma já manteve uma decisão de Lewandowski que impediu a utilização das provas obtidas no acordo de leniência da Odebrecht contra o presidente da República em uma ação penal referente à sede do Instituto Lula.
À época, por 3 a 2, os ministros entenderam que, como Moro foi declarado parcial pelo STF na ação do triplex do Guarujá, isso também contaminava a sua atuação no processo do Instituto Lula, já que ele aceitou o acordo de leniência da Odebrecht como prova contra o petista naquele processo.
Agora, Toffoli tornou nulas todas e quaisquer provas obtidas nos sistemas da Odebrecht “em qualquer âmbito ou grau de jurisdição” e para todos os investigados com base em informações colhidas no acordo de leniência firmado pela empreiteira.
Outro trecho que chamou a atenção da PGR foi o que determinou ao Conselho Nacional do Ministério Público e ao Conselho Nacional de Justiça a identificação dos agentes públicos que atuaram na confecção do acordo de leniência firmado entre a Odebrecht e o MPF, “sem observância dos procedimentos formais junto ao DRCI”.
O DRCI é o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI) do Ministério da Justiça.
Nas mensagens do Telegram captadas pelo hacker, procuradores da República mencionam contatos com integrantes do FBI e da Embaixada dos Estados Unidos sobre as investigações.
Num dos diálogos citados por Toffoli, um deles diz que "o canal com o FBI é com certeza muito mais direto do que o canal da embaixada. O FBI tb [também] já tem conhecimento total das investigações, enquanto a embaixada não teria. De minha parte acho útil manter os dois canais".
Essas comunicações informais têm sido usadas pela defesa de Lula para tentar minar o acordo de leniência sob o argumento de que foram ilegais.
Conforme informou a coluna, Toffoli omitiu na sua decisão a conclusão de uma sindicância do MPF que não encontrou irregularidades na conduta de procuradores da Lava-Jato envolvidos na negociação.
Lava-jato: relembre alguns dos mais relevantes alvos da operação
![O doleiro Alberto Youssef: "marco zero" das investigações, a partir de um inquérito do ex-delegado da Polícia Federal Gerson Machado, de 2008, sobre lavagem de dinheiro — Foto: Jorge William / Agência O Globo - 27/10/2015](https://cdn.statically.io/img/s2-oglobo.glbimg.com/VXSG80Ituc50B0FEmcTPy5aTvSE=/0x0:1265x760/648x248/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2022/m/y/FqnW9XTguVKSbnQpFMnA/54227741-bsbbrasiliabrasil27-10-2015pacpi-dos-fundos-de-pensaodepoimento-do-doleir.jpg)
![O doleiro Alberto Youssef: "marco zero" das investigações, a partir de um inquérito do ex-delegado da Polícia Federal Gerson Machado, de 2008, sobre lavagem de dinheiro — Foto: Jorge William / Agência O Globo - 27/10/2015](https://cdn.statically.io/img/s2-oglobo.glbimg.com/v8i7-KfuThExh1EKJX2_UQk3Gpk=/1265x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2022/m/y/FqnW9XTguVKSbnQpFMnA/54227741-bsbbrasiliabrasil27-10-2015pacpi-dos-fundos-de-pensaodepoimento-do-doleir.jpg)
O doleiro Alberto Youssef: "marco zero" das investigações, a partir de um inquérito do ex-delegado da Polícia Federal Gerson Machado, de 2008, sobre lavagem de dinheiro — Foto: Jorge William / Agência O Globo - 27/10/2015
![Paulo Roberto Costa, ex-diretor de abastecimento da Petrobras. Ligações com Youssef deu origem à investigação sobre a estatal — Foto: Jorge William / Agência O Globo - 25/08/2015](https://cdn.statically.io/img/s2-oglobo.glbimg.com/llepfCeLUdjJ66tq0oH_yIQUkLA=/0x0:1265x760/323x182/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2022/C/J/XJA6r9RZqeVl3EIPB2Ng/7601335-brasilbrasiliabsbpa25-08-2015pacpi-da-petrobrasa-cpi-ouve-os-delatores.jpg)
![Paulo Roberto Costa, ex-diretor de abastecimento da Petrobras. Ligações com Youssef deu origem à investigação sobre a estatal — Foto: Jorge William / Agência O Globo - 25/08/2015](https://cdn.statically.io/img/s2-oglobo.glbimg.com/1Wn5wapN2IGPsv8oWUvTKt_Sets=/1265x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2022/C/J/XJA6r9RZqeVl3EIPB2Ng/7601335-brasilbrasiliabsbpa25-08-2015pacpi-da-petrobrasa-cpi-ouve-os-delatores.jpg)
Paulo Roberto Costa, ex-diretor de abastecimento da Petrobras. Ligações com Youssef deu origem à investigação sobre a estatal — Foto: Jorge William / Agência O Globo - 25/08/2015
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![O ex-senador Delcídio do Amaral. Foi preso pela Polícia Federal em novembro de 2015, por tentar obstruir as investigações tentado impedir a delação premiada de Nestor Cerveró, ex-executivo da Petrobras — Foto: Ailton de Freitas / Agência O Globo](https://cdn.statically.io/img/s2-oglobo.glbimg.com/epCk9lYqmojdI1xrgvteinGcaF8=/0x0:1265x760/323x182/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2022/M/5/AKFp6mTkmDGRXcCguAcw/59869753-opiniaodos-leitoresdelcidio.jpg)
![O ex-senador Delcídio do Amaral. Foi preso pela Polícia Federal em novembro de 2015, por tentar obstruir as investigações tentado impedir a delação premiada de Nestor Cerveró, ex-executivo da Petrobras — Foto: Ailton de Freitas / Agência O Globo](https://cdn.statically.io/img/s2-oglobo.glbimg.com/22W4r0fGDJisruRD9UOWwuEA7aE=/1265x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2022/M/5/AKFp6mTkmDGRXcCguAcw/59869753-opiniaodos-leitoresdelcidio.jpg)
O ex-senador Delcídio do Amaral. Foi preso pela Polícia Federal em novembro de 2015, por tentar obstruir as investigações tentado impedir a delação premiada de Nestor Cerveró, ex-executivo da Petrobras — Foto: Ailton de Freitas / Agência O Globo
![Nestor Cerveró, ex-diretor da Petrobras. Preso em 2015, na oitava fase da operação, delatou outros envolvidos. Foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro — Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo - 01/08/2016](https://cdn.statically.io/img/s2-oglobo.glbimg.com/Um6LzQmaA60VxXI1LDjFGcC_zls=/1265x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2022/O/m/PwaPvWTWKXZHoeYvDXgA/60230332-pa-rio-de-janeiro-rj-01-08-2016-operacao-lava-jato-audiencia-na-justica-federal-do-rio-de-j.jpg)
Nestor Cerveró, ex-diretor da Petrobras. Preso em 2015, na oitava fase da operação, delatou outros envolvidos. Foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro — Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo - 01/08/2016
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![Otávio Marques de Azevedo e Marcelo Odebrecht, presidentes, respectivamente, da Andrade Gutierrez e Odebrecht, presos em 2015. Lava-jato atingiu grandes empreiteiras em junho daquele ano — Foto: Geraldo Bubniak - 20/06/2015](https://cdn.statically.io/img/s2-oglobo.glbimg.com/3X8FHGhRTqSVtH76Dyr8JH4p4Kc=/1265x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2022/r/y/BaTydtQDAKyuMNsumiew/8010392-br-curitibapr-20-06-2015a-14-fase-da-operacao-lava-jato-foi-deflagrada-nesta-sexta-feira.jpg)
Otávio Marques de Azevedo e Marcelo Odebrecht, presidentes, respectivamente, da Andrade Gutierrez e Odebrecht, presos em 2015. Lava-jato atingiu grandes empreiteiras em junho daquele ano — Foto: Geraldo Bubniak - 20/06/2015
![O ex-governador Sérgio Cabral. Preso em 17 de novembro de 2016, durante a operação Calicute, da Polícia Federal. Acusado de liderar o desvio de R$ 224 milhões de reais em valores ilícitos — Foto: Guito Moreto / Agência O Globo - 17/11/2016](https://cdn.statically.io/img/s2-oglobo.glbimg.com/g-EmJvJtXaUkARXethkjoomsv6E=/1265x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2022/b/j/wJ4A4hQ6qQFzzFBiibJA/sergio-cabral-lava-jato.jpg)
O ex-governador Sérgio Cabral. Preso em 17 de novembro de 2016, durante a operação Calicute, da Polícia Federal. Acusado de liderar o desvio de R$ 224 milhões de reais em valores ilícitos — Foto: Guito Moreto / Agência O Globo - 17/11/2016
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![No exercício do cargo, o então governador Luiz Fernando Pezão foi preso no Palácio Laranjeiras, acusado de corrupção em um dos desdobramentos da Lava-jato — Foto: Fabiano Rocha / Agência O Globo - 29/11/2018](https://cdn.statically.io/img/s2-oglobo.glbimg.com/Ooc-DMynX4T0c-iybGrcWL33ETM=/1265x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2022/j/i/HBXk5hSpAsq872uWSENg/pezao-lava-jato.jpg)
No exercício do cargo, o então governador Luiz Fernando Pezão foi preso no Palácio Laranjeiras, acusado de corrupção em um dos desdobramentos da Lava-jato — Foto: Fabiano Rocha / Agência O Globo - 29/11/2018
![Eike Batista, dono do grupo EBX. Preso em janeiro de 2017, na Operação Eficiência, sobre esquema de desvio e lavagem de dinheiro de contratos do governo do Estado do Rio — Foto: Domingos Peixoto / Agência O Globo - 30/01/2017](https://cdn.statically.io/img/s2-oglobo.glbimg.com/q-_yPpukgPWPwcSf739vFBgo5Os=/1265x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2022/U/e/R9HMCXTXClT4AH8TDBIg/eike-batista-lava-jato.jpg)
Eike Batista, dono do grupo EBX. Preso em janeiro de 2017, na Operação Eficiência, sobre esquema de desvio e lavagem de dinheiro de contratos do governo do Estado do Rio — Foto: Domingos Peixoto / Agência O Globo - 30/01/2017
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A apuração foi aberta na corregedoria-geral do MPF, vinculada à PGR comandada por Aras e por determinação de Lewandowski.
Apesar da conclusão de sua própria equipe, porém, Aras divulgou pela rede social X uma nota em que apoia indiretamente a decisão de Toffoli.
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Dizendo-se vítima de um "forte corporativismo apoiado pelas fake news da imprensa desviada", Aras reclamou de ter sido "acusado de destruir a Lava-Jato”. “Apenas institucionalizei e despersonalizei o Ministério Público. Hoje, a sociedade enxerga seu verdadeiro legado maldito, seu ‘modus operandi”, afirmou o procurador-geral da República em seu perfil.
A análise de um possível recurso da PGR está sob o comando do subprocurador Humberto Jacques de Medeiros, designado por Aras para atuar nos processos criminais em tramitação no STF.
O mandato de Aras, porém, termina no próximo dia 26 e por enquanto Lula não indicou o sucessor. Há, portanto, uma possibilidade de a PGR ser comandada interinamente pela subprocuradora Elizeta Ramos, que arquivou a sindicância contra a Lava Jato e poderia ser mais favorável a um recurso contra a decisão de Toffoli.
Enquanto a PGR de Aras ainda decide o que fazer, a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) e a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) já avisaram que vão recorrer contra a decisão do ministro.
A Segunda Turma, onde os recursos serão avaliados, é presidida por Toffoli e composta por Gilmar Mendes (um dos maiores críticos da Lava-Jato no Supremo), Kassio Nunes Marques, André Mendonça e pelo relator dos processos da operação, Edson Fachin.
Se antes Fachin poderia contar com Cármen Lúcia (que migrou para a Primeira Turma) e Celso de Mello (que se aposentou) para formar maioria a favor da Lava-Jato, hoje o cenário é hostil à operação.
Conforme informou a coluna, a ação da Vaza-Jato caiu nas mãos de Toffoli após uma manobra interna de cujos bastidores até hoje pouco se sabe.
Em tese, o caso seria herdado pelo sucessor de Lewandowski, Cristiano Zanin. Se isso acontecesse, ele estaria automaticamente impedido de relatar e votar no caso, por ter sido justamente o autor da ação enquanto era advogado de Lula.
O processo, portanto, teria que ser redistribuído por sorteio.
Até que um novo relator assumisse, o processo ficaria com Edson Fachin, que foi relator da Lava Jato e havia sido designado como uma espécie de "relator substituto" pela presidente do STF, Rosa Weber.
Mas Fachin abriu mão de assumir o posto e passou o processo diretamente para Toffoli, que havia acabado de se transferir da Primeira Turma para a Segunda, assumindo a vaga de Lewandowski.
Com esse movimento, Zanin já foi direto para Primeira Turma, pela qual não passam os casos da Lava Jato. Ou seja: numa só tacada, Zanin se livrou dos impedimentos e foi substituído por um ministro alinhado às suas posições.