Por Memória Globo

Memória Globo

Ilze Lia Scamparini gostava de escrever e pintar desde pequena e sempre foi tímida. Entre jornalista e artista plástica, ficou com a primeira profissão. Começou na imprensa escrita e era repórter na TV Campinas quando, em 1983, começou a cobrir férias de repórteres do JN, o que a levou a se mudou para o Rio de Janeiro no ano seguinte. Depois de um período na cobertura política de Brasília, entrou para o time do 'Globo Repórter', em 1986, e iniciou uma série de viagens que a levaria a conhecer o mundo e a descobrir suas raízes. Neta de imigrantes italianos, fez algumas incursões no país que a receberia anos depois. Partiu dela a proposta de ser a primeira correspondente na Itália, usando como argumento a numerosa colônia italiana em São Paulo e as afinidades entre os dois países.  

Em Roma, a jornalista, de formação católica, tornou-se uma vaticanista, uma jornalista credenciada permanentemente pelo Vaticano. O plano inicial era ficar um ou dois anos para cobrir o Jubileu do Ano 2000 e um pouco da vida do Papa João Paulo Segundo.

“Quando eu era criança e queria contar a história dos meus avós italianos, me deparei com a palavra ‘imigrante’. Abriu-se um mundo de grandes possibilidades e tristes revelações. E este assunto entraria para sempre na minha vida.”

Depoimento - Ilze Scamparini: Eleição do Papa Francisco (2013)

Depoimento - Ilze Scamparini: Eleição do Papa Francisco (2013)

FORMAÇÃO CATÓLICA

A formação católica talvez tenha ajudado Ilze Scamparini a tornar-se especialista em coberturas, polêmicas ou não, do Vaticano. Assim que chegou à Itália, foi recebida por Pontífices, como João Paulo II, e demais religiosos que muitas vezes revelam assuntos sensíveis à crença cristã.

“Como Sua Santidade pretende enfrentar a questão do lobby gay dentro do Vaticano?”. A pergunta de Ilze Scamparini ao Papa Francisco durante um voo entre Brasil e Itália, sobre uma rede informal de sacerdotes que se apoiam mutuamente em completo sigilo (sem, necessariamente, ter uma conotação sexual), gerou uma resposta polêmica, que estampou as manchetes dos principais jornais do mundo, no dia 29 de julho de 2013. Avesso a entrevistas, o Papa Francisco agradeceu à correspondente da Globo em Roma pela pergunta. “Além de condenar qualquer tipo de lobby", conta Ilze, "ele teve a oportunidade de passar uma mensagem de humanidade aos gays do mundo inteiro: 'quem sou eu pra julgar?'”.

Eu me arrisquei, é verdade, mas queria fazer uma pergunta que entrasse naquelas questões profundas e silenciosas

Scamparini avalia que este foi um dos momentos mais importantes de sua trajetória profissional, que começou no interior de São Paulo.

Início da carreira

Ilze Lia Scamparini nasceu em 26 de dezembro de 1958. Gostava de escrever e pintar desde pequena, e sempre foi tímida. Neta de imigrantes italianos, se acostumou com o dialeto falado pelos avós. Segundo ela, sua conexão com a Itália envolvia mitos bons e ruins, já que a sombra do Velho Mundo provoca alegrias e dores.

Filha de Irineu Scamparini e Paulina Storolli Scamparini, foi criada em meio as luzes de gás neon, com os luminosos que o pai fazia para o comércio do interior de Sao Paulo, para a iluminação do salão do cinema da cidade, o Cine Araruna e da fonte da praça principal. Ele também vendia tintas, o que deu a ela a inclinação para as artes. Ilze estudou no Colégio Salesiano Nossa Senhora Auxiliadora e foi uma das melhores alunas de redação, além de uma devoradora de livros: estava sempre presente na biblioteca pública da cidade. “Queria ser jornalista ou artista plástica”, revela. O caminho a levou para o lado das letras. Prestou vestibular e ingressou no curso de Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica de Campinas.

O primeiro jornal para o qual trabalhou, no primeiro ano de faculdade, foi o Diário do Povo, de Campinas, como repórter estagiária. Ficou lá um ano e chegou a fazer páginas inteiras com escritores. Antes integrou o grupo de jovens do cartunista Henfil, colaborando com os folhetos da Oboré, transcrevendo entrevistas dos trabalhadores do ABC paulista, no período em que surgiram o líder sindical e atual presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, e o Partido dos Trabalhadores.

TV MULHER E ROCK IN RIO

Em 1981, a jornalista fez um teste para repórter do TV Mulher, na primeira formação do programa, que abria vaga em Campinas. Ilze gostava mais da mídia impressa, mas decidiu fazer os testes de câmera. Permaneceu no TV Mulher por um ano, recebeu treinamento com Sumika Yamasaki, passou pelo programa em São Paulo até migrar para o jornalismo da TV Campinas e participar de coberturas locais. Uma delas foi a reunião da CNBB em Itaici, em fevereiro de 1982, quando conheceu cardeais míticos da igreja católica brasileira. A reportagem ganhou espaço no 'Jornal Nacional'. “Estávamos saindo do regime militar e essa reunião foi um dos primeiros encontros importantes da Igreja depois da Anistia. A passagem pela TV Campinas foi boa porque conheci pessoas como o Heraldo Pereira, que me ajudaram a entender melhor o veiculo”.

Reportagem de Ilze Scamparini sobre o comportamento do público no Rock in Rio I. Na sequência, Glória Maria entrevista ao vivo o produtor executivo do evento, Luiz Oscar Niemeyer, Fantástico, 20/01/1985.

Reportagem de Ilze Scamparini sobre o comportamento do público no Rock in Rio I. Na sequência, Glória Maria entrevista ao vivo o produtor executivo do evento, Luiz Oscar Niemeyer, Fantástico, 20/01/1985.

Em 1983 e 1984, Ilze Scamparini começou a cobrir férias de repórteres do JN, e se mudou para o Rio de Janeiro. “Me lembro ainda do sorriso da Glória Maria e da Leila Cordeiro, que me receberam muito bem.” Fez matérias para os telejornais locais, como a cobertura de uma enchente de verão. Menina do interior e acostumada com cidades mais organizadas, ficou espantada com tanta água. Diante da dificuldade de se locomover de carro, o trânsito estava parado, ela decidiu seguir a pé, com a câmera ligada. “Saí andando no meio dos carros, falando e narrando a matéria no meio da enchente. Com os sapatos e as pernas molhados, fui andando, entrevistando as pessoas da janela, dos carros, e botaram tudo isso no ar”.

Depois de contratada, no Rio de Janeiro, cobriu um grande incêndio no Pico das Agulhas Negras. Todos os dias, ia de helicóptero e sobrevoava as chamas. Uma experiência “apavorante, claro, mas também estimulante porque a consciência ecológica começava a se formar no Brasil ”.

Em 1985, participou da cobertura do Rock in Rio I. Com óculos de armação de plástico, glitter no cabelo e muitos bottons, ela narrou o comportamento das pessoas na platéia do show e chamou atenção dos telespectadores no 'Fantástico' do dia 20 de janeiro. Scamparini conta que a expectativa para trabalhar no festival era alta.

As pessoas da minha geração tinham vontade de viver algo semelhante. A gente mergulhou naquele Rock in Rio, para tirar essa diferença que nós nunca tínhamos vivido um festival daquela maneira. Isso 16 anos depois do Woodstock. Conhecer o Nelson Motta naquela cobertura foi um upgrade

Ainda naquele ano, Ilze se mudou para Brasília, onde participaria das coberturas de agonia e morte do presidente eleito Tancredo Neves (1985), do lançamento do Plano Cruzado (1986), da Assembléia Constituinte (1987), e da reabertura do Caso Baumgarten (assassinado em 1985).

“Brasília era belíssima, mas muito difícil na época, onde praticamente viviam só três categorias profissionais: políticos, funcionários públicos e jornalistas. Hoje é uma cidade mais parecida com as outras capitais, que tem de tudo. Cheguei lá para integrar o segundo time de repórteres para cobrir a doença de Tancredo. Todas as esperanças de democracia, de um processo rápido de abertura, eram concentradas em Tancredo Neves. As imagens do caixão subindo a rampa do Palácio do Planalto, do hino nacional cantado pela Fafá de Belém, inesquecíveis para os brasileiros, davam aquela sensação de que tínhamos nascido pra sofrer. Depois começou a Nova República e essa sensação foi se modificando. Tentei fazer historias políticas que saíssem dos gabinetes e mostrassem o serrado do Planalto Central. E assim fui crescendo, convivendo com grandes profissionais como o repórter Jorge Bastos Moreno e o editor Ronan Soares.”

Nesta fase, sua primeira matéria internacional foi em Buenos Aires, sobre o plano Austral do governo argentino, que aposentou uma das moedas mais desvalorizadas do mundo.

VIAGENS PELO GLOBO REPÓRTER

Em 1986, Ilze Scamparini entrou para o time do Globo Repórter, onde iniciou uma série de viagens que a levaria a conhecer o mundo e a descobrir suas raízes. A jornalista fala com carinho daquele período em que passou inúmeras madrugadas na ilha de edição, “com diretores entusiasmados como Teresa Cavalleiro e Alexandre Alencar. E editores de imagem como Gisele Machado e Susy Altman.” Para Ilze, “foi fundamental ter participado de todas as fases das suas grandes reportagens”.

A primeira parada foi Guadalajara, para captar curiosidades sobre a cultura mexicana, em ano de Copa do Mundo. Após o desastre nuclear de Chernobyl, naquele ano, ela fez uma reportagem sobre a energia atômica no Brasil e os perigos deste tipo de usina. A ideia do programa “muito sofrido” dirigido por Ingo Ostrovsky era abordar o esquema falho de segurança para o caso de acidentes em Angra I. Ilze conta que, como em toda reportagem, se debruçou sobre o tema e estudou muito para entender o assunto. A apuração incluiu uma visita à Alemanha, para conhecer usinas modelo. “Gravamos o programa em Angra dos Reis e uma parte na Alemanha, indo conhecer usinas – na época – consideradas modelo. O regime da ditadura no Brasil quis comprar dezenas delas. Hoje a Alemanha está desistindo da energia nuclear.”

Quando ocorreu o acidente radiológico com o Césio 137, em Goiânia, no ano seguinte, Ilze viajou ao local para acompanhar de perto o desenrolar da história. “Ver as pessoas que entraram em contato com o Césio 137 definharem e se encherem de feridas foi algo assustador. O enterro da vitimas no caixão de chumbo foi uma das imagens mais dolorosas pra mim. As obras do artista plástico Siron Franco com a terra de Goiânia passavam uma emoção fortíssima, foram feitas naqueles dias de desespero e de tanta solidariedade, e é impressionante como a arte também possui essa capacidade de contar e denunciar.”

Quinze anos depois do acidente nuclear de Chernobyl na Ucrânia, Ilze foi lá mostrar os restos da usina e a população que, contrariando todos os alertas, tinha voltado a viver ao lado da central atômica que explodiu. Ela e o cinegrafista Maurizio della Costanza ficaram poucos minutos em cada lugar, para não se exporem aos riscos de contaminação. Mas o tempo foi suficiente para fazer uma reportagem para o 'Fantástico'.

ENFIM, ITÁLIA

Nos dez anos em que fez do 'Globo Repórter' sua segunda casa, conheceu o imigrante italiano Giovanni Bruno, dono de um restaurante famoso em São Paulo. Querido na redação, Giovanni se tornou personagem de uma reportagem sobre imigrantes italianos exibida em 1987. Com a equipe, ela o levou de volta à cidade natal: Castelbuono. Ilze lembra que, com Giovanni Bruno, descobriu “que o imigrante é sempre um estrangeiro, até quando volta para o próprio país.”

Antes de tornar-se correspondente da Globo em Roma, fez outras duas imersões na Itália. A primeira durante a Copa do Mundo de 1990, quando explorou com o repórter-cinematográfico Sergio Gilz o lado cultural do país e acompanhou o último dia de gravações do filme "A viagem do capitão Tornado", do cineasta Ettore Scola. A empatia com o diretor foi imediata e a reportagem lhe rendeu um convite para se tornar assistente de Scola de seu próximo filme: "Mario Maria Mario". Dois anos depois, quando recebeu o convite para o estágio, pediu licença da Globo e encarou o desafio. Terminadas as gravações, emendou o trabalho em uma reportagem sobre a Cosa nostra, a máfia siciliana, para o Globo Repórter.

Primeiro bloco do Globo Repórter com reportagens de Ilze Scamparini, direto do México, mostrando os bastidores da concentração da seleção brasileira durante a preparação para a Copa do Mundo de 1986, Globo Repórter, 28/05/1986.

Primeiro bloco do Globo Repórter com reportagens de Ilze Scamparini, direto do México, mostrando os bastidores da concentração da seleção brasileira durante a preparação para a Copa do Mundo de 1986, Globo Repórter, 28/05/1986.

Ilze Scamparini trabalhou alguns meses no escritório de Nova York, em 1991. De lá, sugeriu cobrir com lentes noturnas a travessia de imigrantes ilegais, na fronteira entre México e EUA. Essas câmeras, com imagens esverdeadas, foram usadas nas transmissões dos bombardeios na Guerra do Golfo, mas ainda eram novidade no telejornalismo no Brasil. Com o repórter cinematográfico Paulo Zero, ela encarou o desafio de se passar por uma imigrante ilegal em busca de imagens exclusivas.

Reportagem de Ilze Scamparini sobre imigrantes ilegais que tentam atravessar a fronteira dos Estados Unidos, Globo Repórter, 03/05/1991.

Reportagem de Ilze Scamparini sobre imigrantes ilegais que tentam atravessar a fronteira dos Estados Unidos, Globo Repórter, 03/05/1991.

Outros destaques

Quando 22 pessoas foram assassinadas no bairro de Vigário Geral, em agosto de 1993, no Rio de Janeiro, Ilze Scamparini foi uma das repórteres destacadas para cobrir o massacre. Na favela, ela conversou com moradores e um traficante, para saber mais sobre a violência no dia a dia de quem vive ali. Sua reportagem captou a opinião dos moradores sobre a chacina, que era bem diferente da versão policial.

Em 1995, a jornalista passou meses indo à unidade Talavera Bruce, do complexo penitenciário de Bangu, no Rio. Durante as gravações para o 'Globo Repórter', ela descobriu histórias inéditas, que ganharam espaço no 'Jornal Nacional'. O programa sobre o cotidiano das mulheres no presídio estreou no 'Globo Repórter' em setembro daquele ano.

Primeiro bloco do Globo Repórter com reportagens de Ilze Scamparini mostra a vida das detentas na penitenciária feminina Talavares Bruce, Globo Repórter, 20/10/1995.)

Primeiro bloco do Globo Repórter com reportagens de Ilze Scamparini mostra a vida das detentas na penitenciária feminina Talavares Bruce, Globo Repórter, 20/10/1995.)

Em maio, a jornalista fez uma outra grande reportagem que exigiu imersão total. 'Clausura', que mostrou a vida reclusa de freiras e monges que abdicaram do mundo para oferecer a vida a Deus, em mosteiros espalhados pelo país. No ano seguinte, fez uma viagem inesquecível à África do Sul, onde teve que lutar por uma entrevista com Nelson Mandela. Ela conta que estava na província da Zululândia, antigo Bantustão, para acompanhar um encontro político do líder sul-africano, quando viu uma oportunidade para se aproximar dele. Cercado por seguranças armados, Mandela desceu de um carro. A produtora do programa Suzy Altman, gritou: “Brasil, Brasil”, na esperança de um contato. Ilze a seguiu. “Levantei o microfone pra que ele visse que éramos jornalistas. Mandela então fez um sinal com a mão para que eu me aproximasse. Corri com todas as minhas forças. Posso dizer que levei vários safanões”. Mas a entrevista, no fim das contas, foi um sucesso.

VIDA DE CORRESPONDENTE

Ilze aceitou um novo desafio em 1997: ser correspondente internacional. A jornalista foi destacada para colaborar para a Globo em Los Angeles, onde permaneceria até o ano seguinte. Nos EUA, fez reportagens especiais na Costa Oeste e cobriu duas cerimônias do Oscar.

De volta ao 'Globo Repórter', ficou no Brasil alguns meses, até que um furo de reportagem mudasse a sua vida novamente. Com o cinegrafista Lúcio Rodrigues, Ilze flagrou o assassinato à queima roupa de dois assaltantes na praça Nossa Senhora da Paz, Ipanema, em agosto de 1998, no Rio de Janeiro. Em pleno dia, na frente de gente que passava, de mãe que passeavam com seus filhos, um policial à paisana, informado de que os homens haviam assaltado um banco, atirou várias vezes. Toda a cena foi gravada por Lúcio. Ilze passou aquele dia entrevistando pessoas em todos os ângulos da praça e a reportagem foi ao ar no 'Jornal Nacional' com destaque. Depois do furo, e dos resultados, a jornalista e os outros repórteres do 'Globo Repórter', por orientação de Evandro Carlos de Andrade, passaram a atuar mais no JN. Ela reforçou o time do Rio; em São Paulo, foi Ernesto Paglia, e em Recife, a ajuda veio de Francisco José.

Arrivederci, Rio!

Enquanto fazia matérias para o JN, algumas ao lado do colega Tim Lopes, a jornalista elaborou uma proposta para a direção de jornalismo: queria ser a primeira correspondente na Itália, e usou como argumento a numerosa colônia italiana em São Paulo e as afinidades entre os dois países. Para isso, viajou a Roma nas férias e fez um levantamento detalhado de várias possibilidades. “Era um projeto diferente para uma grande emissora, de custo relativamente baixo, um homework station, o repórter sozinho trabalhando em casa, com um cinegrafista local. Não mais um escritório caríssimo, mas uma pequena equipe. Não foi difícil transformar um salário em Real, muito valorizado na época, em moeda estrangeira. O plano inicial era ficar um ou dois anos para cobrir o Jubileu do Ano 2000 e um pouco da vida do Papa João Paulo Segundo. Deu certo. Ilze fez uma parceria com o repórter-cinematográfico italiano Maurizio della Costanza, com quem trabalha até hoje.

Nos primeiros anos em Roma, a jornalista enfrentou dois desafios: aprender tudo o que podia sobre o Vaticano e contornar os problemas técnicos de ser correspondente em uma época analógica. Era complicado enviar matérias para a emissora. A transmissão só foi facilitada com o kit correspondente, em 2004, uma tecnologia elaborada pela Engenharia da Globo que agilizou a captação, edição e geração de imagens produzidas fora do Brasil. Foi uma das primeiras correspondentes a usar a tecnologia, fez a primeira reportagem da Globo gerada via internet, sobre um relatório de fome da FAO, para o 'Jornal Nacional'.

Reportagem de Ilze Scamparini direto do Vaticano sobre os preparativos da igreja católica para a comemoração do jubileu cristão, Jornal Nacional, 22/10/1999.

Reportagem de Ilze Scamparini direto do Vaticano sobre os preparativos da igreja católica para a comemoração do jubileu cristão, Jornal Nacional, 22/10/1999.

Em Roma, a jornalista de formação católica tornou-se uma vaticanista, uma jornalista credenciada permanentemente pelo Vaticano. Ilze ressalta que, como em todas as áreas do jornalismo, também lá é preciso manter uma rede de contatos e conversar constantemente com colegas, cardeais, bispos e outros funcionários da Igreja.

MORTE DE JOÃO PAULO II

Foi assim com a morte de João Paulo II, “um homem polêmico na primeira fase do pontificado, depois respeitado por muitos, um defensor dos direitos humanos que falava também para outras religiões”. Ela conta: “Eu estava de férias no Brasil e recebi a ligação de um amigo da RAI [da sucursal em Portugal da TV italiana] que me disse que o Papa não estava bem e ia ser internado. Voltei pra Itália e ficamos muitos dias naquele plantão de inverno, na frente do hospital Gemelli. O Papa melhorou mas na segunda internação já sabíamos que ele estava muito mal. Foi levado para o Vaticano. Roma ficou repleta de furgões com antenas de satélite, um dos maiores eventos da história do jornalismo mundial. A imprensa mundial sentiu muito a perda de João Paulo II, até porque, na sua vida como Papa, ele tentou de muitas maneiras melhorar as relações entre ela e a Igreja”.

Reportagem de Ilze Scamparini sobre os prováveis candidatos a assumirem o cargo de sumo pontífice após a morte do Papa João Paulo II, Jornal Nacional, 02/04/2005.

Reportagem de Ilze Scamparini sobre os prováveis candidatos a assumirem o cargo de sumo pontífice após a morte do Papa João Paulo II, Jornal Nacional, 02/04/2005.

Ilze lembra que quem criou as entrevistas no avião papal foi ele, modelo seguido pelos seus sucessores, mas não da mesma forma. Com a morte de João Paulo II, o conclave que elegeu Bento XVI também provocou um alvoroço. A jornalista concentrou suas reportagens sobre os possíveis papáveis, o futuro da igreja e os rituais do conclave, desde os detalhes da cerimônia até os significados mais profundos.

RENÚNCIA DE BENTO XVI

Para Scamparini, Bento XVI foi um papa “amável, gentil, de uma delicadeza grande”, mas que cometeu algumas gafes em discursos públicos. Ela teve a oportunidade de acompanhá-lo em duas viagens: à Turquia (2006) e ao Brasil (2007). Na Turquia, Ilze quebrou a perna em uma queda e trabalhou de cadeira de rodas.

Em fevereiro de 2013, a notícia da renúncia de Bento XVI pegou os vaticanistas de surpresa. Ilze, novamente, estava de férias no Brasil e precisou voltar correndo para Roma. Não sem antes preparar uma reportagem na emissora, que foi ao ar no Jornal Nacional. Naquele dia, ela lembraria que o mundo passaria a ter dois papas. Sim, porque um papa, mesmo que renuncie, nunca deixa de sê-lo: apenas se torna emérito. “Acho que duas coisas contribuíram para a renúncia. O Vatileaks, vazamento de documentos do Vaticano, que colocaram à flor da pele uma briga de poder muito grande lá dentro, principalmente no banco do Vaticano. E o fato de ele não poder mais andar de avião. A Jornada Mundial da Juventude estava ameaçada e não tem JMJ sem Papa”.

Reportagem de Ilze Scamparini sobre entrevista coletiva do Papa Francisco dentro do avião durante a volta para o Vaticano após a Jornada Mundial da Juventude na qual ele fala sobre temas polêmicos, Jornal Nacional, 29/07/2013.

Reportagem de Ilze Scamparini sobre entrevista coletiva do Papa Francisco dentro do avião durante a volta para o Vaticano após a Jornada Mundial da Juventude na qual ele fala sobre temas polêmicos, Jornal Nacional, 29/07/2013.

A eleição do Papa Francisco era considerada possível, mas não era prevista por quem acompanhava de perto a movimentação dos cardeais. Outros papáveis eram aparentemente mais fortes. No conclave anterior, Ilze Scamparini já tinha indicado Mario Bergoglio como um dos favoritos. O papa argentino logo ganhou a simpatia dos católicos do mundo inteiro. Ter tido a possibilidade de fazer a ele uma pergunta nada convencional, no voo de volta ao Brasil, foi um marco na carreira da jornalista. “O porta-voz do Vaticano, padre Federico Lombardi, tinha encerrado a entrevista, mas o Papa viu a minha mão levantada e pediu que eu perguntasse”. A resposta sobre o “lobby gay” foi considerada histórica pela imprensa mundial. E quando o avião aterrissou, todo mundo deu a notícia com grande destaque.

Na Europa, Ilze cobriu o pós-massacre de Beslam, na Federação Russa, em 2004. Participou do 'Globo Repórter' da Copa da Alemanha, em 2006, percorrendo a história de Berlim e do muro que dividiu a parte oriental da ocidental. Fez programas sobre a cultura grega e a cultura alimentar mediterrânea. Entre inúmeras reportagens realizadas na Itália, Ilze Scamparini fez uma entrevista exclusiva com o primeiro-ministro Romano Prodi, em 2007, e cobriu os escândalos sexuais envolvendo o primeiro-ministro Silvio Berlusconi (2013). Fez reportagens sobre o naufrágio do Costa Concordia (2012), que deixou 30 pessoas mortas; sobre a crise financeira da Grécia, desde 2008, e os protestos da Troika. Nos últimos anos, vem acompanhando a crise dos refugiados na Europa. Entre suas principais reportagens está a que realizou para o 'Fantástico' na costa da Líbia, a bordo do navio da SOS Mediterranée, em 2016. Com Maurizio della Costanza, ela acompanhou o resgate de refugiados do norte da África e Ásia, no Mar Mediterrâneo.

Fonte:

Depoimentos de Ilze Scamparini ao Memória Globo no dia 02/03/2015 e em 31/08/2017. ALLEN JR. John L."Decodificando o que significa dizer que o Vaticano tem um 'lobby gay'". In: REVISTA IHU ON-LINE. São Leopoldo (RS/Brasil), Instituto Humanitas Unisinos: 19 Janeiro 2016. Acessado em https://www.ihu.unisinos.br/categorias/185-noticias-2016/550927-decodificando-o-que-significa-dizer-que-o-vaticano-tem-um-lobby-gay; dia 06/01/2023
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