• Leonardo Ávila, com colaboração de Eduardo do Valle
Atualizado em
Kissing Halftone Woman Lips On Bright Background. Vector Collage With Universal Graphic Elements, Geometric Shapes, Dotted Object For Your Design (Foto: Getty Images/iStockphoto)

Amor e quarentena (Foto: Getty Images/iStockphoto)

Sexo, antes de mais nada, não deve ser lá uma grande neura no contexto desta pandemia. “O que sabemos até o momento a respeito do novo coronavírus é que provavelmente em relação à transmissão sexual ele se comporta da mesma forma que outros membros da família”, diz a Dra. Cláudia Murta de Oliveira, médica e infectologista membro da Sociedade Brasileira de Infectologia e mestre em Medicina Tropical. “Ou seja: a transmissão pelo sexo dificilmente vai acontecer.”

+ #GQemCasa: como higienizar relógios e outros gadgets
+ #GQemCasa: 16 restaurantes em São Paulo que adotaram o delivery
+ #GQemCasa: 5 animações para adultos na Netflix

Há algumas boas práticas relacionadas ao tema, claro, listadas em uma curiosa cartilha lançada pela prefeitura de Nova York e que fez barulho nas redes esta semana: é aconselhável tomar cuidado com beijos (já que o vírus trafega por vias respiratórias e pode ser transmitido pela saliva), além de ser aconselhável  limpar com frequência vibradores e outros brinquedos sexuais. Assim como saber dar um tempo em casos mais extremos: “A transmissão do coronavírus acontece a partir de 14 dias depois de apresentados os primeiros sintomas”, diz a Dra. Cláudia, “então o tempo para liberar o beijo e um contato mais intenso é este”, aconselha.

Mas além dos conselhos de especialistas médicos ou cartilhas de órgãos oficiais, é fato que, se você curtia uma vida sexual ativa antes da quarentena, o assunto pode ser bem espinhoso do lado emocional da parada. É o que nos conta Leandro, 33, (cujo nome, como o de outros personagens desta matéria, foi alterado por questões de privacidade) que hoje mora sozinho e segue investindo em um relacionamento cultivado através do Tinder.

Para os dois, sair já era um desafio mesmo antes do vírus: “Vir aqui em casa significa que ela precisa pegar uma van, um trem, metrô e ainda tenho que buscá-la. É tipo um namoro à distância”, brinca. Não ajuda em nada que ela mora em Mogi das Cruzes, um dos primeiros focos da doença no país e ele, na região metropolitana de São Paulo, próximo da cidade que registra o maior número de casos confirmados. A decisão de adotar o distanciamento não demorou para surgir. “O que tem acontecido desde então é que eu tenho ficado trancado dentro de casa e ela tem ficado trancada dentro da casa dela”, explica.

Obviamente, a rotina sexual neste caso ganha outros contornos. “O que acontece com a gente é sexo virtual: mensagem de sexo, áudio de sexo, ligação para você falar p…., basicamente. São válvulas de escape, né. Vídeo nem tanto, mas áudio e texto bastante”, diz Leandro. “Tensão sexual existe e fica pior pela questão do isolamento. Não é só que a gente não está se vendo, é que a gente não está vendo ninguém”, explica.

Uma válvula de escape que tem sido a escolha de muita gente no momento. Segundo dados do aplicativo de relacionamentos The Inner Circle, o número de 'matches' (interesse mútuo) entre usuários ao app cresceu 99% desde o início da pandemia. O número de mensagens enviadas subiu 116%. Desde o início de março, houve também um aumento de 50% em pessoas sugerindo ligações ou chamadas de vídeo com o contatinho.

Sexo e quarentena (Foto: Getty Images)

Sexo e quarentena (Foto: Getty Images)

Casal que quarentena unido, permanece unido... ou não?

Já Pablo, 32, está numa quarentena bem diferente. “A gente estava tecnicamente namorando já fazia tempo, mas nunca tínhamos definido. Já havia acordos, já tínhamos apresentado para amigos. Quando chegou o carnaval, combinamos de ir juntos para Olinda”, lembra. “Quando a gente se encontrou bateu uma sensação de que a gente se gostava pra c….. Então, meio brincando, definimos que estávamos namorando. Isso era 27 de fevereiro. Pouco mais de dez dias depois estávamos confinados juntos. Apesar de estarmos trabalhando bastante, é bem doido e curioso podermos curtir esse muito o tempo que temos juntos e aproveitamos, claro, para transar”.

Nas trocas de mensagens, Pablo frequentemente transmite uma boa dose de otimismo (ele descreve a quarentena junto com o parceiro, por exemplo, como uma “experiência difícil, mas gostosa”). Porém, como é de praxe do momento, é difícil se divorciar completamente dos efeitos às vezes soturnos da pandemia. ““Nos últimos três dias diminuiu o [nosso ritmo sexual] pelo cansaço, pelo confinamento, as notícias ruins”, confessa.

O que Pablo enfrenta tem a ver com uma realidade complicada da quarentena entre casais: se antes os pares saiam para trabalhar, tinham suas próprias rotinas e afazeres, o tempo confinado dentro de casa obriga uma convivência completa e irrestrita. Uma questão que também assombra os solteiros: afinal, se você quer finalmente ver aquele contatinho de Tinder, tem que encarar a possibilidade de saltar do romance casual para uma pequena vida juntos. É o que acontece com Leandro, por exemplo. “Eu não me sinto preparado”, diz. “Tenho medo dela se afastar de mim puramente porque não quero dar esse salto tão grande mas não tem outra coisa que possamos fazer nessa situação”

Sexóloga e consultora para o app C-Date, Carla Cecarello vê dilemas como este acontecerem com frequência. “Muitos casais tem me falado [sobre o tempo da quarentena] em consulta”, diz. A solução que eles encontram, sugere a especialista, é estabelecer novidades: no sexo, isto significa propor novas brincadeiras na cama, de posições diferentes a novos acessórios. Na rotina, a sugestão é fincar novas tarefas juntos: fazer ginástica, cozinhar, assistir a alguns seriados abraçadinhos.“É importante que haja esse tipo de cooperação e disponibilidade”, diz Carla.

Esforços assim em tempos de uma quarentena compartilhada são o que tem ajudado Sofia, de 25 anos, a superar as dificuldades em seu relacionamento. "Antes do corona, eu e meu namorado estávamos a ponto de terminar", conta ela. Os dois tinham resolvido passar uns dias longe para refletir sobre o futuro do relacionamento e ela foi para a casa da avó. Com o aumento no número de casos - e confrontada com a realidade de que a avó pertence ao grupo de risco, Sofia decidiu retornar à casa que divide com o parceiro. "Agora a quarentena tem nos obrigado a conviver 24 horas por dia, estamos tentando nos reaproximar e ficar juntos porque o momento também é complicado, mas ocasionalmente rolam as tretas. Ainda não sei como sairemos dessa quarentena, se mais unidos ou se separados completamente".

Carla, a sexóloga, também reforça: com exceção de quadros da doença, é vida (sexual) que segue. “A medida em que a libido se manifesta, se o casal estiver bem, sem nenhum tipo de sintoma, nenhum tipo de suspeita que possa atrapalhar a dinâmica sexual deles não há problema nenhum”, conta.