Um levantamento realizado pela Embrapa sobre o perfil do sojicultor brasileiro revelou que, ao contrário do que se imagina, a maior parte dos agricultores que cultivam a oleaginosa não está em grandes áreas, mas sim em pequenas propriedades.
De acordo com o estudo, a região Sul do País concentra 83% dos produtores. São 196.921 propriedades distribuídas no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. No total foram identificados 236.245 produtores em todo o País. Destes, 22.385 estão no Centro-Oeste, 13.251 no Sudeste e 3.688 no Norte e Nordeste.
Apesar de o Centro-Oeste responder pelo maior volume (45%) da safra brasileira, que no ciclo 2023/2024 deve somar 147,3 milhões de toneladas, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), o cultivo do grão está mais pulverizado no Sul.
“No Brasil se difundiu a ideia de que a soja é uma cultura de grandes produtores. E este estudo vem mostrar um perfil bastante representativo, que estava escondido, de pequenos e médios agricultores que têm na cultura da soja boa parte da sua renda”, avalia Alexandre Nepomuceno, Chefe-geral da Embrapa Soja.
Elaborado a partir da base de dados do último Censo Agropecuário (2017), o estudo da Embrapa mostrou também que as propriedades de menor porte, de até 50 hectares, são maioria no País, respondendo por 73% do total.
“Nos surpreendemos tanto com a quantidade de pequenos produtores quanto com a representatividade da região Sul”, diz André Steffens Moraes, pesquisador da Embrapa e um dos autores do estudo, que foi divulgado hoje.
Segundo o estudo, no Rio Grande do Sul 81% das propriedades têm menos de 50 hectares, ou 77.410 propriedades. No Paraná, 79% dos estabelecimentos produtores de soja são pequenas propriedades, ou 66.848 unidades e em Santa Catarina 87% têm menos de 50 hectares, ou 14.662 propriedades.
Nas regiões Centro-Oeste e Sudeste, 3,6% das propriedades têm menos de 50 hectares. São 6.180 propriedades no Centro-Oeste e 6.159 no Sudeste. Nas regiões Norte e Nordeste, 1% das propriedades estão nessa categoria, com 232 e 181, respectivamente.
Tecnologia nas lavouras
O levantamento mostrou também que, independentemente do tamanho e da localização da propriedade, os produtores usam tecnologias de ponta. “Entre as variáveis tecnológicas adotadas em qualquer propriedade de soja no Brasil estão o manejo de solo, uso de insumos de alta qualidade, como sementes transgênicas, adubos e corretivos, assim como a utilização de maquinário e de armazéns para grãos, entre outras”, destaca Moraes.
É o caso de Cleber Veroneze Filho, que cultiva soja em Maringá (PR) onde sua família tem uma propriedade desde 1944. Veroneze, que é cooperado da Cocamar Cooperativa Agroindustrial, segue à risca as recomendações técnicas que recebe. Segundo ele, o cuidado com o solo em suas lavouras que somam 500 hectares é uma das principais preocupações.
Todo ano, assim que termina de colher a soja em fevereiro, o produtor planta o milho, que será colhido em julho. Neste momento, faz uma rotação de cultivo, reservando 25% da área onde planta um mix de sementes contendo aveia preta, aveia branca, nabo pé de pato, nabo forrageiro e centeio para correção do solo. Nos outros 75%, cultiva o milho junto com capim braquiária para garantir boa cobertura.
“Dessa forma a terra fica protegida até o próximo cultivo da soja. Com palhada bem formada é possível reciclar os nutrientes e preservar o solo principalmente em época de estiagem”, conta o agricultor.
Foi assim que Veroneze conseguiu manter a produtividade em bons patamares apesar de um longo período de estiagem registrado em Maringá. “Nessa safra colhemos 68 sacas por hectare. Em anos normais são 84 sacas por hectare”, diz. O cuidado com o solo começa após a colheita, quando é mapeada a produtividade em cada talhão da propriedade.
De posse dos mapas, o produtor faz análise e as correções necessárias com vistas a manter a nutrição para o cultivo seguinte. Veroneze usa apenas sementes certificadas, resistentes a glifosato e à lagarta e costuma realizar venda futura do grão para garantir pelo menos o custo de produção quando consegue boa relação de troca. Quando o faz, negocia no mercado futuro em torno de 30% da sua produção.
Da mesma forma, o produtor Cristian Marques Dalben, de Boa Esperança do Norte (MT) utiliza com frequência a venda futura como instrumento de comercialização da sua produção. “Este ano vendi 30% da safra por meio de contratos futuros ao valor de R$ 110 a saca. Geralmente vendo entre 50% e 60% da safra nesta modalidade, mas este ano tivemos um grande período de estiagem, e eu não sabia se conseguiria entregar mais”, conta.
Dalben, que é associado da Cooperativa Agropecuária Primavera (Coap), também analisa e corrige o solo com calcário e gesso a partir dos mapas obtidos durante a colheita. “Também instalamos o aparelho starlink nas colheitadeiras para manter a conectividade durante a colheita. Assim, se alguma máquina der problema é possível correção imediatamente de forma remota”, diz.
Propriedades acima de 50 hectares
A pesquisa da Embrapa identificou também que no Sul há o dobro de propriedades com mais de 50 hectares do que o registrado no Centro-Oeste. São 38.000 localizadas no Sul, sendo 18.002 no Rio Grande do Sul, 17.742 no Paraná e 2.187 em Santa Catarina, e 16.205 no Centro-Oeste. Destas, 6.266 estão no Mato Grosso, 5.684 em Goiás e 4.062 no Mato Grosso do Sul.
Segundo Moraes, a análise dos tamanhos dos estabelecimentos rurais pode ter implicações para o desenvolvimento de políticas públicas, alocação de recursos e programas de apoio direcionados aos pequenos estabelecimentos, “ bem como para identificar potenciais intervenções ou estratégias que possam ajudar esses produtores a enfrentarem seus desafios produtivos”, avalia.
Juntas as regiões Sul, Centro-Oeste e Sudeste concentram quase 98% do total de propriedades produtoras de soja do País que estão espalhadas por mais de 38 milhões de hectares, segundo a Conab, que prevê uma safra de 41,5 milhões de toneladas para a região Sul, obtidas de uma área de 13,3 milhões de toneladas, de 67,6 milhões de toneladas para o Centro-Oeste, a partir de 21,2 milhões de hectares e de 11,4 milhões de toneladas no Sudeste, que cultivou 3,5 milhões de hectares.
Na safra atual, o Mato Grosso, maior produtor do Brasil, deve colher 39,3 milhões de toneladas. Já o Rio Grande do Sul, segundo maior produtor do Brasil, onde antes das fortes chuvas era esperada uma produção de 22 milhões de toneladas, deve colher 20 milhões de toneladas.