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Por Gabriela Bittencourt — Aberystwyth, País de Gales


Segundo recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS), diariamente devem ser consumidos entre 20 g e 30 g de fibras. Encontradas em alimentos como frutas, legumes, verduras, cereais integrais e leguminosas, as fibras são importantes para melhorar o funcionamento intestinal, mas também contribuem para manter os níveis de glicose e colesterol sob controle, reduzir os riscos de doenças cardiovasculares e câncer. Além disso, um intestino saudável também favorece a melhor absorção de nutrientes, como a vitamina C, tão importante para fortalecer o sistema imunológico em tempos de Covid-19. Mas apesar de seus benefícios para a saúde geral, as fibras não estão presentes de forma adequada na alimentação dos brasileiros. É o que sugerem estudos científicos e pesquisas com a população, como levantamento realizado pelo Ibope Inteligência e encomendado por empresa fabricante de artigos alimentícios, no ano passado. Por meio de entrevistas realizadas via internet, o trabalho indicou que somente 37% dos brasileiros consomem fibras mais de uma vez ao dia.

OMS recomenda consumir ao menos 400 g de frutas, legumes e verduras para ingestão dos 20 g a 30 g de fibras diários — Foto: iStock Getty Images

Para garantir uma adequada ingestão diária desse nutriente e reduzir os riscos de doenças crônicas, a OMS recomenda ingerir ao menos 400 g ou cinco porções de frutas, legumes e verduras. Conforme esclarece o Instituto Nacional de Câncer (Inca), cada porção de alimentos como hortaliças, tomate, cenoura, beterraba, chuchu, couve-flor, abobrinha e quiabo, por exemplo, equivale a uma quantidade que caiba na palma da mão. O Inca também destaca que é recomendável consumir diariamente ao menos três porções de cereais integrais, como meia xícara de farinha de aveia ou arroz integral, excluindo aqueles produtos para consumo matinal e barras industrializadas, que não entram nessa recomendação por serem alimentos ultraprocessados.

5 benefícios das fibras:

  1. Melhora da função e saúde intestinal. Com isso, oferecem proteção contra constipações, chamadas popularmente de prisão de ventre, e reduzem o risco de males como a doença diverticular e o câncer do cólon. As fibras também melhoram a absorção de nutrientes e, dessa forma, favorecem a imunidade. Isso não significa que o consumo evitará infecções, mas que o sistema imunológico estará mais preparado para enfrentar agentes como vírus;
  2. Perda e manutenção de peso;
  3. Proteção contra hiperlipidemia, ou seja, o excesso de gordura no sangue. Vale evidenciar que o consumo de fibras contribui para a manutenção do colesterol LDL, conhecido como ruim, em níveis aceitáveis, além de colaborar para o aumento do HDL, considerado o bom colesterol;
  4. Controle do açúcar no sangue;
  5. Prevenção e tratamento de doenças, como diabetes mellitus; problemas cardiovasculares, entre eles a hipertensão; dislipidemia; obesidade; e diversos tipos de câncer, não apenas tumores no trato gastrointestinal.

Consumo de fibras contribui para perda e manutenção do peso e melhora da saúde geral, incluindo prevenção de doenças crônicas — Foto: Pexels

Doutor em nutrição experimental, Antonio Lancha Jr. confirma que, na prática, é possível notar uma baixa ingestão de fibras no Brasil, conforme demonstram estudos sobre o tema. Segundo o nutricionista, integrante da Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição (Sban), em média, o brasileiro ingere 15 g do nutriente diariamente. Esse consumo baixo compromete o trânsito intestinal, reduz a formação de bolo fecal e favorece a incidência de doenças no órgão, como câncer. O nutricionista observa que esse cenário de insuficiente ingestão de fibras se deve a uma baixa presença de frutas, legumes e verduras na dieta da população.

– Há uma questão cultural: o brasileiro não tem por hábito a ingestão de fibras. O costume de comer saladas e frutas in natura com casca, o que leva a um aumento do consumo de fibras, não é difundido entre todas as classes sociais – analisa Lancha, acrescentando que o processo de digestão das fibras proporciona uma resistência que favorece o tônus do intestino e contribui para a redução de bactérias patogênicas, podendo, portanto, prevenir a ocorrência de doenças.

Dados da última Pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), divulgada em 2019, evidenciam esse quadro. O estudo considerou como regular o consumo de frutas, incluindo sucos, e hortaliças cruas ou cozidas na salada, no almoço e no jantar, em cinco ou mais dias da semana. Entre o conjunto da população adulta maior de 18 anos observada, essa frequência foi de 34,6%, sendo menor entre os homens (27,8%) do que entre as mulheres (40,4%). Segundo a Vigitel, em ambos os sexos, esse consumo regular de frutas e hortaliças tende a aumentar com a idade e com a escolaridade. Além disso, quando considerada a localidade, a regularidade da ingestão desse grupo de alimentos foi baixa, variando entre 15,5% em Fortaleza e 32,6% no Distrito Federal.

Médica da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia Regional São Paulo (Sbem-SP), Tassiane Alvarenga comenta que as fibras, parte dos alimentos que não são digeridas e absorvidas pelo organismo no processo de geração de energia, devem estar presentes em todas as refeições. Como frutas, legumes e verduras em geral contam com esse nutriente, é preciso levar em conta os gostos individuais na hora de escolher as opções que farão parte da dieta. A endocrinologista informa que a Academia Americana de Nutrição e Dietética recomenda a ingestão de 20 g a 35 g diários, sendo indicados, respectivamente, 25 g e 35 g para mulheres e homens adultos. Segundo a médica, nos Estados Unidos, 95% da população não alcançam essa meta. No Brasil, Alvarenga aponta que esse cenário é um pouco melhor, dada a presença daquilo que se chama de comida de verdade na dieta, como é o caso da combinação arroz e feijão. Contudo, a endocrinologista evidencia que o consumo de fibras no país é baixo e é necessário melhorar esse quadro.

– Tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil temos uma epidemia de obesidade, diabetes, hipertensão e doenças cardiovasculares em geral, síndromes metabólicas e depressão. Parte desses quadros pode estar relacionada à baixa ingestão de fibras. Esse baixo consumo gera disbiose intestinal [como é conhecido o desequilíbrio da microbiota] que tem certo papel nessas epidemias – completa a médica endocrinologista.

Atletas e consumo de fibras

É recomendável que atletas de alto rendimento reduzam as fibras quando provas se aproximam. Fale com seu nutricionista — Foto: Unsplash

No dia a dia, as fibras devem estar presentes na alimentação de atletas, que também se beneficiam dos seus efeitos no organismo. Contudo, Lancha comenta que é preciso ter atenção quando provas, que requerem uma necessidade energética grande, se aproximam. Nesses casos, pode ser recomendável abrir mão desse nutriente para aumentar as calorias provenientes de carboidratos e evitar um déficit energético no momento da competição.

– Essa é uma escolha técnica do atleta com seu nutricionista para melhorar o resultado dele. O que acontece é como em um tanque de gasolina, em que há um volume de combustível que cabe ali. Se o atleta consumir alimentos contendo fibras em grande quantidade, elas ocuparão o espaço físico do intestino e ele não terá a energia que precisa para a prova – explica Lancha, emendando que, quando passa a competição, alimentos com fibras deve ser reintroduzidos na dieta.

A endocrinologista acrescenta que, além de déficit de energia, atletas de alta performance, como maratonistas, ciclistas e triatletas, podem ter o desempenho afetado por prejuízos gastrointestinais durante a prova. Como o processo de digestão fica mais lento com o consumo de fibras, há o risco de sofrerem com gases e distensão abdominal. Sem contar que, durante a prática do esporte, o sangue é desviado do intestino para músculos das pernas e braços, por exemplo, diminuindo ainda mais a circulação no intestino. A médica reforça que a dieta desse atleta deve ser definida por um nutricionista. Porém, Alvarenga argumenta que é importante manter uma alimentação rica em fibras no dia a dia, que seja preferencialmente plant based, incluindo ainda oleaginosas e leguminosas além das frutas, legumes e verduras, e reduzir esse consumo apenas cerca de dois dias antes e na data das provas.

– O atleta que faz atividade de alto impacto libera muito cortisol e gera um estresse crônico no organismo. A qualidade das bactérias do intestino é muito importante. São elas que ajudam a modular o equilíbrio hormonal, reduzindo cortisol e catecolaminas, e aumentando serotonina e dopamina. Esse bom ambiente da microbiota intestinal, que depende das fibras, é fundamental para a performance do atleta – discorre a endocrinologista, acrescentando que, em alguns casos, médico e nutricionista que acompanham o esportista podem prescrever o uso prebióticos e probióticos em associação à ingestão de fibras.

Mas Tassiane Alvarenga destaca que essa recomendação de atentar para consumo de fibras antes de treinos e provas vale especialmente para atletas adeptos de atividades de endurance. Pessoas que praticam exercícios físicos regularmente podem contar com alimentos com fibras no seu pré-treino.

– Para quem faz academia, não há problema em consumir fibra antes de treinar. O atleta de alta performance é uma exceção. Um exemplo prático é que as pessoas em geral podem colocar aveia na banana, o que até diminui o pico glicose e insulina. Mas essa combinação não é boa para o pré-treino do atleta de alta performance, para quem cada segundo é importante – completa.

Recomendações para atletas:

Para pessoas em geral que fazem atividades físicas regularmente, não há problemas em consumir fibras antes do treino — Foto: Istock Getty Images

  1. Primeiramente, lembre-se de que é importante consultar um nutricionista para ter um plano alimentar individualizado, que considere, por exemplo, o esporte praticado, seus objetivos e rotina de treinamento;
  2. Inclua fibras na sua alimentação. Porém, cerca de dois dias antes de provas e treinos importantes, é necessário reduzir o consumo desse nutriente para focar na ingestão de carboidratos. Passada a prova, as fibras devem ser reintroduzidas na dieta;
  3. Evite alimentos industrializados, que são pobres em nutrientes, incluindo fibras, e favorecem o desequilíbrio da microbiota intestinal.

Como tirar proveito das fibras

Alimentos como cereais e leguminosas também são fontes de fibras e devem estar presentes na dieta — Foto: Unsplash

A seguir, com o apoio do nutricionista e da médica endocrinologista, explicamos mais sobre as fibras e suas fontes e apresentamos dicas para ajudar a garantir um consumo adequado e melhor função desses nutrientes.

Fontes e funções das fibras:

  • Solúveis: são encontradas em frutas, verduras, cereais integrais, como arroz, aveia e cevada; e leguminosas, como feijão, lentilha, ervilha e grão de bico. Ao se misturarem com a água, no estômago, formam um gel que contribui para aumentar a sensação de saciedade, o que favorece a manutenção e a perda de peso. Ademais, proporcionam benefícios como controle de glicose e dos níveis de colesterol LDL e manutenção da pressão arterial e saúde cardiovascular;
  • Insolúveis: estão presentes em alimentos como verduras, grãos integrais e no farelo de trigo. Esse tipo de fibra atua na formação do bolo fecal, prevenção de constipação intestinal e na determinação de como será a microbiota, dado que servem de alimento para as bactérias ditas do bem.

Dicas para inclusão das fibras no dia a dia:

Consumo de fibras associado a ingestão regular de água ao longo do dia garante boa saúde intestinal — Foto: Istock

  • Aposte no consumo de frutas, legumes e verduras, de preferência in natura, com casca, quando possível, e bagaço. Se você gosta de maçã, por exemplo, inclua essa opção no seu dia a dia. Mas se não é fã dessa fruta, pode recorrer às frutas cítricas com bagaço. O importante é considerar os seus gostos pessoais, sem se obrigar a comer um vegetal que não seja da sua preferência. Além disso, opte por alimentos integrais, como arroz e farinha, que contam com uma quantidade maior de fibras;
  • Distribua a ingestão desse nutriente ao longo de todo o dia. Não adianta passar o dia inteiro sem consumir frutas, legumes, verduras ou cereais integrais e, ao jantar, comer um grande prato de salada. Procure assegurar que esse nutriente esteja presente em todas as suas refeições e lanches, para garantir seus benefícios ao organismo. Para tanto, considere as seguintes sugestões gerais ao planejar o seu cardápio diário:
  1. Café da manhã e lanches da manhã e da tarde: opte por frutas in natura e alimentos como aveia;
  2. Almoço e jantar: inclua sempre saladas e cereais integrais. Nessas refeições, prefira o arroz integral ao branco, por exemplo;
  • Reforce o consumo regular de água. Atenção que não se trata de uma questão apenas de quantidade, mas de frequência. Se essa ingestão não for regular, o bolo fecal ficará mais denso e o seu trânsito no intestino pode ser prejudicado. Uma recomendação geral é beber um copo de 200 ml de água a cada hora;
  • Para mais orientações, consulte nutricionista. Além desse suporte ser importante para garantir o equilíbrio entre o consumo de fibras solúveis e insolúveis e considerar gostos pessoais para estabelecimento do plano alimentar, é essencial para pessoas com quadros de doenças inflamatórias como a síndrome intestino irritado ou que querem emagrecer, por exemplo;
  • No mais, tenha em mente a recomendação de investir em uma alimentação saudável e nutritiva, composta por alimentos frescos e coloridos e comida caseira, em vez de alimentos industrializados e fast food. Esse é o caminho para garantir um maior consumo de fibras no seu dia a dia.

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