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Por Marcela Franco, para o EU Atleta — Bauru, SP


Você sabia que temperatura e incidência de doenças cardiovasculares têm relação? Segundo o Instituto Nacional de Cardiologia, durante o inverno, os casos de infarto agudo do miocárdio aumentam em até 30% e os de acidente vascular cerebral (AVC) em até 20%. Conforme especialistas, o tempo frio estimula os receptores periféricos da pele, provocando vasoconstrição (redução do diâmetro dos vasos sanguíneos) e, consequentemente, sobrecarga do sistema circulatório. Fazer exercícios nesta época do ano requer cuidados adicionais.

Exercícios no frio precisam ser realizados com cuidado adicional, pois doenças cardiovasculares aumentam no inverno — Foto: iStock

Por que doenças cardiovasculares aumentam no inverno?

O médico cardiologista Silvio Póvoa Junior pontua que as doenças cardiovasculares aumentam no inverno devido a uma somatória de fatores.

Uma explicação fisiopatológica é que, no frio, ocorre maior necessidade de o organismo buscar meios de se esquentar e evitar a perda de calor, de modo a manter a temperatura corporal na casa dos 36 °C a 37 °C.

Isso exige o recrutamento do chamado sistema simpático, que envolve a liberação de diversas substâncias na circulação, a mais famosa delas, a adrenalina. Essas substâncias possuem diversos efeitos no organismo, dentre eles, o aumento de frequência cardíaca, a elevação da pressão arterial e o crescimento do que se chama de resistência vascular periférica.

A ideia é fechar os vasos sanguíneos periféricos, diminuindo a perda de calor para o ambiente. Além disso, manter a temperatura corporal estável gera uma demanda energética. Isso em quem já tem alguma doença cardiovascular pode ser o fator de descompensação — pondera Silvio.

O diretor do Departamento de Cardiogeriatria da Sociedade Brasileira de Cardiologia, José Carlos da Costa Zanon, explica que, durante o inverno, período com temperaturas mais baixas, os vasos sanguíneos se contraem, o que pode, consequentemente, aumentar a pressão arterial.

O aumento da pressão arterial é um dos principais fatores de risco para a ocorrência de infartos e AVC, que são as doenças cardiovasculares mais comuns nessa época do ano. O frio também pode intensificar a formação de trombos, que aumentam ainda mais o risco de complicações cardiovasculares — elenca o cardiologista.

Silvio lembra ainda que, no inverno, devido às baixas temperaturas, há uma tendência de se buscar alimentos mais calóricos, já que o organismo consome maior energia para manter a temperatura corporal, o que pode ser fator para descompensação de doenças metabólicas como diabetes, colesterol, hipertensão arterial e obesidade. Segundo o médico, essas doenças contribuem para o adoecimento cardiovascular.

— Durante o inverno, como o tempo de luz solar fica menor, é mais provável que as pessoas procurem menos parques, clubes, praias, pistas e piscinas nos horários livres do dia. Isso faz com que a prática de exercício físico, algo importantíssimo para a saúde, se torne menor — complementa o médico.

O que diz a ciência

Um estudo publicado na revista científica Science of the Total Environment analisou o efeito da temperatura ambiente na mortalidade cardiovascular em 27 cidades brasileiras. Segundo os achados, baixas e altas temperaturas na maioria dos municípios do Brasil estão associadas à maior mortalidade cardiovascular. Ao nível nacional, o efeito do frio aumentou em 26% o risco relativo de mortalidade por problema cardiovascular.

Segundo outro estudo, publicado no International Journal of Circumpolar Health, infecções respiratórias e virais, mais comuns no inverno, podem ser fator de risco para doença coronariana ou AVC, pois impactam na coagulação sanguínea, causam danos às paredes dos vasos e podem promover aterosclerose. O estudo apontou que, durante o inverno na Finlândia, ocorrem cerca de 3.500 mortes extras se comparadas a outras épocas do ano. Desse número, 900 são causadas por doença coronariana e 500 por AVC.

Cuidados com a saúde no inverno

Durante o inverno, é essencial manter hábitos de vida saudáveis, segundo José Carlos:

  • Ter alimentação equilibrada, evitando o excesso de alimentos ricos em gordura e sal;
  • Não fumar;
  • Evitar bebidas alcoólicas;
  • Fazer atividades físicas regularmente;
  • Manter o corpo aquecido nos momentos de frio mais intenso.

Silvio complementa fazendo o alerta de que é necessário controlar adequadamente os principais fatores de risco cardiovascular, como a pressão arterial, o colesterol e a diabete.

— Devemos ter atenção especial para a hipertensão arterial sistêmica. O frio, por "fechar os vasos sanguíneos" (o que chamamos de aumento de resistência vascular periférica) pode aumentar a pressão. Além disso, perde-se menos água e sal pela transpiração em dias frios. Por isso, pode ser que pressões aparentemente bem controladas no verão possam merecer ajuste no inverno — pondera o especialista.

Pacientes com doenças coronarianas e insuficiência cardíaca precisam ser acompanhados de perto. O aumento da ativação do sistema simpático (adrenalina e substâncias similares) pode ser fator de descompensação. O mesmo raciocínio pode ser aplicado para as taquiarritmias, que são arritmias que "aceleram" o ritmo do coração.

Cuidados com exercícios no inverno

Para não sobrecarregar o corpo, que sofre com o frio, é preciso aquecê-lo adequadamente para a realização de exercícios físicos. Não se deve abandonar as atividades físicas, mas fazê-las com cuidado adicional.

O ideal, segundo os cardiologistas, é começar a sessão de treino em intensidades menores e aumentar progressivamente o esforço. É necessário ainda se vestir conforme a temperatura do ambiente onde o exercício é realizado e estar alimentado.

— Deve-se tomar cuidado com exercícios feitos ao ar livre, nas piscinas, nos mares e nos rios. A temperatura externa pode influenciar não só a performance, como também a saúde. Vale lembrar que a alimentação é por vezes também uma forma de se aquecer. Tanto pela temperatura oferecida por alimentos quentes quanto pelo próprio metabolismo energético que dissipará energia em forma de calor — explica Silvio.

José Carlos complementa que a hidratação deve ser mantida em altos níveis para a realização dos exercícios físicos, mesmo que a sudorese seja menor do que no calor e que o indivíduo não sinta sede.

Fontes:

José Carlos da Costa Zanon é medico cardiologista, diretor do Departamento de Cardiogeriatria da Sociedade Brasileira de Cardiologia (@sbc.cardiol) e professor da Escola de Medicina da Universidade Federal de Ouro Preto UFOP.

Silvio Póvoa Junior (@drsilviopovoajr) é médico cardiologista na Dante Pazzanese de Cardiologia e no Hospital Israelita Albert Einstein. É especialista em Clínica Médica e possui fellow em Cardiologia do Esporte.

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