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Por Rafael Teles


Absolutamente fenomenal. Espetacular. Acrobático. Inesquecível. Extraordinário. Memorável. Fantástico. Artístico. Icônico. Antológico. Gol de Copa do Mundo. Estes foram alguns dos adjetivos usados, em português, holandês e muitos outros idiomas para descrever o gol marcado por Robin van Persie em Holanda 5 x 1 Espanha, na Copa do Mundo de 2014.

Gol da Holanda! Van Persie surpreende, cabeceia e encobre Casillas, aos 43 do 1º tempo

Gol da Holanda! Van Persie surpreende, cabeceia e encobre Casillas, aos 43 do 1º tempo

O relógio apontava 43 minutos do 1º tempo quando Danny Blind fez o lançamento pela extrema esquerda da faixa central do campo. Ao mesmo tempo, Van Persie disparou entre Sergio Ramos e Jordi Alba. Ele correu até a linha da grande área, de onde mergulhou para acertar a bola de cabeça, com força e ângulo perfeitos para encobrir Iker Casillas e balançar a rede padrão Fifa da Arena Fonte Nova [assista no vídeo acima].

“É um gol diferente. Lindo, maravilhoso. Um gol de Copa mesmo, que foi uma frase que eu usei naquela narração. Um lance que a gente vai lembrar para sempre”.

A descrição acima é de Luís Roberto, que narrou o jogo para a Globo em 2014. Ele conversou com o ge para relembrar a experiência na Arena Fonte Nova.

- Deu para sentir (que era um gol especial). “Gol de Copa do Mundo”. Foi a segunda vez que eu usei essa frase. A outra vez foi no primeiro gol de Copa que eu narrei na TV Globo, que foi na Copa de 1998. Na hora que acontece o gol, você começa a tentar buscar algo que decifre o gol. E no meu conceito, não significa que está certo, eu acho que ficar despejando adjetivos é simplificar muito a situação. Enquanto está rolando o replay você fica: “Meu Deus, me ajuda aqui, eu preciso de uma palavra, de uma frase que tire esse gol da normalidade”. Então me veio essa frase. Eu lembrei dela e usei outra vez. E não usei mais, mas estou com vontade de usar novamente - completou Luís Roberto.

Blind Holanda lançamento gol Van Persie — Foto: Reprodução SporTV

A partida disputada há dez anos, no dia 13 de junho de 2014, não foi só um jogo de Copa. Foi a reedição da final do último Mundial já na primeira rodada da fase de grupos. Foi o debute de Salvador na maior competição de futebol do mundo. Foi a tela para a obra de arte que Van Persie deixou como legado na Arena Fonte Nova: “O holandês voador”.

Van Persie marca golaço em Copa do Mundo — Foto: Getty Images

- Era a primeira viagem, o Brasil estreava na véspera. A gente se reuniu no hotel, nossa equipe que estava ali. Eu, Júnior, Renato Marsiglia que era o comentarista de arbitragem, os colegas do SporTV, a gente se reuniu para assistir ao jogo do Brasil, mas a gente não parava de falar do jogo que a gente ia fazer no dia seguinte. Foi maravilhoso. Toda aquela expectativa, aquela atmosfera, porque tinha um clima de revanche sim. Praticamente os mesmos times, os mesmos jogadores envolvidos. Então a expectativa era enorme - lembra o narrador.

Até junho de 2014 o “Holandês Voador” era um lendário navio-fantasma que carregava a maldição de vagar pelos mares até o fim dos tempos, sem nunca mais poder atracar em nenhum porto. Não é exagero dizer que a imagem de Van Persie voando na Arena Fonte Nova trouxe um novo significado para o nome.

Luis Roberto lembra partida épica entre Espanha e Holanda e fala da narração histórica

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- É incrível, esse gol certamente está entre os especiais. Os gols de Copa do Mundo são muito especiais. Tem gols muito legais. Agora o do Van Persie é esse gol que a gente comemora aniversário com ele. Então ele é especial, é muito especial - resumiu o narrador.

Explicar o inexplicável

Robin van Persie finaliza de peixinho em Espanha x Holanda — Foto: Getty Images

Assistir ao gol de Van Persie hoje é como ir ao museu e apreciar a obra pronta, finalizada. Mas quem esteve na Arena há dez anos viveu a experiência da criação. Testemunhou a história com os próprios olhos e traz lembranças pessoais de um dos gols mais bonitos da história das Copas.

- Foi um gol que você vê no estádio e não esquece. Existem gols e gols né?! Um gol incrível, em uma Copa do Mundo. Qual é a chance de acontecer isso outra vez? Um gol desse nível em uma Copa do Mundo no meu país, na minha cidade. Você só vai entender a importância do gol, o tamanho de tudo aquilo que aconteceu, um pouco mais para frente, depois que passam os anos. Agora faz dez anos já né?!

Quem conta é o gerente de marketing André Serra. Em 2014, aos 22 anos, ele foi ao jogo acompanhado do pai, mas só um dos dois foi testemunha ocular da história. Enquanto André assistia Van Persie criar o Holandês Voador, seu pai aumentava a coleção de copos de cerveja - quente - da Copa do Mundo de 2014.

“Ele não viu porque foi buscar a cerveja quente. Pegou fila para pegar a cerveja”.

- Ele não acreditou e foi difícil explicar o gol. Van Persie deu uma cabeçada que encobriu o goleiro. O goleiro estava ali um pouco mais para frente na pequena área. E ele deu uma cabeçada que encobriu. A bola que veio lá de trás, é muito difícil explicar um gol desse. Depois ele viu o vídeo e entendeu. Mas é indescritível - lembra André.

Van Persie salta para golaço em Holanda x Espanha — Foto: Agência Getty Images

O pai de André não foi a única pessoa na Fonte Nova que perdeu a criação do "Holandês voador". Thiago Pereira, atualmente editor do Globo Esporte, era repórter do ge e estava na Arena com a missão de encontrar personagens e descobrir boas histórias no meio da torcida. E justamente enquanto ele ouvia um torcedor Van Persie disparava entre Sergio Ramos e Jordi Alba.

- A gente ia para conversar com os torcedor, porque a gente não fazia a matéria do jogo. A gente fazia matéria de comportamento, entrevistas coletivas, coisas do factual que pintavam no momento. O jogo era feito pela redação do Rio de Janeiro. E no momento do gol de Van Persie, eu tinha subido para falar com um cara que reclamava dos lanches da Fonte Nova e do atendimento do bar. Ele considerava um lanche caro e um atendimento ruim para a Copa do Mundo. Lembro que o cachorro quente era só água, salsicha e pão.

- A gente estava de costas e ouviu o barulho do estádio. E aí a gente só soube por meio de relatos. "Golaço!", "o gol mais bonito que eu já vi", "absurdo". Não tem como você construir aquele gol na imaginação. Eu vi o gol pela primeira vez na zona de conferência de imprensa do estádio, uma sala com muitas TV's. Isso já depois do jogo, mais de uma hora depois do gol - lembra Thiago Pereira.

Holanda x Espanha tem golaço de Van Persie em Casillas — Foto: Reuters

Explicar o gol marcado por Van Persie não é mesmo uma missão das mais fáceis. Há dez anos, minutos depois da partida, o próprio atacante tentou transformar em palavras o que fez para encobrir Casillas na Arena Fonte Nova.

- Eu queria tanto chegar na bola que voei desesperadamente e fiz algo que nunca tinha feito antes. Eu fiquei olhando para a bola enquanto eu voava, até que caí de cara no gramado. (...) Foi um grande gol. Eu tive que apostar. Pouco antes de receber o lançamento, olhei e vi Casillas adiantado no gol. Aí pensei em dar aquela cabeçada, que foi na verdade um lobby. Sinceramente, achei um grande gol - descreveu o holandês em entrevista coletiva após a partida na Arena Fonte Nova.

Robin van Persie é o maior artilheiro da seleção holandesa com 50 gols, seis em Copas do Mundo. Nenhum deles tão marcante quanto aquele na Arena Fonte Nova. Um gol que “faz aniversário”, como disse Luís Roberto. E que rende histórias e brincadeiras para quem viu e também para quem não pôde vislumbrar de perto.

- Eu brinco: “Você lembra que não viu os gols?”. Tanto que em outro jogo que a gente foi, eu acho que Suíça e França, ele só foi no banheiro e comprar cerveja no intervalo, para não perder nada - contou André Serra, agora com 32 anos.

E foi mesmo um “grande gol”. Absolutamente fenomenal. Espetacular. Acrobático. Inesquecível. Extraordinário. Memorável. Fantástico. Artístico. Icônico. Antológico. Um gol de Copa do Mundo. Um gol que nesta quinta-feira completa aniversário de dez anos.

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