Por Denilson d'Almeida, g1 Pará — Belém-PA


Escolas no Marajó não tem saneamento básico

Escolas no Marajó não tem saneamento básico

Um levantamento inédito apontou que 398 escolas municipais no arquipélago do Marajó, no Pará, não dispõem do mínimo de saneamento básico necessário para atender cerca de 15 mil estudantes da região. Os dados são do projeto Saneamento nas Escolas: Piloto – Ilha do Marajó, da ONG Habitat para a Humanidade Brasil

Segundo o levantamento, 370 (93%) das 398 unidades educacionais pesquisadas no Marajó não tem abastecimento público de água e 239 (60%) não dispõem de nenhum sistema de tratamento de esgoto.

Também foi detectado que 149 (37%) das escolas municipais não tem sequer banheiros para alunos, professores e demais trabalhadores da área da Educação. Os dados foram apresentados na sexta-feira (21) pela Habitat.

Os problemas foram constatados nas comunidades ribeirinhas e rurais de todos as 16 cidades da região. São escolas com até 50 alunos matriculados e que oferecem Ensino Infantil, Ensino Fundamental e Educação de Jovens e Adultos (EJA).

Os números traduzem a precariedade que crianças e adolescentes enfrentam numa região onde a maioria dos municípios apresentam baixos Índices de Desenvolvimento Humano (IDH). Melgaço, por exemplo, que fica no Marajó, é o município que tem o pior IDH do Brasil, de 0,418 - o índice varia de zero até 1.

O Marajó é o maior arquipélago flúvio-marítimo do planeta. A ilha, cercada por mar e rio, está localizado na foz do Rio Amazonas- veja no mapa mais abaixo. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), pouco mais de 557 mil pessoas habitam a região. A maioria reside em comunidades ribeirinhas e rurais.

Mapa da ilha do Marajó e a localização dos 16 municípios. — Foto: Arte/g1

A geografia local, apesar do cenário de paisagens e florestas exuberantes, é desafiadora para as esferas da administração pública, alertou também o levantamento. Ainda mais quando se leva em consideração a necessidade de se implantar projetos de infraestrutura, saúde, educação e saneamento básico.

O estudo levou em consideração que saneamento básico é poder contar com fornecimento e distribuição de água potável, coleta e tratamento de esgoto, coleta e destinação adequada de resíduos sólidos (lixo) e, no caso das cidades, dispor de um sistema de drenagem.

Porém, nada ou pouco disto foi encontrado nas instituições municipais de ensino visitadas pela ONG Habitat para a Humanidade Brasil, no Marajó. A organização ouviu professores, alunos, secretários municipais e pedagogos afim de traçar um diagnóstico sobre o saneamento nas escolas.

Escolas em terrenos alagáveis não dispõe de saneamento básico, no Marajó — Foto: Desiree Giusti/Habitat Brasil

Sem água potável, nem banheiro

Ao todo, são aproximadamente 500 escolas municipais no arquipélago. Das 398 escolas pesquisadas, 202 delas estão em áreas alagáveis, ou seja, terrenos que sofrem a influência de cheia e secas de rios nessa porção da Amazônia.

A água que as crianças e os adolescentes consomem nas 370 escolas sem abastecimento público de água são de rios e igarapés, sem nenhum tipo de tratamento. As consequências refletem na saúde deles, que passam a sofrer de doenças causadas pela contaminação dessas águas.

No Brasil, dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), de 2021, apontam a diarreia como a causa de 96,2% das internações por doença relacionadas ao consumo de água contaminada.

Além da carência de água potável, outro grave problema é a falta de banheiros.

“Na ausência de banheiros, as unidades escolares recorrem ao uso de latrinas, geralmente encontradas em estruturas precárias de madeira próximas às escolas, sem um sistema adequado de esgoto, ou até mesmo escolas que não possuem sequer esse tipo de instalação”, disse a gerente de programas da Habitat Brasil, Mohema Rolim.

Chaves e Breves são os municípios com maior número de escolas sem banheiro, segundo a pesquisa. Cada um deles concentra 48 unidades de ensino sem lavatório e sanitário.

Sobre esta questão, o g1 procurou a prefeitura de Chaves, que, em nota, respondeu que a Secretaria Municipal de Educação fez o mapeamento das escolas que não tinham saneamento básico. A partir do levantamento traçou estratégias de construções, reformas e ampliações de espaços escolares.

Em relação ao abastecimento de água, a prefeitura informou que todas as escolas aderiram ao Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), do governo Federal, que destina recursos financeiros para a Educação Básica do campo, indígenas e quilombolas, localizadas na zona rural, afim de garantir o abastecimento de água em condições apropriadas ao consumo e o esgotamento sanitário nas unidades escolares beneficiadas.

Também procurada, a prefeitura de Breves não explicou o motivo de tantas escolas sem banheiro, mas repassou um balanço de 13 escolas inauguradas na zona rural, 9 reformadas e duas reinauguradas. Informou ainda que há 45 escolas em construção. Segundo a prefeitura, todas com a estrutura moderna adequada.

A destinação adequada dos resíduos sólidos produzidos nas escolas do Marajó também é outro grave problema de saneamento básico. Segundo a Habitat, 89% das unidades (356 escolas) não contam, com serviço de coleta de lixo e não fazem a destinação correta dos resíduos.

Em algumas localidades, o lixo é queimado ou enterrado no próprio terreno do colégio, contaminando o solo e lençóis freáticos da região.

O levantamento da Habitat para a Humanidade Brasil vai balizar o investimento de cerca de R$ 43 milhões na região do Marajó, sendo que R$ 20 milhões destes recursos são do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDS). Os outros 23 milhões restantes do projeto serão captados por outros parceiros.

O projeto é desenvolvido em parceria com o Instituto Água e Saneamento, Cáritas Norte II, Coordenação das Associações das Comunidades Remanescentes de Quilombos do Pará (Malungu) e Federação de Órgãos para a Assistência Social e Educacional Pará.

“O objetivo do projeto é compreender e enfrentar os desafios críticos relacionados à qualidade da água e do saneamento em escolas com até 50 alunos, viabilizando a efetivação da construção de soluções de saneamento nas escolas”, explicou Mohema.

Escolas municipais, no Marajó, funcionam em terrenos que alagam — Foto: Desiree Giusti/Habitat Brasil

O que dizem as prefeituras:

O g1 entrou em contato com as prefeituras de todos os municípios marajoaras. Até a publicação desta reportagem, tivemos resposta apenas da prefeitura de Breves - que você leu acima - e das seguintes prefeituras:

Portel
A prefeitura de Portel informou que está ciente das necessidades das escolas e que trabalha para fazer a instalação de banheiros e implantar abastecimento de água potável nas unidades. Um dos projetos em andamento é a implantação e instalação de cisternas que possuem um sistema integrado de captação, tratamento e reserva de água da chuva.

Segundo a Secretaria Municipal de Educação de Portel, 15 escolas do campo já contam esta tecnologia, fruto de uma parceria com os governos Federal e Estadual. Professores e outros servidores da Educação passam por capacitação a gestão da água e saúde ambiental.

Muaná
A prefeitura informou que vem se empenhando para sanar eventuais problemas como do saneamento básico e água potável. Segundo a nota, entre 2022 a 2024, 8 novas escolas municipais foram construídas com banheiro e água potável, 17 escolas foram reformadas e ampliadas. Outras sete novas escolas estão em construção.

Veja, abaixo, imagens feitas durante a pesquisa no Marajó:

Água consumida nas escolas vem de rios e igarapés e não recebem tratamento algum. — Foto: Desiree Giusti/Habitat Brasil

Banheiros sem condições adequadas de uso em escola municipal, no Marajó — Foto: Desiree Giusti/Habitat Brasil

Na falta de banheiro adequado, professores e alunos recorrem a latrinas, espécie de escavação ou buraco no solo, cercado de madeira, onde a pessoa deposita os excrementos e dejetos (urina e fezes). — Foto: Desiree Giusti/Habitat Brasil

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