Tendências para o Futuro
Por , Época NEGÓCIOS

Em um Brasil onde cerca de 30% dos alimentos são perdidos e pelo menos 27 milhões de toneladas são desperdiçadas por ano, pensar em formas de reduzir o desperdício no setor é peça-chave para garantir a sustentabilidade ambiental e financeira dos negócios. Não à toa, essa foi uma das oito tendências globais de 2024 do relatório "Menus do futuro", elaborado pelo braço de Food Solutions da Unilever, junto à indústria e a mais de 1.600 chefs em 21 países.

Menus de baixo desperdício foi uma das mais relevantes tendências no mundo e no nosso país, segundo Adriana Vichino, diretora de Marketing da Unilever Food Solutions na América Latina. "O desperdício zero é central para um chef de cozinha, e se refere a como você usa a sua criatividade e inovação para reinventar o menu e não desperdiçar – porque todo o excedente que não vai para o lixo é lucro", explica a executiva, em entrevista a Época NEGÓCIOS.

A ideia do relatório, segundo ela, é estimular o poder criativo dos chefs para ter um aproveitamento integral dos ingredientes, sugerindo tanto receitas como técnicas culinárias para que eles cheguem lá.

A pesquisa apontou que o maior motivo para se adotar essa tendência nos restaurantes brasileiros ainda é aumentar a rentabilidade e reduzir custos, embora 54% destes também considerem uma operação mais sustentável em termos ambientais. Neste ponto, o Brasil ainda se encontra bem menos evoluído que a Europa, onde os impactos no meio ambiente vêm em primeiro lugar, explicou Adriana.

Por outro lado, 46% dos consumidores brasileiros preferem consumir de empresas que tenham responsabilidade ambiental e social, conforme apontou uma pesquisa do Instituto Akatu. “Essa consciência vem aumentando entre os consumidores, e vem fazendo com que também o operador [restaurante] passe a se preocupar com isso”, afirmou Adriana.

Junto com o estudo, a Unilever atuou com parceiros - por exemplo, o grupo Pão de Açúcar, com quem elaborou 420 receitas em conjunto. Outra parceria foi com o Bibi Sucos, rede que tem 17 restaurantes no Rio de Janeiro, e adotou um molho de tomate em pó da Unilever para reduzir o desperdício.

No Bibi Sucos, o molho de tomate utilizado é em pó e está presente em vários pratos -- a fim de reduzir o desperdício do vegetal — Foto: Divulgação
No Bibi Sucos, o molho de tomate utilizado é em pó e está presente em vários pratos -- a fim de reduzir o desperdício do vegetal — Foto: Divulgação

A solução gerou uma economia de 152 kg de tomate que "iriam para o lixo" em apenas um mês, segundo Pedro Guimarães, Chefe executivo da rede. "Com a tecnologia e a evolução dos alimentos, conseguimos otimizar o tempo, a mão-de-obra e, o mais importante, a padronização dos nossos preparos", disse.

Outras ações sustentáveis da rede são a adoção de embalagens sustentáveis no delivery para reduzir o uso de plástico e um investimento em reciclagem em parceria com a Eu Reciclo. "O impacto é bastante positivo, pois a minimização do desperdício e a economia que tais práticas promovem acabam por trazer também retorno financeiro, através da diminuição de custos", destacou Guimarães.

Restaurantes sustentáveis

No Corrutela, restaurante em São Paulo do chef César Costa, a ideia também é aproveitar ao máximo os alimentos e não desperdiçar. O estabelecimento chegou a ganhar o prêmio do Latin America’s 50 Best Restaurants na categoria sustentabilidade.

Diversas práticas são adotadas para minimizar o desperdício: uma composteira transforma restos de alimentos em adubo para ser utilizado em suas hortas e uma máquina israelense desidrata resíduos orgânicos para reduzir seu volume em até 90%.

"Esse processo facilita o manuseio e o transporte dos resíduos e permite que sejam compostados de maneira mais eficiente. A tecnologia ajuda a fechar o ciclo dos alimentos, retornando nutrientes ao solo e minimizando o impacto ambiental do restaurante", destacou o chef.

No Corrutela, os pratos são produzidos pensando no aproveitamento integral do alimento e na redução do desperdício — Foto: Divulgação
No Corrutela, os pratos são produzidos pensando no aproveitamento integral do alimento e na redução do desperdício — Foto: Divulgação

Além disso, sempre que possível, eles reaproveitam os alimentos excedentes -- como, por exemplo, cascas de vegetais são usadas para fazer caldos e sopas, e talos de ervas são incorporados em molhos e marinadas. Outras estratégias incluem: o planejamento do menu considerando a sazonalidade e disponibilidade dos ingredientes, o controle de estoque para que se compre apenas o necessário, o treinamento da equipe para otimizarem os pratos e porções, ajustados para evitar sobras.

Segundo César, o maior desafio para alcançar o desperdício zero é a variabilidade na demanda dos clientes. "Mesmo com um planejamento rigoroso, é difícil prever exatamente quantas pessoas virão e quais pratos escolherão. Além disso, educar a equipe e os fornecedores e integrar essas práticas de maneira consistente."

Outro restaurante que aposta na tendência é o Estela Passoni, em Pinheiros, que leva o nome da chef e fundadora -- junto com sua sócia e filha, Mariana Passoni. Sua proposta é entregar comida saudável e de baixo impacto ambiental e para isso, a dupla realiza uma série de ações sustentáveis. Em entrevista a Época NEGÓCIOS, Mariana contou que tudo começou quando ela ainda era criança: seu corpo rejeitou o consumo de carne vermelha e sua mãe encontrou barreiras para a alimentar. Foi então que ela resolveu estudar alternativas mais saudáveis e se especializar na cozinha.

"Começou com uma sopa para os amigos e vizinhos, até que se tornou algo mais estruturado. Aqui as comidas são mais elaboradas, mas não foge muito do que comíamos na nossa casa. A ideia é sempre alimentar as pessoas de uma forma que aproxime, deixando uma memória afetiva", disse.

O restaurante não serve carne vermelha e o carro-chefe é o polpettone de frango — Foto: Divulgação
O restaurante não serve carne vermelha e o carro-chefe é o polpettone de frango — Foto: Divulgação

O local já nasceu com a proposta sustentável e realiza diversas iniciativas: neutralização de carbono das entregas no Delivery por meio da restauração de uma área no Pará em parceria com a Biofílica da Ambipar, coleta de bucha e tampinhas para destinação a alguns projetos socioambientais, reciclagem e claro, o combate ao desperdício.

Para que não sobre excedentes e nada vá fora, são usadas algumas estratégias. O cardápio muda todas as semanas pensando na sazonalidade e quantidade de alimentos que serão necessários para cada prato: "O que eu compro é o que vou usar com certeza, a chance de sobrar é muito rara. Caso isso aconteça, nós vendemos como congelados no nosso mercadinho", explicou Mariana. O restaurante aposta em ingredientes frescos, calcula as porções exatas das suas cerca de 450 refeições diárias e assim gera no máximo dois sacos de lixo orgânico.

Delivery contra o desperdício

Atuando também na etapa final e no varejo do setor de alimentação, está a startup Food To Save, fundada em 2020 por Murilo Ambrogi, Fernando Reis, Guido Bruzadin e Lucas Infante. A foodtech se propõe a conectar estabelecimentos que têm excedentes de alimentos com clientes que valorizam um consumo mais consciente e, ao mesmo tempo, querem pagar menos -- a economia chega a 70%.

O aplicativo conta com quase 7 mil parceiros -- entre restaurantes, cafeterias, supermercados e padarias -- e oferece sacolas com mix de produtos "surpresas" que seriam desperdiçados. No portfólio de clientes da startup estão Cacau Show, Kopenhagen, Pão de Açúcar, Dona Deôla, Bella Paulista e Vila Real.

Lucas Infante conta que a ideia do negócio surgiu após uma experiência que teve em uma franquia do Carrefour Express, na Espanha, onde sentiu na pele o custo de jogar a comida fora. Então, ele começou a estudar o mercado no Brasil e enxergou um cenário de oportunidades: 35 mil toneladas por dia de alimentos desperdiçados no país, sendo que de 10% a 12% acontecem na etapa final de varejo -- e uma pandemia havia acabado de agravar o problema.

A empresa atua com os alimentos "aptos" -- aqueles esteticamente imperfeitos ou que não foram vendidos na vitrine, mas que podem ser consumidos -- e consegue recuperar 80% do volume. Atualmente, a startup está em oito capitais brasileiras e mais de 100 municípios.

"Estamos em um momento de pura adesão da causa, pois nascemos de um movimento contra o desperdício, usando tecnologia. É um pilar central do negócio. Não é só vender o excedente. Nós geramos um ganha-ganha para todos, e também estamos reeducando o Brasil em relação ao consumo de alimentos – que é uma pauta importante em um país que voltou ao mapa da fome", destacou o fundador e CEO da Food to Save.

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