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Por Rafael Faustino


Sergio Furio, fundador e CEO da Creditas — Foto: Foto: Divulgação / Arte: Clayton Rodrigues
Sergio Furio, fundador e CEO da Creditas — Foto: Foto: Divulgação / Arte: Clayton Rodrigues

Uma das conquistas do unicórnio Creditas foi tornar mais simples e mais baratos os empréstimos no Brasil. De um marketplace que comparava taxas de diferentes bancos e direcionava os clientes para essas instituições, a startup se tornou um importante player de serviços financeiros, sendo referência na concessão de empréstimos com taxas mais amigáveis e bens como carros e casas como garantia.

Fundada pelo espanhol Sergio Furio em 2012 com o nome BankFácil, a Creditas mudou para o nome atual em 2017. De lá para cá, cresceu à base de muitas aquisições e adicionou vários outros serviços à sua carteira, como venda de seguros, gestão de benefícios corporativos e intermediação de vendas de imóveis e carros – ultrapassando assim os limites mais comuns das fintechs.

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Na trajetória de pouco mais de 10 anos, a empresa se tornou unicórnio e passou a administrar uma folha de crédito de R$ 5,7 bilhões, uma força de trabalho de mais de 2 mil pessoas e uma receita que ultrapassa os R$ 2 bilhões. Nada mal para uma empresa cujo CEO mal conhecia o mercado brasileiro quando chegou por aqui:

Como surgiu a Creditas?

Até pouco tempo antes de fundar a Creditas, Sergio Furio trabalhava no Boston Consulting Group, vivia em Nova York e sabia pouquíssimo sobre o Brasil. Ao saber que um amigo estava abandonando o mercado tradicional para abrir uma startup de fotos de casamentos, ele teve um insight: poderia fazer algo parecido, abrir seu próprio negócio e usar a tecnologia para mudar, ou quem sabe revolucionar, uma atividade tradicional.

Foram suas conexões pessoais e seu faro de empreendedor que o trouxeram ao Brasil: “Eu já estava há 12 anos no mercado corporativo, trabalhando com bancos e serviços financeiros nos Estados Unidos, onde eu via um mercado competitivo, margens estreitas e muita concorrência. Com a influência da Silvia [Filgueiras, sua esposa brasileira], mergulhei no mercado brasileiro e vi que era muito diferente do americano: havia muita margem, era muito ineficiente e com pouca concorrência. E o empreendedorismo é enxergar essas oportunidades”, conta Furio a Época NEGÓCIOS.

Essas ineficiências envolviam o modelo engessado de atuação dos bancos e as altíssimas taxas cobradas por eles na concessão de crédito. Por que, então, não aproximar consumidores dessas instituições e reduzir o custo da operação? Só o que faltava para isso, o espanhol notou, era um intermediário que fizesse bom uso da tecnologia. “O modelo no início era ter um jeito fácil para os bancos interagirem com as pessoas, reduzindo os custos operacionais para eles”, descreve o empresário.

Box Creditas — Foto: Arte/Clayton Rodrigues
Box Creditas — Foto: Arte/Clayton Rodrigues

Foi esse papel que a Creditas assumiu até 2016 – o que Sergio Furio chama de “fase 1” da empresa. Mas isso seria apenas uma pequena parte do que a startup alcançaria nas fases seguintes.

Primeiras aquisições e investimentos recebidos pela Creditas

Já em 2013, apenas um ano após sua criação, a Creditas fez sua primeira aquisição: a Grana Aqui, empresa que prestava serviço semelhante, deu à companhia de Sergio Furio um aumento em escala.

O bom desempenho inicial credenciou a Creditas a seus primeiros aportes: também em 2013, a empresa levantou R$ 3 milhões em sua rodada de investimento seed, divididos entre Rockaway Capital e Napkn Ventures.

Foi ainda nessa época em que a Creditas começou a explorar o modelo de negócio que viria a ser sua marca registrada: passou a indicar para os bancos clientes de crédito com garantia de imóvel, em 2013, e com garantia de automóvel, em 2014.

A solução se mostrou promissora e a Creditas, em crescimento contínuo, ganhou visibilidade em 2015 com nova rodada de investimentos, dessa vez em valor bem maior: R$ 25 milhões de fundos importantes como Redpoint eVentures, Quona Capital e QED Investors. A rodada foi completada em março de 2016 por Kaszek Ventures.

Mas, mesmo assim, esse período foi de insegurança para Sergio Furio. Afinal, ainda se via pouca inovação por aqui e a Creditas era um ator estranho num mercado consolidado há bastante tempo. “O tempo todo pensava que podia dar errado. Na verdade, só em poucos dias eu achava que daria certo. Na época, parecia que se o negócio não desse certo, o empreendedor não poderia fazer mais nada na vida”, comentou em entrevista anterior a NEGÓCIOS.

Mudança de nome e de modelo: o crescimento da Creditas

Podia dar errado? Sim, mas estava dando certo. E, em 2016, Sergio Furio viu que poderia fazer mais do que um marketplace para comparação de empréstimos. Tendências digitais e perfis de crédito no país mostraram a ele que, mesmo com enormes bancos competindo pelo bolso do consumidor, havia poucas opções no mercado que fossem mais vantajosas para o público.

“Percebemos que os consumidores usavam cada vez mais o celular, e ele iria substituir aos poucos as agências bancárias, com plataformas mais baratas. E também que, comparando com EUA e Europa, os clientes daqui tomavam dívidas muito caras, com taxas de 150% ao ano, e não usavam os ativos deles como garantia”, explica.

Ele decidiu dar um grande passo adiante: oferecer os próprios empréstimos, que poderiam ser mantidos a taxas de juros mais baixas com o uso das garantias de imóveis e automóveis. Os recursos eram obtidos junto a parceiros interessados em investimentos de renda fixa com baixo risco.

Para o consumidor, o benefício ficava evidente: o rotativo do cartão de crédito cobra 14,06% ao mês; os empréstimos pessoais, em média, 6,47%; os empréstimos com imóvel como garantia, 1,09% ao mês.

A BankFácil, então, mudou de perfil e de nome: em 2017, enfim se transformou em Creditas. Começava a “fase 2” da empresa, e com mais boas notícias: uma rodada série B injetou mais US$ 19 milhões na companhia, liderada por Prosus & Naspers e International Finance Corporation, braço do Banco Mundial. E, em resultados, a Creditas chegava ao seu primeiro milhão em solicitações de crédito, e aos R$ 500 milhões emprestados a clientes em 2018.

Nesse ponto, as fintechs já eram players importantes no mercado financeiro do Brasil, e Furio e sua empresa sofriam menos resistência dos atores tradicionais. Com tamanho o suficiente para fazer apostas mais ousadas, era hora de iniciar a fase 3.

Chegada do SoftBank: a Creditas vira unicórnio

“Em 2019, já tínhamos mais de 300 pessoas no time e uma receita com mais tração. Vivemos então uma fase de hipercrescimento, com um modelo de negócio estabelecido. O mundo demonstrava um interesse muito grande em fintechs e investimentos no Brasil, e aproveitamos isso para turbinar nosso crescimento.”

Naquele ano, a Creditas receberia seu maior investimento até então: uma rodada de US$ 231 milhões liderada pelo SoftBank Vision Fund, fundo do conglomerado japonês para a América Latina. Com o caixa cheio, a companhia investiu em aquisições na expansão dos serviços: comprando a Creditoo, incluiu o crédito consignado. Nos anos seguintes, também por meio de aquisições de empresas como Bcredi, Volanty e Minuto Seguros, incorporou seguros, benefícios corporativos e intermediação de venda de imóveis.

Com isso, a Creditas decolou de vez. Uma nova rodada de US$ 255 milhões em dezembro de 2020 foi liderada por LGT Lightstone, com participação de Tarsadia Capital, Wellington Management, Redpoint e.Ventures e Sunley House Capital, além de outros investidores que já apostavam na companhia.

Nesse momento, o valuation de US$ 1,75 bilhão confirmou: a Creditas era o novo unicórnio brasileiro. “Ser unicórnio não era um objetivo específico, mas percebemos que poderíamos chegar lá ao ver que havia capital disponível que nos permitia crescer de forma acelerada. Era capital em excesso e um retorno de juros muito baixo. Graças a essa aposta, hoje conseguimos ser rentáveis e grandes”, lembra Furio.

Nesse boom de crescimento acelerado, a Creditas passou de uma receita de R$ 100 milhões, em 2019, para um valor próximo a R$ 2 bilhões, em 2022.

Os dias atuais: crescimento sustentado e a busca pelo lucro

Após aproveitar da melhor forma possível o capital que estava disponível, a Creditas se viu em um ambiente econômico mais incerto, com as taxas de juros lá no alto e investidores mais retraídos. Mas, quando chegou esse “inverno das startups” em 2022, a empresa já estava firme em seu mercado, capitalizada e com robustez o suficiente para passar sem grandes problemas por esse período.

Assim, a “fase 4” da empresa se tornou um período de consolidação e busca por algo que ainda não havia surgido durante os anos de pesados investimentos em expansão: o lucro.

“Fizemos uma reflexão sobre a mudança no mercado e vimos que precisávamos ajustar nossas prioridades, colocando sustentabilidade na frente do crescimento. Desenhamos um plano em que o crescimento podia ficar estável, desde que a empresa fosse rentável”, explica o CEO.

A julgar pelo seu recente balanço do terceiro trimestre de 2023, a Creditas está próxima a alcançar esse objetivo: “A expansão do nosso lucro bruto, associada às melhorias contínuas nos custos, nos mantém no caminho certo para reduzir as perdas líquidas e alcançar a rentabilidade operacional até o final do ano”, diz o documento, que mostra progressos: o prejuízo líquido caiu de R$ 252 milhões no terceiro de trimestre de 2022 para R$ 81 milhões no mesmo período deste ano.

Planos para o futuro

Com um modelo estabelecido e buscando ser cada vez mais sustentável, a Creditas não se sente ameaçada por uma realidade mais dura, com bancos digitais saindo do país. Depois de passar por um período em que achava que tudo poderia dar errado, e por outro de euforia, ao receber mais de US$ 1 bilhão em investimentos somados, Sergio Furio tem na palavra “equilíbrio” a chave para o futuro da companhia.

Creditas ganhou robustez e virou hub de serviços que incluem seguro, venda de imóveis e benefícios corporativos — Foto: Getty Images
Creditas ganhou robustez e virou hub de serviços que incluem seguro, venda de imóveis e benefícios corporativos — Foto: Getty Images

“A gente se acostumou com um ambiente em que a meta era triplicar de tamanho a cada ano. Mas isso não se sustenta num período grande. A Amazon cresceu por 20 anos a 25% ao ano, e penso que é assim que se cria uma empresa enorme: com paciência, funding e sabendo navegar nos diferentes ciclos”, aponta.

Furio não descarta um IPO no futuro próximo. “Simpatizamos com essa ideia, faz sentido para nós. O mercado público procura tamanho relevante, taxa de crescimento relevante e empresas rentáveis. Estamos trabalhando para entrar nessa equação, mas sem pressa”, diz o empresário espanhol.

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