Em meio a uma onda de pessoas usando medicamentos como Ozempic e Wegovy para a perda de peso, diversos relatos de gravidez surgiram e apontaram para um possível efeito colateral: o aumento da fertilidade. Nas redes sociais, mulheres falavam sobre os “bebês Ozempic” -- algumas diziam ter engravidado enquanto tomavam a pílula anticoncepcional e outras, mesmo tendo sido diagnosticadas como inférteis anteriormente.
Agora, os cientistas levantam várias hipóteses sobre por que essas drogas, que fazem parte de um grupo conhecido como "GLP-1", poderiam aumentar a fertilidade -- mas o mecanismo exato ainda está sendo estudado. “Estamos numa zona livre de dados quando se trata de GLP-1, fertilidade e gravidez”, diz Beverly Tchang, endocrinologista da Weill Cornell Medicine, à revista Nature.
Segundo um porta-voz da Novo Nordisk, fabricante do Ozempic e do Wegovy, eles não testaram o princípio ativo, a semaglutida, em grávidas ou indivíduos que pretendiam gerar um filho. No entanto, como “há dados limitados de ensaios clínicos com o uso de semaglutida em grávidas”, a empresa recomenda interromper o uso dois meses antes da gravidez, para evitar expor o feto a possíveis efeitos.
Uma das hipóteses estudada é que a perda de peso pode restaurar a ovulação regular em algumas mulheres, já que pessoas com sobrepeso e obesas frequentemente apresentam interrupções no ciclo menstrual causadas por desequilíbrios hormonais ou inflamações. “O sistema reprodutor feminino é muito sensível e responde à saúde metabólica, ao equilíbrio energético e à nutrição”, destacou Nicole Templeman, bióloga celular da Universidade de Victoria, no Canadá, à Nature.
No caso de quem usa métodos anticoncepcionais, um porta-voz da Eli Lilly, fabricante do Mounjaro, disse que a empresa estudou as interações medicamentosas como parte do processo padrão de aprovação da Food and Drug Administration (FDA) dos EUA e descobriu que o príncipio ativo, a tirzepatida, altera a forma como os contraceptivos orais são absorvidos, diminuindo sua eficácia e concentração em 66% no sangue.
“Então, mais da metade desapareceu, o que é um grande problema”, disse Jessica Skelley, farmacologista da Universidade Samford. Os contraceptivos orais dependem da concentração: “Se não houver quantidade suficiente no corpo, não podem proporcionar benefícios contraceptivos eficazes”, acrescentou.
Já a "semaglutida" pareceu afetar a concentração da contracepção hormonal de forma menos acentuada do que a tirzepatida, mas ainda pode ser um problema, visto que os dois medicamentos atuam de forma semelhante.
Além disso, já se sabe que o "GLP-1" tem efeitos em outros sistemas fisiológicos. Em 2015, um estudo em ratas descobriu que seu uso estimulou a produção da hormônio luteinizante (LH) 2 , que desencadearia na ovulação em animais e humanos. “Temos certeza de que os análogos do receptor GLP-1 promovem a fertilidade porque são capazes de aumentar o pico de LH pré-ovulatório”, disse Federico Mallo, endocrinologista da Universidade de Vigo, na pesquisa.
Quanto a mais dados sobre o efeito dos medicamentos GLP-1 na fertilidade, Alyse Goldberg, endocrinologista e especialista em fertilidade da Universidade de Toronto, no Canadá, diz: “Estamos todos esperando com a respiração suspensa”.