• 17/02/2021
  • Luiza Queiroz | Fotos: Divulgação
Atualizado em
Projeto pioneiro no Brasil certifica reformas residenciais sustentáveis  (Foto: EVELYN MULLER / Divulgação)

Projeto da arquiteta e proprietária Tânia Trajano, em coautoria com o escritório Oliveira Cotta, para sua casa em Campinas, SP.  O décor da área social, lavabo, cozinha e área gourmet é de Cristiana Nassralla Interiores. Engenharia por Angela Macke. A construção recebeu certificação do Green Building Council Brasil (Foto: EVELYN MULLER / Divulgação)

Não é de hoje que o mercado da arquitetura e construção entende a necessidade de pensar em maneiras de tornar um empreendimento mais sustentável. Desde 1993, com a criação da Certificação LEED — sistema internacional usado em mais de 160 países que orienta e classifica edifícios com base em critérios de preservação ambiental — conceitos como pegada de carbono e menor produção de resíduos em uma obra passaram a se tornar ainda mais rotineiros para os profissionais que iniciam uma nova construção. No Brasil, a LEED é emitida pelo Green Building Council Brasil (GBC Brasil), que acaba de lançar uma proposta interessante: e se existisse um sistema semelhante para certificar reformas residenciais, incluindo as de pequeno e médio porte? A resposta para a pergunta se concretizou na Certificação LIFE, que está sendo lançada no Brasil em fevereiro de 2021. “A ideia é que essa certificação seja uma consequência. Ninguém vai fazer [uma reforma sustentável] só para ter certificado, as pessoas vão fazer isso para diminuir gastos e ter mais qualidade de vida”, explica Raul Penteado, Presidente do Conselho de Administração do Green Building Council Brasil.

"Sustentabilidade é uma palavra bonita, mas precisamos materializá-la para as pessoas""

Raul Penteado, Presidente do Conselho de Administração do Green Building Council Brasilr

Funciona assim: quando um arquiteto ou designer de interiores iniciar um novo projeto de reforma residencial, a ideia é que o profissional proponha soluções que visem, ao mesmo tempo, mais conforto e bem-estar ao cliente e que geram um menor impacto ambiental. Penteado ressalta que, para isso, não é preciso fazer nenhum grande quebra-quebra. Soluções mais simples, como optar por um modelo de eletrodoméstico que consome menos energia, já contam. Boas ideias de layout, como ampliar uma janela para trazer mais iluminação natural e reduzir o consumo de energia elétrica, também valem. A partir destas escolhas, o projeto de reforma vai acumulando pontos (de acordo com a escala estabelecida pelo GBC Brasil) e o arquiteto ou designer pode submetê-lo para obter a Certificação LIFE. Para conceder o “selo de qualidade”, o GBC analisará seis pilares principais: saúde e bem-estar; conforto; qualidade interna do ar; materiais escolhidos; responsabilidade social; e uso eficiente de recursos naturais.

Após enviar a documentação necessária — que inclui desenhos, plantas da obra, fotografias e eventualmente notas fiscais — o profissional receberá o anúncio da conclusão da Certificação com a pontuação obtida, juntamente com o certificado em PDF. Tudo isso é feito online. A taxa a ser paga para obtenção do certificado depende da metragem: para apartamentos de até 100 m² e casas de até 300 m², o valor cobrado é de R$ 1.000. A taxa máxima é de R$ 3.000. Penteado frisa que o valor é considerado simbólico, já que o GBC não possui quaisquer fins lucrativos. Com o certificado, o arquiteto ou designer terá seu trabalho valorizado pelo cliente, que, por sua vez, terá benefícios em sua qualidade de vida e redução de gastos com energia, por exemplo — além de valorização do imóvel em caso de venda ou aluguel.

Projeto pioneiro no Brasil certifica reformas residenciais sustentáveis  (Foto: EVELYN MULLER / Divulgação)

Projeto da arquiteta e proprietária Tânia Trajano, em coautoria com o escritório Oliveira Cotta, para sua casa em Campinas, SP.  O décor da área social, lavabo, cozinha e área gourmet é de Cristiana Nassralla Interiores. Engenharia por Angela Macke. A construção recebeu certificação do Green Building Council Brasil (Foto: EVELYN MULLER / Divulgação)

Mas o objetivo principal de todo esse processo é mais ambicioso: fazer com que as discussões a respeito de construções sustentáveis cheguem, efetivamente, ao consumidor final. “Em geral, uma certificação é feita por técnicos, e o usuário [daquele espaço] pouco sabe disso. Então por isso procuramos trazer a pessoa que mais interfere no morar, que é o arquiteto, para o centro desse processo. Ao invés de contratar uma empresa externa para fazer essa certificação, quem fará esse processo é o arquiteto ou designer. Isso valoriza o profissional do ramo, melhora a qualidade de vida dos clientes, e é também uma forma de tentar fazer com que as pessoas tomem conhecimento e passem a divulgar esses conceitos”, explica Penteado.

Desta forma, o GBC Brasil espera também desconstruir a ideia de que reformas sustentáveis são um conceito voltado apenas a imóveis de alto padrão. "Economizar água e energia é mais importante em uma casa simples do que em uma mansão”, pontua Raul.  Segundo o presidente do Conselho do GBC Brasil, a organização — que mantém outros projetos voltados especificamente à certificação de habitações de interesse social — tem atuado também junto a incorporadoras e construtoras para a divulgação da Certificação LIFE, e a expectativa é a de que, à medida em o certificado se torne mais conhecido, as próprias empresas do ramo passem a divulgar e explicar os conceitos a clientes no momento da compra ou aluguel de um imóvel.

Projeto pioneiro no Brasil certifica reformas residenciais sustentáveis  (Foto: EVELYN MULLER / Divulgação)

Projeto da arquiteta e proprietária Tânia Trajano, em coautoria com o escritório Oliveira Cotta, para sua casa em Campinas, SP.  O décor da área social, lavabo, cozinha e área gourmet é de Cristiana Nassralla Interiores. Engenharia por Angela Macke. A construção recebeu certificação do Green Building Council Brasil (Foto: EVELYN MULLER / Divulgação)

Ex-diretor da fabricante Deca, Penteado assumiu a Presidência do GBC Brasil em 2020, justamente quando o mundo inteiro estabelecia uma nova relação com seus lares em meio à pandemia do novo coronavírus. “Acho que o mundo está cada vez mais consciente dessa necessidade [de um futuro sustentável], e isso é algo que já vinha crescendo. Mas em 2020 as pessoas perceberam que precisamos acelerar esse processo”, afirma. “[Nesse sentido] estamos sendo pioneiros. Eu me arrisco a dizer que essa é a primeira certificação de interiores sustentáveis do mundo”. Segundo Penteado, outros braços europeus do GBC já estão em contato com a organização brasileira para tentarem implantar uma proposta semelhante.

Sustentabilidade é uma palavra bonita, mas precisamos materializá-la para as pessoas, e acredito que devemos fazer mostrando o lado bom das coisas. [Porque afinal] a sustentabilidade traz vantagens”, resume Penteado. “Hoje em dia, grandes empresas nem consideram alugar um prédio que não tenha certificação ambiental. Então não é só uma questão de valorização comercial, é uma questão de que, se não tiver [o certificado], muitas vezes você nem entra no jogo. Tomara que a gente chegue lá um dia com relação a projetos de interiores também”, espera.