• 25/01/2017
  • Por Giovanna Maradei
Atualizado em
Arquitetos e Urbanistas contam o que deixaria São Paulo (realmente) linda (Foto: Tuca Reinés)

No dia 1º de janeiro, a gestão de João Doria, prefeito de São Paulo, foi às ruas colocar em ação o projeto de zeladoria urbana batizado de "Cidade Linda". O objetivo? Embelezar o município por meio de uma série de ações que vão desde reparos básicos, como manutenção de iluminação pública e pavimentação de vias, até intervenções mais polêmicas, como a limpeza de pichações.

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Em meio a ações que incluem o prefeito indo às ruas vestido de gari e manifestações contra e à favor das pichações, dos grafites e da tinta cinza usada para "limpar" os muros paulistanos, uma pergunta permanece sem resposta: afinal, o que é uma cidade linda?

Arquitetos e Urbanistas contam o que deixaria São Paulo (realmente) linda (Foto: Reprodução)

Prefeito João Doria cobre pichação com tinha cinza na Av. 23 de Maio, em São Paulo



Casa Vogue conversou com arquitetos e urbanistas dispostos a responder esta que parece ser a questão crucial da nova iniciativa. Através de seus diferentes olhares, eles revelam suas opiniões a seguir.

Arquitetos e Urbanistas contam o que deixaria São Paulo (realmente) linda (Foto: Tuca Reinés)

Mauro Calliari, urbanista e autor do livro "Espaço Público e Urbanidade em São Paulo" (BEI Editora)

O que você faria para deixar São Paulo mais linda? "Uma cidade linda é aquela que valoriza o andar. Seria interessante criar pequenas praças e espaços de permanência para que caminhar se tornasse mais agradável. Também poderíamos definir rotas entre patrimônios que contam a história da cidade, aumentando o fluxo de pessoas entre eles e valorizando o espaço. Preservar mirantes é outro ponto importante que pode mudar nosso olhar sobre a cidade - vejo como uma questão pública que hoje não se possa mais subir no mirante do Banespa, por exemplo". 

E quanto à limpeza dos muros da cidade? "A expressão de uma pessoa não precisa se sobrepor à vontade de muitas outras, mas no caso do grafite é possível estabelecer acordos, as pessoas muitas vezes gostam dele. Uma parede cinza, toda igual, como está sendo feita, não é horrorosa, mas uma com arte, toda colorida, é muito mais bonita. Existem vários espaços vazios na cidade para o grafite, não é preciso um grafitódromo. É mais interessante espalhar a arte e criar surpresas pelos caminhos."

Arquitetos e Urbanistas contam o que deixaria São Paulo (realmente) linda (Foto: Tuca Reinés)

Gilberto Belleza, arquiteto e presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Estado de São Paulo

O que você faria para deixar São Paulo mais linda? "Existe uma frase que diz: 'a felicidade de um povo pode ser medida pela beleza de sua cidade' e não existe gente alegre em uma cidade feia. Neste sentido, em São Paulo, o ponto crucial a ser cuidado é a sujeira. As calçadas, os prédios, a cidade toda está muito suja. É preciso mais lixeiras, recuperação das calçadas, lavar alguns espaços - incluindo monumentos históricos".

E quanto à limpeza dos muros da cidade? "O grafite é interessante para cidade, a questão é quando ele não tem caráter artístico, quando ele está lá apenas como uma forma de marcar um território e acaba danificando a paisagem. É preciso combater e educar a população de que não se pode pichar monumentos públicos."

Arquitetos e Urbanistas contam o que deixaria São Paulo (realmente) linda (Foto: Divulgação)

Nadia Somekh, arquiteta e professora da faculdade de arquitetura e urbanismo do Mackenzie

O que você faria para deixar São Paulo mais linda? "O projeto Cidade Linda é o feijão com arroz que a cidade precisa. Agora, para ela ficar realmente atraente precisamos de arquitetos projetando edifícios que construam a cidade. Houve uma involução do papel dos profissionais na construção da município. Temos edifícios que o mundo todo vem ver, mas são dos anos de 70 e 80. O Copan, o Conjunto Nacional e o Edifício Louveira são bons exemplos de construções voltadas para a cidade, para a integração dos espaços, mas hoje vemos uma multiplicação dos condomínio fechados".

E quanto à limpeza dos muros da cidade? "Primeiro, precisamos diferenciar: pichação é uma intervenção de um grupo que se sente excluído pela sociedade. Já o grafite é uma nova forma que, como arte, também é uma transgressão. Por fim, existe a arte urbana, que é autorizada. Uma transgressão é autoritária, você está obrigando alguém a conviver com a sua intervenção, mas o que o Doria está fazendo é tão autoritário quanto. É preciso dialogar e dar espaço para o grafite e para a arte urbana. Não é todo mundo que vai gostar, não existe um consenso sobre uma obra de arte. Mas, enfim, uma cidade cinza não tem nada de linda."

Arquitetos e Urbanistas contam o que deixaria São Paulo (realmente) linda (Foto: Tuca Reinés)

Silvio Oksman, arquiteto sócio do Metrópole Arquitetos e Conselheiro do Conpresp (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo)

O que você faria para deixar São Paulo mais linda? "Cidade feia é aquela sem gente. Quanto mais gente nos espaços públicos, mais belo fica. É uma pena que a cidade ainda tenha tanto muro e tanta grade, tantos shoppings... Paredes não deixaram ela mais segura. Um município seguro, na verdade, tem mais gente circulando. Pense no centro de São Paulo, por exemplo: na Praça da Republica, você se sente mais seguro do que andando à noite no Morumbi, onde não tem mais ninguém na rua. O que a deixaria mais linda seria isso: diminuir as grades e muros".

E quanto à limpeza dos muros da cidade? "A ação do prefeito está tratando esta manifestação apenas como algo "feio" ou "bonito", quando, na verdade [ao apagar], ele está calando pessoas que se sentem excluídas pela sociedade. Tanto o grafite quanto a pichação têm que ser entendidos na essência, como forma de manifestação. Eu posso dizer se eu gosto ou não, mas não importa. Um prefeito pode ditar o que vai ser visto no espaço público? Essa é a principal questão, muito mais do que dizer se é bonito ou não, se é colorido ou cinza."

Arquitetos e Urbanistas contam o que deixaria São Paulo (realmente) linda (Foto: Tuca Reinés)

Tomas Alvim e Marisa Moreira Salles, fundadores das plataformas de conteúdo Arq.Futuro

O que você faria para deixar São Paulo mais linda? "Grande parte dos nossos rios são subterrâneos ou imundos e abertos, o que reflete um problema estético e urbanístico. Ao ter água por perto, algo tão essencial, nos conectamos melhor com o território. Por isso, entendemos rios e corregos como espaços públicos que podem transformar a cidade, se bem tratados. Em São Paulo, existem ao menos três rios (Pinheiros, Tietê e Tamanduateí) que poderiam ser transformados em parques lineares caso fossem recuperados - e aí sim teríamos uma capital linda".

E quanto à limpeza dos muros da cidade? "É muito importante tirar a sujeira para mostrar que o espaço tem dono, que é de todos. Haver um local específico para o street art, por exemplo, faz todo o sentido e é uma tendência no mundo. O espaço público une várias pessoas, várias tribos, com diferentes gostos estéticos e é preciso respeitar a todos eles, sua diversidade, e estar aberto a outras manifestações."