Testes

Por Ulisses Cavalcante

O BMW iX5 Hydrogen que ilustra esta página não passa de um ator. O papel dele é demonstrar, na prática, uma tecnologia ainda desconhecida e que tem poucas chances de “sair do papel” a curto prazo. Ele é totalmente funcional e não apresenta indícios de adaptação (como ocorre num carro a GNV), como se fosse um protótipo ainda em fase de desenvolvimento.

Como embaixador dessa tecnologia, o iX5 proporciona a experiência de utilizar um veículo elétrico movido a hidrogênio e traz aos seus usuários a sensação de que não será necessário mudar rotinas para migrar da gasolina para uma solução de mobilidade limpa.

Em outras palavras, esse SUV conceitual é um exemplo do que acontece quando uma corporação multimilionária financia um projeto de ciências. Só que esse trabalho, por ora, não tem clientes no radar.

BMW iX5 é embaixador na tecnologia de motores movidos à hidrogênio  — Foto: Divulgação
BMW iX5 é embaixador na tecnologia de motores movidos à hidrogênio — Foto: Divulgação

Desde o começo do ano, a BMW colocou o iX5 a hidrogênio para rodar em eventos e ambientes controlados para demonstrar a novidade. E também na rua, como um carro de produção comum. Foi em uma dessas oportunidades que Autoesporte fez este test drive.

Não estranhe o fato de o protótipo mostrar um descompasso visual com o X5 atual (o G05), que já passou por uma atualização de estilo. O iX5 foi construído sobre a base do X5 M Competition pré-facelift, mas com alguns elementos exclusivos. Como o objetivo da BMW é fazer uma apresentação da tecnologia, vamos deixar de lado a questão do design.

Na prática, um carro movido a hidrogênio funciona como um veículo elétrico qualquer. Porém, em vez de se alimentar da energia proveniente de baterias, utiliza o gás armazenado em tanques instalados sob o assoalho. No caso do iX5, são dois. Um deles é colocado longitudinalmente no centro do monobloco; o outro, transversalmente, sob os bancos traseiros.

Tanques do BMW iX5 são instalados sob o assoalho do veículo  — Foto: Divulgação
Tanques do BMW iX5 são instalados sob o assoalho do veículo — Foto: Divulgação

Combinados, esses tanques comportam 6 kg de hidrogênio, o suficiente para rodar 500 km, considerando o ciclo europeu. Na parte interna, não senti impacto no espaço para os ocupantes, senão pela impressão de que o assoalho está mais alto — como uma versão elétrica de carros com motor ICE.

Na dianteira do carro, sob o capô, onde tradicionalmente seria instalado um motor a combustão, fica o sistema de conversão de células de combustível. Esse gerador é um dispositivo eletroquímico que utiliza o hidrogênio dos tanques e o oxigênio do ambiente para gerar eletricidade. O hidrogênio é dividido em prótons e elétrons. Esses prótons passam por uma membrana eletrolítica, enquanto os elétrons seguem por outro caminho, formando uma corrente elétrica que é aproveitada pelo motor e pelas baterias de lítio localizadas na parte traseira do veículo.

 O carro a hidrogênio não requer manutenção no conversor, no motor elétrico nem nos tanques, cuja garantia poderia chegar a 15 anos — Foto: Divulgação
O carro a hidrogênio não requer manutenção no conversor, no motor elétrico nem nos tanques, cuja garantia poderia chegar a 15 anos — Foto: Divulgação

O resultado dessa reação é água pura, sem minerais, que sai da parte de baixo da carroceria. Durante a avaliação, o carro ficou ligado para a gravação e realmente havia água pingando na traseira — fenômeno semelhante ao dos aparelhos de ar-condicionado veiculares.

Apenas a célula de combustível gera 125 kW, mas ela opera praticamente o tempo todo, enquanto o carro está ligado. A energia gerada nesse equipamento alimenta um acumulador que garante outros 170 kW. Somados, chegam aos 400 cavalos de potência que a BMW anuncia.

O caminho do gás no BMW iX5 Hydrogen  — Foto: Autoesporte
O caminho do gás no BMW iX5 Hydrogen — Foto: Autoesporte

Ao volante, o comportamento dinâmico do iX5 é semelhante ao das versões esportivas da linha X5. Não chega a ser o desempenho de um M, mas não desagrada. São acelerações vigorosas por causa do torque instantâneo, com as mesmas qualidades dinâmicas dos modelos tradicionais. Isso inclui o silêncio de rodagem, como todo bom carro elétrico. Na prática, o desempenho proporcionado pelo hidrogênio é equivalente ao que já está atualmente no mercado, na linha iX, utilizando exclusivamente baterias de lítio.

Dr. Jürgen Guldner, gerente-geral da tecnologia a hidrogênio da BMW, argumenta a favor do gás, alegando que carros elétricos a bateria (BEVs) não atendem a todas as necessidades dos usuários. Ele tem razão. Segundo o engenheiro, os veículos movidos a hidrogênio são uma opção mais abrangente de mobilidade limpa, pois proporcionam uma energia limpa sem as desvantagens limitantes das baterias.

Por dentro, nenhuma diferença física do iX5 em relação aos X5  a combustão. Ao volante, desempenho do SUV não desagrada — Foto: Divulgação
Por dentro, nenhuma diferença física do iX5 em relação aos X5 a combustão. Ao volante, desempenho do SUV não desagrada — Foto: Divulgação

A vantagem mais óbvia dos tanques de gás é o reabastecimento rápido — algo entre 3 e 4 minutos, considerando esse SUV experimental. Ainda sobre o hidrogênio, Guldner ressalta a possibilidade de aproveitar a estrutura já existente do GNV, combustível utilizado para transporte em diversos países (como no Brasil). Haveria a necessidade de adaptação nos conectores dos postos e nas bombas de pressão (os tanques da BMW funcionam a 700 bar), porém os tanques de armazenamento e toda a rede de distribuição seriam os mesmos.

O projeto da BMW prevê, por ora, apenas um motor elétrico com tração traseira, mas um tanque com durabilidade estimada em 15 anos. Esse poderia, inclusive, ser o tempo de garantia previsto para o equipamento. O prazo é praticamente o dobro do que os fabricantes estão fornecendo atualmente para acumuladores (cerca de oito anos).

Em suas demonstrações práticas, a BMW utiliza uma estação móvel de recarga, já que não é possível contar com uma estrutura instalada, tampouco com a disponibilidade do hidrogênio. No Brasil, seria possível contar com parte da infraestrutura atualmente utilizada para o GNV. — Foto: Divulgação
Em suas demonstrações práticas, a BMW utiliza uma estação móvel de recarga, já que não é possível contar com uma estrutura instalada, tampouco com a disponibilidade do hidrogênio. No Brasil, seria possível contar com parte da infraestrutura atualmente utilizada para o GNV. — Foto: Divulgação

Carros com células de combustível permitem que pessoas que viajam com frequência possam adotar a eletrificação, já que o reabastecimento é rápido como o de um veículo a gasolina, e não incorreria na falta de infraestrutura que acomete os BEVs.

Em regiões frias, a autonomia dos BEVs cai significativamente, o que não acontece com um carro a hidrogênio. Essa situação também atinge pessoas que usam reboques. O peso extra penaliza a carga das baterias, um problema inexistente para os FCEVs (Fuel Cell Electric Vehicles).

BMW iX5 Hydrogen - O bocal de recarga é de alta pressão e seria uma das poucas adaptações para se usar a infraestrutura instalada para GNV — esse bico é padronizado — Foto: Divulgação
BMW iX5 Hydrogen - O bocal de recarga é de alta pressão e seria uma das poucas adaptações para se usar a infraestrutura instalada para GNV — esse bico é padronizado — Foto: Divulgação

Contudo, o desafio do hidrogênio reside na produção do gás, um processo que consome bastante energia, incluindo uma perda significativa em toda a cadeia. Sua viabilidade depende da origem dessa energia, requerendo o aproveitamento de excedentes para ser sustentável. Em outras palavras, a fonte de energia para a produção do hidrogênio é essencial para garantir sua eficiência ambiental.

Seria necessário considerar a produção em épocas do ano ou em regiões com excedente de produção elétrica (e limpa) e aproveitar a energia que hoje é descartada.

Desafio para os carros movidos a hidrogênio segue sendo a produção do gás — Foto: Divulgação
Desafio para os carros movidos a hidrogênio segue sendo a produção do gás — Foto: Divulgação

Outro desafio a superar é o custo do quilo do hidrogênio. Atualmente, na Europa, está em cerca de 11 euros, valor que deve cair para algo entre 4 e 7 euros até 2030. A 5 euros por quilo, o hidrogênio já passa a oferecer um custo por quilômetro rodado equivalente ao de hoje (2023) para circular com gasolina. A vantagem, no caso, seria a emissão zero de poluentes. Por ora, não há planos de a BMW começar a produzir o iX5 Hydrogen ou outro modelo. Segundo a marca, essa solução ainda não está pronta. O hidrogênio está longe de ser vantajoso o ano todo. A gasolina, gostemos ou não, ainda não tem um substituto que proporcione a mesma versatilidade.

BMW iX5 Hydrogen

Ficha técnica
Motor: Elétrico, síncrono, linha iX
Potência: 400 cv (potência combinada): 170 cv (célula); 230 cv (baterias)
Torque: Não divulgado
Câmbio: Uma marcha, tração traseira
Direção: Elétrica
Suspensão: McPherson (diant.) e multilink (tras.)
Freios: A disco na dianteira e na traseira, ventilados
Pneus: 275/35 R22
Tanque hidrogênio: 6 kg; pressão: 700 bar
Alcance: 504 km (ciclo europeu)
Peso: 2.500 kg (aproximado)
DIMENSÕES
Compr.: 4,9 metros
Largura: 2 m
Altura: 1,75 m
Entre-eixos: 2,98 m

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