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Erros em 'Nos tempos do Imperador'

Patrícia Kogut

Michel Gomes e Gabriela Medvedovski como Samuel e Pilar em 'Nos tempos do Imperador' (Foto: Globo)Michel Gomes e Gabriela Medvedovski como Samuel e Pilar em 'Nos tempos do Imperador' (Foto: Globo)

 

“Nos tempos do Imperador” se passa no século XIX. O Brasil vivia uma monarquia e a escravidão estava em vigor. No primeiro capítulo, acompanhamos a aventura do encontro da mocinha, Pilar (Gabriela Medvedovski), com o mocinho, Jorge (Michel Gomes). Ambos estavam em fuga, mas por razões diversas. Ela queria escapar da tirania do pai fazendeiro, que a prometeu em casamento. Sonha ser médica, uma atividade àquela altura proibida para as mulheres. Ele era escravo numa fazenda vizinha. As cenas iniciais mostraram uma revolta comandada por malês. Era noite, houve confusão, fogo, tiros etc. O Coronel Ambrósio (Roberto Bonfim) levou um tiro e morreu. O responsável pelo crime foi o feitor, mas ele culpou Jorge, que conseguiu fugir e foi acolhido pela Condessa de Barral (Mariana Ximenes). Rebatizado de Samuel, seguiu com ela para o Rio. Na capital, reencontrou Pilar. Eles, então, engrenaram um namoro.

Desde a estreia, o casal passeia pelas ruas da cidade sem que jamais a questão do racismo se apresente. O grande dilema que atrapalha a vida dos dois é o fato de ela não conseguir ingressar na universidade. As forças que certamente atrapalhariam — para não dizer impediriam — o relacionamento de um negro com uma branca em 1856 foram simplesmente apagadas da trama. O incômodo que o espectador vinha sentindo com esse retrato para lá de inexato se aprofundou no capítulo do último sábado. Foi quando Pilar e Samuel conversaram sobre a possibilidade de ela morar com ele na Pequena África. A conversa derivou para o preconceito que ela poderia sofrer por ser branca. O público se revoltou nas redes sociais. Com toda razão. Thereza Falcão, coautora com Alessandro Marson, se desculpou pelo que chamou de “erro grosseiro”. A cena foi mesmo chocante. Alguém faltou às aulas de História.

A autora escreveu nas redes: “Foi péssimo. Pedimos muitas desculpas. Eu mesma, quando vi a cena aqui em casa, falei: ‘O que foi isso?’. Todos os capítulos que vão ao ar até o dia 24 foram escritos em 2018. Não contávamos com uma assessoria especializada, o que só aconteceu no ano passado, com a entrada do Nei Lopes”. Mas aí levanto outra questão. Por causa da pandemia, a novela foi gravada com antecedência. Isso significa que, a essa altura, há muitas cenas prontas. Os trabalhos em estúdio estão previstos para terminar em outubro. E esse é o jovem casal protagonista. Será possível corrigir? As novelas sempre foram, por excelência, obras abertas e sujeitas a mudanças durante o voo. Se isso estivesse acontecendo com “Nos tempos do Imperador”, os ajustes seriam imediatos e mais fáceis de realizar.

Ficam duas lições: a de que licenças poéticas são permitidas na ficção, desde que não ofendam a História e desmereçam a inteligência do público; e a de que, quando a pandemia terminar, é bom retomar o antigo modo de produção. Ele torna as novelas passíveis de acertos quando eles são necessários. Nesse caso, eles são imprescindíveis.

 

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Compare os personagens com as figuras históricas:

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