Moraes admite erro, mas mantém pena de 17 anos em voto contra réu do 8/1

Defesa alegou que acusado não esteve no QG do Exército e relator 'zerou' votos de ministros

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Brasília

O ministro Alexandre de Moraes, relator das ações penais decorrentes dos ataques golpistas de 8 de janeiro no STF (Supremo Tribunal Federal), ajustou seu voto, mas manteve condenação de 17 anos de prisão a Eduardo Zeferino Englert, 42, após a defesa apontar erro no primeiro julgamento.

A nova análise, iniciada na madrugada desta sexta-feira (17), ocorre depois de advogados de Englert afirmarem que o réu nunca esteve no quartel-general do Exército antes dos ataques. O argumento foi confirmado pela Polícia Federal após perícia. Com isso, os votos do julgamento anterior foram zerados.

O julgamento acontece até o próximo dia 24 no sistema virtual da corte, ferramenta na qual os ministros apresentam os seus votos sem discussão presencial, e as sustentações de advogados são protocoladas na forma de vídeo.

0
Agentes da Polícia Federal fazem perícia no prédio do STF vandalizado após os ataques do 8 de janeiro - Pedro Ladeira - 10.jan.23/Folhapress

"Verificado o erro material, o feito foi por mim retirado de pauta para reinclui-lo nesta sessão de julgamento", disse Moraes.

Englert é natural de Santa Maria (RS) e foi preso em flagrante no Palácio do Planalto no dia dos ataques.

Moraes tinha julgado procedente a ação e proposto uma condenação de 17 anos de prisão pelos crimes de abolição violenta do Estado democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado, deterioração do patrimônio tombado e associação criminosa armada.

Na decisão, o ministro dizia ter provas contundentes de que Englert tinha chegado à capital federal no dia 7 de janeiro e ficado no QG do Exército até o dia seguinte.

Também afirmou que a autoria delitiva do réu estava evidenciada e que, ao contrário do que sustenta a defesa, "os elementos probatórios indicam que o acusado teve envolvimento na empreitada criminosa".

Entretanto, como mostrou a Folha, uma perícia realizada pela PF no celular dele mostrou que não havia ali registros de ida ao acampamento bolsonarista na data. Um laudo assinado pelo Instituto Nacional de Criminalística anexado à ação penal constatou que o réu só chegou a Brasília às 14h15 do dia 8.

O advogado Marcos Vinicius Rodrigues de Azevedo, que defende o réu, acrescentou que não há fato relevante que ampare o voto do relator, "nem qualquer prova de que o réu teria, por livre iniciativa e espontaneidade, manifestado em seu nome qualquer interesse golpista ou intervenção militar".

A defesa havia pedido a absolvição de todas as acusações, afirmando, entre outros pontos, que "não há comprovação da violência nem da grave ameaça, tampouco de dolo específico".

Disse ainda que a deposição do governo, o que caracterizaria um golpe de Estado, "nunca esteve sob ameaça quando dos atos do dia 8 de janeiro, devendo-se dar a correta tipificação ao fato ante a natureza do suposto crime praticado".

Além disso, afirmou que o réu só ingressou no Planalto "para se proteger das bombas de efeito moral" e que ele estava na capital federal "com a intenção de se manifestar, pacificamente".

Na semana passada, a dois dias do término da sessão virtual, o ministro pediu destaque na ação, mecanismo que leva o julgamento para o plenário físico e todos os votos já depositados virtualmente são anulados. Após, a solicitação foi retirada pelo próprio relator. Assim, a análise continua no sistema online.

Em 7 de agosto, o réu obteve a liberdade provisória, mediante a imposição de medidas cautelares, porque foi encerrada a fase de instrução do julgamento da ação

Em seu voto, Moraes novamente expôs o conceito de crime de autoria coletiva, ou multitudinário, para abordar acusações de dano provocado por diversas pessoas.

Ele também voltou a dizer que o celular do réu "continha vídeos adredemente preparados por milícias
digitais para estimular a população a dirigirem até Brasília com o objetivo de causar tumulto".

Segundo o ministro, o réu gravou "um vídeo da horda incontrolável tomando a rampa e a parte superior do Congresso Nacional".

O magistrado também rejeitou o argumento da defesa e disse que, em vídeo gravado no Palácio do Planalto, "não se vê pessoas que estariam passando mal por força de bombas de gás lacrimogêneo, mas, sim, pessoas tentando dissuadir soldados do Exército Brasileiro a liberarem o acesso no interior do prédio público".

O STF já condenou ao todo 25 réus, com penas que alcançam até 17 anos, por causa dos atos golpistas promovidos por apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). O ex-presidente já saiu em defesa dos acusados, afirmando, por exemplo, que "alguns erraram ao invadir um prédio público", mas que há desrespeito aos direitos dos réus.

Os julgamentos ocorreram nos plenários físico e virtual.

O modo virtual de julgamento das ações do 8 de janeiro tem sido contestado pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), que considera haver violação do devido processo legal, o contraditório e o direito de defesa. Os três primeiros casos foram julgados em plenário físico, nos dias 13 e 14 de setembro.

Nos julgamentos, os advogados dos réus argumentaram desde a falta de foro dos denunciados para serem julgados no STF até a ausência de individualização das condutas pelo Ministério Público.

Em 9 de janeiro, um dia após os ataques, foram presos em flagrante 2.151 pessoas, segundo o STF. Dessas, 1.345 haviam sido denunciadas pela PGR (Procuradoria-Geral da República) até setembro e tornaram-se réus.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.