O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) prestou depoimento à Polícia Federal na tarde desta quarta-feira (12) nas investigações sobre o envolvimento dele em um suposto plano golpista relatado em fevereiro pelo senador Marcos do Val (Podemos-ES), atualmente em licença.
Bolsonaro confirmou reunião com Do Val, mas negou plano para gravar o ministro Alexandre de Moraes.
Foi a quarta vez que Bolsonaro depõe à PF neste ano. Ele já foi ouvido sobre o recebimento de joias do governo da Arábia Saudita, sobre os ataques golpistas de 8 de janeiro e sobre fraude em carteiras de vacinação.
Segundo o parlamentar, em uma reunião com Bolsonaro e o então deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ) foi apresentado plano golpista que seria executado em dezembro passado e consistiria em gravar Moraes sem autorização e depois impedir a posse do hoje presidente Lula (PT).
O plano foi detalhado em uma série de mensagens atribuídas a Daniel Silveira, reveladas pela revista Veja em fevereiro. A Folha obteve cópia de uma delas.
Após a divulgação, Moraes determinou que Do Val fosse investigado sob suspeita da prática dos crimes de falso testemunho, denunciação caluniosa e coação. Em junho, o senador foi alvo de uma operação da Polícia Federal e teve as redes sociais bloqueadas.
Qual seria o plano golpista? A proposta apresentada a Marcos do Val envolveria gravar alguma conversa que comprometesse o ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Do Val tinha contato com Moraes dos tempos de atuação na área da segurança pública.
Segundo a tese golpista, a revelação desses áudios levaria a uma tempestade perfeita para eles: Moraes seria preso, Bolsonaro seguiria no cargo e Lula não tomaria posse em 1º de janeiro.
O plano para gravar Moraes teria a participação de órgãos do governo como Abin e GSI? Ainda não se sabe. Em entrevista à revista Veja, Do Val disse que Bolsonaro afirmou que o GSI e a Abin cuidariam do suporte técnico, fornecendo equipamentos de espionagem.
Ministro-chefe do Gabinete Segurança Institucional no governo Bolsonaro, o general Augusto Heleno disse ser "mentira" qualquer envolvimento de sua pasta ou da Abin.
A Abin também divulgou nota negando envolvimento "em qualquer iniciativa relacionada à possibilidade de gravação de conversas de ministro do Supremo Tribunal Federal".
Quando a reunião ocorreu? Não há imagens nem registro dela em agenda oficial, mas, segundo reportagem da revista Veja, foi em 9 de dezembro, uma sexta-feira, no Palácio da Alvorada.
À publicação Marcos do Val detalhou os preparativos para a reunião —ele só poderia se referir a Daniel Silveira e ao presidente com códigos, além de ter sido buscado em um estacionamento por um carro, que o levou à residência presidencial. O carro em que Do Val embarcou era da segurança do presidente.
Quem participou dessa reunião? Segundo os relatos, estavam presentes Marcos do Val, o deputado federal cassado Daniel Silveira e o então presidente Jair Bolsonaro.
Quais as diferentes versões de Do Val sobre a reunião? Em março, o senador afirmou a apoiadores que forjou a história de tentativa de golpe para tentar afastar Moraes da investigação sobre atos antidemocráticos, em que Bolsonaro é alvo.
"Não tinha golpe de Estado nem nada. Tinha falado: 'Bolsonaro, vou usar aquela reunião para fazer uma ação para te blindar porque ele [Moraes] quer te prender'", disse o senador a apoiadores em vídeo gravado pelo portal Metrópoles.
Em fevereiro, o senador deu versões diferentes sobre a reunião com Bolsonaro.
Primeiro, em uma live de madrugada em suas redes sociais, disse que Bolsonaro tentou coagi-lo a dar um golpe para seguir no Palácio do Planalto e impedir a posse de Lula.
"Eu ficava puto quando me chamavam de bolsonarista. Vocês me esperem que vou soltar uma bomba. Sexta-feira vai sair na Veja a tentativa de Bolsonaro de me coagir para que eu pudesse dar um golpe de Estado junto com ele, só para vocês terem ideia. E é logico que eu denunciei", disse o senador.
Horas depois, questionado pela Folha, o senador recuou na acusação direta e disse que Bolsonaro "só ouviu" o plano do ex-deputado federal Daniel Silveira e afirmou que iria pensar a respeito.
O que Marcos do Val disse à PF? O senador disse em depoimento à PF que Bolsonaro não demonstrou contrariedade ao ouvir o plano de Silveira de tentar reverter o resultado das eleições.
Ele afirmou que o ex-presidente ficou calado durante toda a conversa. Nesta versão, Do Val relatou que, ao final do encontro, disse que precisava pensar sobre a proposta, e que Bolsonaro respondeu que o aguardaria.
Do Val disse ainda que teve a impressão de que Bolsonaro não sabia do assunto, e que Silveira parecia querer obter o consentimento dos dois.
O que aconteceu com o senador desde o primeiro relato? Um dia após a transmissão feita por Do Val, Moraes determinou que ele fosse investigado sob suspeita de falso testemunho, denunciação caluniosa e coação no curso do processo.
No dia 15 de junho, a polícia cumpriu mandados de busca e apreensão em endereços do senador em Brasília e Vitória, além do gabinete no Senado Federal. Ele também teve as redes sociais bloqueadas.
Dias depois, Do Val deixou os trabalhos da CPI do 8 de janeiro e disse que vai se afastar do mandato por recomendação médica. Desde fevereiro, o parlamentar já tinha afirmado que deixaria definitivamente a política e depois recuou.
O que diz Bolsonaro sobre o caso? O ex-presidente confirmou à coluna Mônica Bergamo que recebeu Do Val e Silveira no Palácio da Alvorada, mas negou participação no diálogo. "É mais um tiro n'água contra mim", disse.
Quem é o senador Marcos do Val? Ele disputou uma eleição pela primeira vez em 2018 e se elegeu com 24,8% dos votos do Espírito Santo. Foi eleito na onda de Bolsonaro, que venceu aquele pleito presidencial e fez com que diversos aliados estreantes na política conquistassem vagas no Legislativo.
O senador costuma dar voz às teses bolsonaristas. Em janeiro, fez críticas ao ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB), e acusou o governo federal de permitir as invasões e depredações nas sedes dos três Poderes.
Do Val é militar do Exército e ganhou fama como instrutor de agentes de segurança pública e privada, inclusive de outros países. Durante a CPI da Covid no Senado, o parlamentar se notabilizou pela defesa enfática do governo Bolsonaro.
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