Convic��o de que escaparia da Lava Jato custou caro � Odebrecht
Em julho de 2014, quando a Opera��o Lava Jato era um beb� sem dentes de quatro meses e a Odebrecht parecia estar sob prote��o do governo petista e imposs�vel de ser investigada, advogados da companhia ouviram pela primeira vez de integrantes da for�a tarefa a ideia de fazer um acordo de dela��o.
A sugest�o era que a Odebrecht confessasse crimes que teria praticado em neg�cios com a Petrobras e pagasse multa US$ 20 milh�es.
Maur�cio Ferro, cunhado de Marcelo Odebrecht e diretor jur�dico do grupo � �poca, ridicularizou a oferta. O pr�prio Marcelo, que seria preso 11 meses depois dessa oferta, tamb�m desdenhou: dizia que jamais conseguiriam provar algo contra a companhia.
Em dezembro de 2016, quando a Odebrecht se rendeu aos investigadores da Lava Jato, segundo a defini��o do advogado Theo Dias (que negociou o acordo), a multa a ser paga multiplicara-se 130 vezes em rela��o � primeira oferta e alcan�ara estratosf�ricos US$ 2,6 bilh�es.
Foi o pre�o que a Odebrecht pagou por acreditar que daria um jeito e conseguiria escapar da Lava Jato.
N�o houve jeito.
Um dia depois da pris�o de Marcelo, em junho de 2015, o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, um dos coordenadores da Lava Jato em Curitiba, comemorava que nenhum acordo tivesse ido adiante. Pela primeira vez na hist�ria do pa�s, o presidente da maior empreiteira brasileira ia para a pris�o.
Dentro e fora da pris�o, segundo relatos —alguns deles de delatores da pr�pria empresa—, Marcelo coordenou ao menos seis esfor�os para acabar com a Lava Jato:
1) Advogados contratados pela Odebrecht s�o suspeitos de tentar corromper policiais federais contr�rios � Lava Jato, para mostrar que havia ilicitudes na opera��o e por isso ela deveria ser anulada;
2) Marcelo conseguiu, segundo o ex-senador Delc�dio do Amaral, que Dilma Rousseff nomeasse um ministro para o Superior Tribunal de Justi�a, Marcelo Navarro, com a promessa de que ele soltaria o executivo;
3) Advogados da empreiteira teriam conseguido com o ministro da Justi�a � �poca, Jos� Eduardo Cardozo, provas vindas da Su��a sobre as contas usadas pela Odebrecht; a meta seria impedir o envio dos papeis ao Brasil;
4) Marcelo diz ter acionado o governador de Minas, Fernando Pimentel, pr�ximo � ent�o presidente Dilma, para avis�-la, no final de 2014, de que a campanha petista recebera pagamentos via caixa dois para o marqueteiro Jo�o Santana.
O recado enviado a Dilma dizia: "Ela cai, eu caio".
5) Marcelo conta tamb�m que procurou outro assessor muito pr�ximo de Dilma, Giles Azevedo, no primeiro ano da Lava Jato, para alert�-lo de que o Planalto deveria fazer de tudo para libertar os executivos da OAS e da UTC que estavam presos em Curitiba, porque havia alto risco de que fizessem acordo de dela��o.
6) Numa viagem ao M�xico, em maio de 2015, um m�s antes de ser preso, Marcelo diz ter avisado Dilma de que a Lava Jato iria chegar aos pagamentos il�citos feitos na Su��a ao marqueteiro do PT. "A Lava Jato vai descobrir tudo", teria sido o alerta.
Todas as supostas estrat�gias deram errado.
Um dos advogados da Odebrecht chegou a ser indiciado sob suspeita de corromper agentes da PF.
Marcelo Navarro votou a favor da liberta��o de Marcelo, mas outros ministros do STJ optaram por negar o pedido de habeas corpus. Ap�s a dela��o de Delc�dio, ele negou que houvesse compromisso ligado a sua indica��o.
A Odebrecht n�o conseguiu evitar a vinda da documenta��o su��a, e o dono da UTC, Ricardo Pessoa, tornou-se de fato delator.
E, se a Lava Jato n�o descobriu tudo, revelou o suficiente para dobrar a Odebrecht.
O primeiro passo foi dado em setembro de 2014, quando o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa fechou acordo de dela��o com procuradores, revelou que recebera US$ 31,5 milh�es da Odebrecht na Su��a e entregou os extratos para a for�a-tarefa.
Foi a partir dessa movimenta��o financeira na Su��a que os procuradores em Curitiba descobriram contas secretas, em nome de terceiros, que a companhia usava para pagar propina.
A empresa continuou negando que as contas fossem suas e adotou um discurso agressivo contra procuradores, delegados da PF e o juiz Sergio Moro, a quem acusava de arbitrariedade e viola��es da lei.
Os ataques, em vez de intimidar os investigadores, serviram para elevar a voltagem contra a Odebrecht.
A opera��o que nocauteou a empresa, em fevereiro de 2016, tinha um nome que soava brincalh�o (Acaraj�, como sin�nimo de propina), mas teve o efeito de um tiro de fuzil na testa.
Uma das funcion�rias investigadas, a secret�ria Maria L�cia Tavares, revelou � for�a-tarefa que trabalhava num setor respons�vel por pagar propina e, por descuido da Odebrecht, decidiu fazer um acordo de dela��o.
A empresa contratara a equipe de advogados mais cara da Lava Jato, mas deixara uma secret�ria se sentir � deriva ap�s ser presa em Curitiba. Foi a batalha de Waterloo da companhia. Assim como Napole�o perdeu o t�tulo de imperador com a derrota, o grupo perdeu o porte de imp�rio com essa dela��o.
Foi a partir da decis�o de Maria L�cia que Em�lio Odebrecht, presidente do conselho de administra��o do grupo, decidiu fazer o acordo de dela��o. A avalia��o era que a insist�ncia em negar o que os investigadores j� sabiam podia lev�-los � bancarrota.
Com as descobertas da Lava Jato, a maior empreiteira do pa�s, que faturou R$ 132 bilh�es em 2015, j� n�o conseguia cr�dito em bancos.
Sem novos neg�cios, o n�mero de funcion�rios caiu de 180 mil antes da opera��o para 80 mil neste m�s.
A d�vida bruta do grupo, de cerca de R$ 80 bilh�es, est� em n�veis perigosos para quem ter� de pagar uma multa de US$ 2,6 bilh�es s� para tr�s pa�ses (Brasil, Estados Unidos e Su��a). � a maior multa em acordos do g�nero j� cobrada no mundo.
A grande d�vida que paira entre executivos da Odebrecht � se a companhia conseguir� suplantar o dano causado � reputa��o da empresa pelos esc�ndalos de corrup��o a que foi ligada.
O sonho de consumo da Odebrecht � que o grupo siga o caminho da Siemens, o maior grupo industrial europeu. Em 2006, a empresa foi apanhada pagando propina em escala global e, dois anos depois, fez um acordo pelo qual teve de pagar multas de US$ 1,3 bilh�o.
A Siemens implantou um sistema de conformidade �tica que se tornou padr�o mundial, deu a volta por cima e hoje fatura mais do que quando as autoridades descobriram os subornos.
Se o plano de ser uma Siemens fracassar, o que � dito em voz baixa na empresa � que h� um culpado �bvio: Marcelo Odebrecht e sua estrat�gia de negar o que procuradores e policiais j� sabiam e de que, em alguns casos, tinham provas.
OUTRO LADO
Em nota, a Odebrecht afirmou que "j� reconheceu os seus erros, pediu desculpas p�blicas e est� comprometida a combater e n�o tolerar a corrup��o em quaisquer de suas formas".
Disse ainda que entende ser de responsabilidade da Justi�a a avalia��o de relatos espec�ficos feitos por ex-executivos e executivos em seus depoimentos e que est� colaborando com a Justi�a no Brasil e nos demais pa�ses em que atua.
A Odebrecht diz que, ap�s o fechamento do acordo de leni�ncia no Brasil, nos EUA e na Su��a, "est� concentrada no retorno �s suas atividades normais com acesso a cr�dito, credenciamento para participa��o em novas concorr�ncias e possibilidade de oferta de empregos", e que o grupo "continua avan�ando positivamente" na reestrutura��o de neg�cios.
Livraria da Folha
- Box de DVD re�ne dupla de cl�ssicos de Andrei Tark�vski
- Como atingir alta performance por meio da autorresponsabilidade
- 'Fluxos em Cadeia' analisa funcionamento e cotidiano do sistema penitenci�rio
- Livro analisa comunica��es pol�ticas entre Portugal, Brasil e Angola
- Livro traz mais de cem receitas de saladas que promovem saciedade