Comparada a Moro, ju�za de Mato Grosso � aplaudida nas ruas
Rai Reis/Folhapress | ||
Ju�za Selma Arruda, a "Moro do Mato Grosso", em seu gabinete em Cuiab� |
A mulher do momento em Mato Grosso tinha planos de pular Carnaval no domingo (26). Mas, para isso, precisava levar seu "bloco" particular: Selma Arruda, 54, ju�za da 7� Vara Criminal do Estado, n�o d� um pulo fora do cord�o de seguran�as que a cerca 24 horas por dia.
"Ano passado deu um n� danado com os seguran�as. Queria ficar mais, mas eles acharam melhor eu voltar para casa", conta, rindo.
Quatro policiais grandalh�es escoltam a ju�za de 1,50 metro, que se destaca sobre saltos alt�ssimos, colares e pulseiras reluzentes. Ganhou a guarda no ano passado.
Foi nessa �poca que as amea�as a ela ficaram constantes. A ju�za decretou a pris�o do ex-governador Silval Barbosa (2010-2014), do PMDB, e de outros poderosos de Mato Grosso, investigados pela Opera��o Sodoma.
Apelidada de Lava Jato pantaneira, apura desvio em compras de terrenos, fraude em licita��es e propina para cobrir custos de campanha.
S�o tramas que se desenrolam com dela��es premiadas, condu��es coercitivas, intercepta��es telef�nicas e pris�es preventivas.
Os ju�zes que escrevem as decis�es das duas opera��es t�m perfil parecido: "caneta pesada", na vis�o dos advogados de defesa da Sodoma.
Como Sergio Moro, Selma Arruda � conhecida por ser dura e n�o hesitar em manter pris�es preventivas.
A magistrada diz que � uma "fal�cia" que o Brasil encarcera demais, � contr�ria �s audi�ncias de cust�dia ("um absurdo, o cara entra numa porta e sai pela outra e n�o entende nada que est� acontecendo") e defende penas duras.
Tamb�m como Moro, virou celebridade no Estado. � aplaudida na rua e reconhecida e apoiada por nove em dez cuiabanos com quem a reportagem conversou.
A ju�za recebe cumprimentos at� mesmo de testemunhas durante audi�ncias que instrui. Terminado seu depoimento na quarta passada (22), um gerente de concession�ria levantou-se e olhou para a magistrada, no centro da mesa: "Tenho orado por voc� e sua fam�lia".
O homem tinha acabado de depor em uma a��o que apura desvios de R$ 60 milh�es do Legislativo, supostamente capitaneados por Jos� Riva (PSD). O ex-deputado presidiu a Assembleia mato-grossense por duas d�cadas e carrega o ep�teto de "maior ficha-suja do pa�s" por responder a cem processos.
Algo, por�m, a separa de Moro. Ele evita dar entrevistas. A mato-grossense � presen�a frequente em programas da TV local. Manteve, at� duas semanas atr�s, duas "fanpages" no Facebook.
Chegou a postar v�deos em que convocava cuiabanos a protestar a favor das "Dez Medidas" contra a corrup��o e discursou em um trio el�trico com a faixa "somos todos Moro", em 2016.
"O Moro n�o precisa [de m�dia], ele tem a Globo que fala dele o tempo todo", diz. "Me posiciono dessa forma, desde o come�o, porque o Mato Grosso n�o tem visibilidade nacional. Gosto de debate, quero que as pessoas falem [sobre corrup��o], aprendam que a gente tem que fazer certinho."
Com o status "se sentindo chateada", a ju�za anunciou que decidiu "cancelar suas p�ginas do Face, Selma Arruda e Selma Arruda 2". Atribuiu a decis�o a ataques por tentar "aplacar a justi�a e as leis contra os poderosos neste Estado".
FAROESTE
Ga�cha, Arruda se mudou para Mato Grosso gr�vida do primeiro de seus tr�s filhos e com o diploma de direito rec�m-conquistado.
Come�ou a ser notada no Estado quando decretou a pris�o de Riva, em 2015. "Metade do Mato Grosso me odiou. Ele era muito popular", conta a magistrada em seu gabinete, decorado com papel de parede em cores terrosas e imagens de Nossa Senhora Aparecida.
Entre outras coisas, o ex-deputado � suspeito de custear, com recursos da Assembleia, di�rias de hotel para quem ia a Cuiab� em busca de tratamento m�dico. "Isso fazia ele ser considerado simp�tico", diz.
Ela come�ou a magistratura enfrentando contrabandistas e narcotraficantes em regi�es de conflito no Estado. Passou cinco anos em C�ceres, a 80 km da fronteira com a Bol�via. Descreve a regi�o como a "boca grande de entrada de drogas" no pa�s.
"� o verdadeiro impulso da economia l�. Percebia que, quando prendia um grande traficante, o com�rcio ca�a", diz a ju�za, contr�ria � descriminaliza��o das drogas: "Seria o caos do caos".
Amea�as j� eram parte de sua rotina nessa �poca. Sem seguran�a pr�pria, recorria a um rev�lver para se proteger.
"Meu marido [um policial rodovi�rio federal] passava a noite trabalhando. J� dormi sentada, com a arma engatilhada no colo, escondendo as tr�s crian�as embaixo da cama. Eles telefonavam, faziam o inferno. Principalmente quando prendia um policial."
TUDO A PERDER
Na �ltima quinta (23), a ju�za foi o assunto de um ato da Ordem dos Advogados do Brasil. O presidente nacional da ordem, Claudio Lamachia, e o da seccional paulista, Marcos da Costa, voaram at� Cuiab� em apoio aos colegas locais. Criticavam o pedido de pris�o do ex-presidente da OAB-MT Francisco Faiad, ex-secret�rio de Administra��o de Silval Barbosa.
A magistrada diz que Faiad teria participado de um esquema de recebimento de propinas envolvendo um posto de gasolina, que o teria beneficiado com R$ 192 mil.
Mas o que indignou a OAB foi o trecho em que ela afirma que, por ser advogado, Faiad poderia acessar trechos sigilosos dos autos "que um investigado qualquer jamais obteria". Por isso, prejudicaria a investiga��o.
A categoria estuda representar contra a magistrada. "� um direito deles, mas tem um cunho absolutamente distorcido. N�o criminalizei a advocacia, h� ind�cios suficientes de que ele tenha feito um desvio milion�rio e isso, somado � advocacia, poderia facilitar", argumenta ela.
Faiad foi preso em 14 de fevereiro, mas est� em liberdade h� uma semana, ap�s a justi�a acatar um pedido de habeas corpus.
Tamb�m no dia 14, o STJ retomou o julgamento de uma a��o movida pela defesa de Silval Barbosa que pede a suspei��o da ju�za por seus excessos. Argumentam que ela interrogou uma testemunha, papel que cabe ao Minist�rio P�blico.
A mulher mais temida do Mato Grosso, como divulga a imprensa local, diz que n�o se assusta com as amea�as. Por outro lado, se preocupa com o "juiz de todos os ju�zes": Deus. Esp�rita, diz ter "um medo danado" de "chegar l�" e ouvir dEle que foi injusta ao longo da vida.
Arruda enterrou uma filha, h� tr�s anos, em raz�o de um c�ncer. Durante o tratamento, que durou sete anos, n�o diminuiu o ritmo intenso de trabalho, nem chorou diante da fam�lia. A ju�za era refer�ncia para a filha, que estudava direito. A vida � justa? "No fim das contas, ela �. Acaba sendo."
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