Presidente Dilma disse que poderia me ajudar no STF, afirma Eduardo Cunha
Renato Costa/Folhapress | ||
Eduardo Cunha, presidente da C�mara afastado, em entrevista � Folha |
Na primeira entrevista desde que foi afastado da presid�ncia da C�mara pelo STF (Supremo Tribunal Federal), Eduardo Cunha acusa Dilma Rousseff de ter lhe oferecido "ajuda" de cinco ministros do Supremo em seu �ltimo encontro reservado com a petista, em setembro de 2015.
"Ela me convocou para falar de medidas e sei l� o qu� e disse que tinha cinco ministros do Supremo para poder me ajudar", afirmou � Folha.
� �poca, ele j� havia rompido com o governo e acabava de ser denunciado pelo Minist�rio P�blico por suspeita de corrup��o e lavagem de dinheiro na Lava Jato –e discutia com a oposi��o a possibilidade de aceitar o pedido de impeachment.
Sem dar detalhes, Cunha diz ter mantido a suposta oferta em segredo at� agora porque, "concretamente, ela n�o disse o que ia fazer". "Considerei uma bravata."
Antigo advogado-geral da Uni�o, Jos� Eduardo Cardozo nega enfaticamente a vers�o e diz que Cunha n�o merece "nenhuma credibilidade".
Mesmo afastado do mandato, Cunha usava o broche privativo dos deputados na lapela esquerda do palet�. Para a entrevista, vestiu uma gravata igual � do dia em que rompeu publicamente com o governo Dilma –17 de julho de 2015, data que repete sem precisar consultar a mem�ria. "Fui alvo de uma cassa��o branca", queixa-se.
� Folha o presidente contou como conseguiu evitar que o governo conquistasse um �libi para se livrar das pedaladas de 2015.
Ele aceitou o pedido de impeachment horas antes da previs�o da vota��o pelo Congresso da nova meta fiscal, que poderia, segundo ele, dar � presidente um "discurso" para justificar as manobras.
*
Folha - Dilma o chama de capit�o do golpe.
Eduardo Cunha - Olha aqui, eu tive 53 pedidos de impeachment da presidente. Nunca na hist�ria deste pa�s teve um presidente com tantos pedidos de impeachment. Do 53 que ingressaram, eu rejeitei 41, aprovei um e ainda deixei 12 que n�o foram decididos. Se eu fosse o capit�o do golpe, j� teria tido impeachment muito tempo atr�s. Eu rejeitei o conceito de que o mandato anterior contaminava o mandato atual. N�o entrei no m�rito da corrup��o. Ela promoveu despesas sem autoriza��o do Poder Legislativo. Foi t�cnico.
Sua decis�o de deflagar o impeachment veio na esteira da decis�o do PT de n�o apoi�-lo no Conselho de �tica...
Se voc� olhar o cronograma das decis�es, ver� que eu tinha prometido publicamente que, at� o dia 30 de novembro, eu traria uma decis�o. Por que eu acatei o pedido em 2 de dezembro? Primeiro, por que eu quis homenagear a data de anivers�rio da minha filha [risos]. Segundo, porque eu vi que iriam votar a mudan�a da meta [fiscal] na sess�o do Congresso Nacional. Eu queria que a decis�o fosse antes da vota��o da mudan�a da meta. Se eles votassem a mudan�a da meta, eles ficariam com discurso pol�tico de que a meta j� tinha sido votada.
Isso n�o refor�a a tese de que o sr. for�ou a m�o do impeachment?
Eu j� estava com a decis�o tomada, posso comprovar. Era s� uma quest�o de tempo. Quando eu vi que ia ter a mudan�a da meta, eu falei: 'tem que ser antes', se n�o voc� enfraqueceria.
Horas poderiam ter mudado o destino da presidente.
N�o sei se poderia ter salvado, mas que efetivamente daria para eles uma desculpa, daria. O fato de ter votado n�o significa que ela n�o teria praticado crime. Mas era fundamental, na minha �tica, que essa decis�o fosse feita antes da vota��o, para evitar um discurso pol�tico. Essa foi a raz�o pela qual eu soltei [o pedido] naquele dia. N�o tem outra raz�o.
E lhe digo mais. Eu n�o fiz chantagem. Fui eu que n�o aceitei a chantagem dela. Tenho tr�s testemunhas que estavam na minha sala quando Jaques Wagner surgiu na linha do telefone tentando falar comigo. Ele dizia: 'O PT quer votar com voc�. A gente faz tudo, n�o fa�a isso'. O [deputado] Andr� Moura [PSC-SE] estava com Jaques Wagner na outra linha dizendo que ele estava insistindo para falar, e eu disse n�o falaria com ele.
Por que voc� n�o quis atender?
Porque j� estava decidido. N�o aceitei ser comprado com o voto do PT.
E se o governo n�o tivesse rompido com voc�?
Eu que rompi com o governo em 17 de julho. Quem rompeu com o governo fui eu. Eles tentaram v�rias vezes fazer acordo, v�rias vezes. Eles n�o tentaram s� esse tipo de acordo.
Que outros?
A presidente, no dia em que eu estive com ela, em 1� de setembro, fui para uma audi�ncia que ela convocou para falar de medidas e sei l� o qu�. Ela disse que tinha cinco ministros do Supremo para poder me ajudar.
Ela disse isso? Em que contexto?
Disse isso. Ela n�o disse os nomes nem ajudar no que. Eu simplesmente ignorei. Teve uma outra oportunidade em que o governador [do Rio de Janeiro Luiz Fernando] Pez�o, numa segunda-feira que eu estava aqui em Bras�lia, agosto ou setembro, simplesmente me telefonou porque precisava falar comigo urgente. Ele disse: 'eu estava querendo ir almo�ar com o Michel no Jaburu'. Eu disse: 'Pez�o, quer me encontrar l�?'. E ele foi. Chegando l�, pedi licen�a ao Michel eu fui para uma sala sozinho com ele, que veio com a mesma hist�ria de que ela tinha cinco ministros do Supremo para me ajudar.
Ajudar a te livrar [da den�ncia na Lava Jato]?
Ajudar, mas n�o disse em qu�.
Por que voc� n�o aceitou? N�o denunciou?
N�o � quest�o de aceitar. Eu n�o acredito nessas coisas. Eu n�o acredito que algu�m possa ter cinco ministros do Supremo sob seu controle. N�o existe isso, eu respeito a Suprema Corte e n�o entendo isso. Eu entendo isso como uma, digamos assim, como uma bravata. Concretamente, ela n�o disse o que ia fazer.
Acha mesmo que hoje algu�m � capaz de influenciar a Lava Jato?
N�o. Acho que tem seletividade. Me escolheram. Est�o chegando a tal ponto que querem abrir inqu�rito contra pessoas que acham que s�o minhas aliadas. Chegaram nesse n�vel. O procurador-geral [da Rep�blica Rodrigo Janot] resolveu me escolher como inimigo.
Para a Lava Jato, um de seus erros foi falar demais, dar vers�es diferentes sobre o requerimento apresentado ...
Eu n�o falei nada. Eu tenho a prova de que o requerimento n�o foi feito no meu gabinete. Simples assim. Eu tenho a esta��o do computador que foi feito o requerimento. Isso tem prova t�cnica.
Isso foi feito onde?
Foi feito na Comiss�o de Constitui��o e Justi�a. Eu digo a voc�. Quanto a isso, eu estou absolutamente tranquilo. O que est�o fazendo, invadindo a prerrogativa do trabalho do parlamentar, � absurdo. Achar que o parlamentar n�o pode fazer o requerimento ou deixar de fazer. A ex-deputada Solange est� sendo penalizada apenas para poder me atingir.
Est� dizendo que o Minist�rio P�blico est� com poder excessivo?
Tem que separar muito bem. Falo do procurador-geral da Rep�blica, n�o da institui��o, que tem de fazer o papel dela. Quando voc� pega decis�o do meu afastamento, quase tudo � mat�ria jornal�stica.
O sr. v� diferen�a de tratamento com o presidente do Senado?
Eu deixo para voc�s a conclus�o. Instauraram um inqu�rito contra mim em mar�o. A den�ncia foi promovida sem concluir o inqu�rito com as oitivas que estavam programadas para serem feitas. Pedi adiamento de uma semana para dar tempo de o meu advogado distribuir memoriais e porque n�o estava completo o qu�rum daquele dia, um ministro [do STF] estava no exterior. J� um outro caso de tr�s anos atr�s foi apresentado e n�o teve pauta.
Eu n�o tenho nada contra, n�o estou acusando ningu�m, mas existe uma diferen�a [em rela��o a Renan], n�o h� d�vida nenhuma que houve uma diferen�a. S� estou discutindo a celeridade em rela��o ao meu caso.
Qual sua rela��o com L�cio Bolonha Funaro? Ele comprou carros para sua empresa
Eu n�o tive compra, eu tive m�tuo. Totalmente colocado na contabilidade. Eles j� quebraram o sigilo, t�m a contabilidade. � que mat�ria probat�ria n�o � analisada nessa etapa inicial.
Teme ser preso?
Com muita sinceridade, eu estou muito tranquilo. N�o posso temer nada, porque quem n�o faz nada n�o tem o que temer. Acho que as institui��es t�m que acabar funcionando para proteger os direitos.
Funcionaram at� agora?
A novela inteira n�o passou, s� cap�tulos.
E quando acaba?
Ah, � uma novela longa!
E a tese de que r�u n�o pode presidir a C�mara dos Deputados?
O artigo 86 da Constitui��o � muito claro. N�o posso ser processado por atos estranhos �s minhas fun��es. E eles teriam de colocar prazo no meu afastamento, limitando-o a igual per�odo da presidente da Rep�blica, 180 dias. O terceiro agravante que existe � o que trata exclusivamente de quem est� na fun��o de presidente da Rep�blica.
Pergunto o seguinte: se hoje eu, r�u de uma a��o penal, resolvo ser candidato a presidente da Rep�blica e, se o partido me der legenda, conseguiria registrar a minha candidatura? Registro. N�o est� no ficha limpa. No ficha limpa, s� processos transitados em julgado em segunda inst�ncia. Se eu posso ser candidato a presidente da Rep�blica, por que eu n�o posso exerc�-la?
O sr. acha que o retoma o mandato?
Acho que retorno. N�s vamos produzir recursos, vamos conseguir convencer o Supremo.
Foi um erro capital de Dilma colocar um candidato para enfrent�-lo para a presid�ncia da C�mara?
Esse governo � mais ou menos um avi�o quando cai. N�o cai por um motivo s�. O piloto est� num mal dia, passa mal, tem falha mec�nica, falha de planejamento, a comunica��o com as torres est� errada.
O governo errou na campanha eleitoral. Ganhou com um discurso fraudulento. A presidente mentiu � na��o, ganhou sem hegemonia eleitoral e com uma base partid�ria em frangalhos. Ainda por cima, eles tinham uns g�nios da articula��o politica. Tentaram dar um tchau, PMDB. Aquilo foi apenas uma etapa, n�o � raz�o.
Se voc� fizer uma an�lise fria, os votos que o candidato do PT teve contra mim foram os votos para evitar o impeachment. Ela n�o agregou nada. Uma articula��o pol�tica "organiza��es tabajara". Eu me lembro muito bem de uma frase: as duas coisas org�nicas que existiam no Congresso eles estavam querendo jogar fora –o PMDB e a CNB [corrente majorit�ria] do PT. Ela errou na escolha do ministro da Fazenda, ou escolheu direito e o enfraqueceu na pr�pria a��o. Ela teve oportunidades para poder dar uma resposta e ter mudado. Porque, quando a economia vai bem, tudo vai bem. Quando a economia vai mal, todo o resto acaba indo mal.
Se o sr. n�o existisse, n�o haveria o impeachment.
A�, minha querida, Deus que me colocou l�.
Deus queria o impeachment de Dilma?
N�o sei, nada acontece se n�o for pela vontade de Deus.
Foi abandonado por Michel Temer desde seu afastamento?
Eu estive com ele j�, tenho falado com ele quase constantemente, n�o tenho nenhum problema. N�o h� o que cobrar. Cobrar o qu�? Voc� tem uma situa��o inusitada, porque a decis�o n�o foi dele, n�o foi ele que agiu pra isso. Eu estou sofrendo muito mais uma a��o orquestrada dos advers�rios desse processo de impeachment do que necessariamente dos fatos que acontecem.
O grupo de Temer acha que sua sa�da descontamina a imagem dele.
Tem sempre as fofocas e aqueles que querem ocupar os espa�os que porventura acham que vai ter concorrente. N�o � a vis�o do Michel. N�o tenho sinal nenhum em rela��o a isso.
O sr. cobrou que Temer cumprisse acordos firmados antes da vota��o do impeachment.
N�o s� eu, eles cobraram mesmo. O Michel conversava com os partidos, n�o s� eu falava, n�o. Eu participei de muitas conversas e de muitos debates, n�o � que cobrei, eu n�o preciso cobrar o Michel pra ele cumprir os acordos. Ele sabe os acordos que ele tem que fazer ou n�o pra ter sua base pol�tica.
Ele descumpriu v�rios.
Mas a� quem teve o acordo descumprido que reclame com ele, n�o sou eu. Se � que aconteceu isso.
Acha correto oferecer cargo pra votar no impeachment?
Ele n�o ofereceu cargo pra votar no impeachment. Quem ofereceu pra votar contra o impeachment foi a presidente da Rep�blica.
Temer tamb�m.
N�o, com Michel foi outra coisa.
Agora ele � cobrado a pagar a conta...
Ele est� sendo cobrado da participa��o dos partidos que desprezaram as ofertas fisiol�gicas e optaram pela solu��o de resolver o problema do pa�s.
N�o � mais justo dizer que recusaram as ofertas fisiol�gicas de Dilma e aceitaram as ofertas fisiol�gicas de Temer?
N�o, at� porque o Michel n�o tinha o que ofertar. Quem tinha a caneta, quem publicava os Di�rios Oficiais gordos com nomea��es e demiss�es era a Dilma, n�o o Michel.
Se o sr. tivesse diante da Dilma agora, o que diria a ela?
Tchau, querida [risos].
O grupo de Temer o v� por tr�s da anula��o do impeachment por Waldir Maranh�o.
Isso � brincadeira, s� pode ser uma piada. Eu n�o teria conduzido esse processo do jeito que conduzi para chegar ao fim e fazer uma lamban�a dessa natureza. O que o ministro da Justi�a, o governador do Maranh�o e a presidente da Rep�blica fizeram � obstru��o � Justi�a. S� isso j� valeria um pedido de impeachment. Se chegasse nas minhas m�os um pedido com essa argumenta��o, eu abriria.
Maranh�o agiu junto, merece o impeachment?
N�o cabe. Ele est� no exerc�cio do mandato, tem o poder de conceder decis�es. Posso discordar, achar que � absurda, antirregimental, irrespons�vel, mas ele tem o poder.
Sua ren�ncia for�aria uma elei��o nova na presid�ncia. Se o Waldir Maranh�o estiver atrapalhando o governo de Temer...
Eu n�o vou renunciar.
Ainda que ajude Temer?
N�o est� em jogo eu renunciar para poder facilitar ou dificultar quem quer que seja. Eu estou no meu direito, eu fui eleito. Eu vou exercer minha defesa. A Constitui��o s� prev� uma medida cautelar para parlamentar: a pris�o em flagrante, que precisa ser submetida ao plen�rio da Casa. Para o afastamento, o STF aplicou isonomia. Delc�dio foi preso em flagrante e n�o foi suspenso seu mandato. Uma suspens�o sem prazo. At� quando, por que motivo? � uma cassa��o branca do meu mandato! Do mandato de deputado. Estou sofrendo uma cassa��o branca.
Incomoda ter sido afastado antes de Dilma?
N�o estou fazendo competi��o de afastamento.
N�o foi alertado de que, se prosseguisse com o impeachment, seria o pr�ximo a cair?
N�o tenho d�vida nenhuma de que, quando voc� parte pra esse tipo de enfrentamento, a gente acaba prejudicando. Recebi amea�as de morte. Mas se h� uma coisa que n�o tenho na pol�tica � medo. Fa�o o que considero correto. Eu sabia, tinha absoluta convic��o de que quem entra numa guerra vai tomar tiro tamb�m, isso � normal.
Aliados j� decretaram sua morte pol�tica.
N�o morri nem pretendo morrer. Ou n�o estaria aqui falando com voc�s.
Como um dos mais poderosos presidentes da C�mara foi t�o r�pido do apogeu ao ch�o?
Eu cumpri 60% do meu mandato. A Dilma n�o chegou � metade.
Atribuem sua influ�ncia ao fato de financiar a campanha junto a empres�rios de mais de cem deputados.
Isso � balela! A hist�ria real eu j� cansei de falar. O que eu fiz, e sempre fiz, foi ajudar o meu partido na obten��o de recursos na campanha eleitoral. De outros partidos, negativo. S� o meu partido.
O que o Michel Temer ofereceu?
Nada. Michel nunca me pediu para dar curso a processo de impeachment nem nunca me ofereceu nada.
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