Morte de coronel Ustra confirmou sua convic��o de que nunca seria punido
O coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra, 83, tinha uma cega convic��o de que nunca seria punido pelos crimes que era acusado de cometer na ditadura (1964-85). Chegara a prever, certa vez, que morreria sem ser julgado e condenado.
Nesta quinta (15), com sua morte em Bras�lia por fal�ncia m�ltipla de �rg�os decorrente de uma pneumonia, cumpriu-se a profecia do militar.
Acusado por familiares de mortos na ditadura, ex-presos pol�ticos e pelo Minist�rio P�blico Federal de crimes como torturas, assassinatos e desapari��es for�adas, o chefe de um dos mais violentos �rg�os da repress�o s� sofrera um �nico rev�s nos �ltimos dez anos, quando as a��es come�aram a ser apresentadas � Justi�a.
Ustra era o �nico militar reconhecido pela Justi�a, em a��o declarat�ria e at� agora in�dita, como torturador. O resultado, que tentava reverter, causou-lhe imenso desgosto.
Nas outras oito a��es que ainda tramitavam contra ele, o militar conseguira safar-se de eventual condena��o gra�as � Lei da Anistia -recursos foram apresentados e ainda seriam analisados, mas agora os casos ser�o extintos.
Nascido em Santa Maria (RS), Brilhante Ustra formou-se em 1954 na Academia Militar das Agulhas Negras. De sua turma sairiam outros militares acusados de crimes na ditadura, como o general Jos� Ant�nio Nogueira Belham, o coronel Audir Maciel e o major Euclides Chignall, morto no ano passado.
Em 1964, como capit�o, Ustra fora escalado no dia 31 de mar�o pelo governo Jo�o Goulart para conter, nos arredores do Rio, as tropas golpistas que vinham de Minas Gerais. Contaminado pela conspira��o, juntara-se aos revoltosos no meio do caminho.
O militar assumira o DOI (Destacamento de Opera��es de Informa��es) do 2� Ex�rcito, em S�o Paulo, em 1970. Era o auge do combate �s organiza��es da esquerda armada. At� o final de 1974, quando deixaria o cargo, o DOI tivera cerca de 2.000 presos.
Segundo o livro "Brasil: Nunca Mais", 502 pessoas foram torturadas no local no per�odo. A Comiss�o da Verdade contou ao menos 45 mortes e desaparecimentos por a��o de subordinados a Ustra.
As acusa��es contra o coronel come�aram a surgir ap�s a ditadura. A primeira foi feita pela atriz e ent�o deputada Bete Mendes, que o apontou como seu torturador.
Ainda nos anos 1980, ele come�ou com a ajuda da mulher, Jose�ta, a relatar sua vers�o da ditadura –primeiro para mostrar �s filhas, publicando posteriormente dois livros. Ustra sempre achou que deveria lutar para impor seu relato, mesmo que considerasse esta uma batalha perdida.
Gostava de citar uma frase de Siqueira Campos, militar famoso pela participa��o nas revoltas tenentistas: "� p�tria se deve dar e nada pedir, nem mesmo compreens�o".
Ele mesmo reconhecera que, enquanto vivesse, estaria no foco dos grupos de direitos humanos que defendem a puni��o dos que cometeram crimes na ditadura.
Do Ex�rcito, ele sempre recebeu apoio e respeito. Em Bras�lia, onde vivia havia mais de 30 anos, costumava reunir-se com militares que tamb�m j� estavam reformados.
Calmo e doce no trato pessoal, Ustra sempre negou as acusa��es. Dizia apenas ter cumprido ordens. Em 2013, ao falar na Comiss�o da Verdade, declarou: "Quem deveria estar sentado aqui � o Ex�rcito brasileiro, n�o eu".
Desde o in�cio deste ano sua sa�de estava debilitada –sofrera um infarto e tratava-se de um c�ncer. Nos �ltimos dias, em coma, respirava com a ajuda de aparelhos.
O corpo de Ustra ser� cremado nesta sexta (16). Avesso a qualquer tipo de publicidade, ele n�o queria sepultura.
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