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Recado iraniano

Teocracia perde eleição, mas não há sinal de relaxamento do regime autoritário

Masoud Pezeshkian, novo presidente do Irã - Atta Kenare/AFP

O moderado Masoud Pezeshkian foi eleito presidente do Irã na sexta (5) com 53,6% dos votos em uma eleição marcada pelo desalento dos iranianos aptos a votar. Sua vitória sobre o candidato dos aiatolás, o linha-dura Saeed Jalili, é tão significativa quanto a não participação de metade do eleitorado.

Parece improvável que o novo governo possa abalar a estrutura da teocracia xiita. No entanto o contexto das eleições evidencia a pressão por relaxamento do regime.

Pezeshkian saíra vencedor na votação ainda mais esvaziada de 28 de junho, mas, como não obteve o mínimo de 50% dos votos, foi necessário um segundo turno.

Aiatolás já lidaram com presidentes eleitos sob bordões de reforma do regime e de reaproximação com o Ocidente. Não teriam dificuldade de lidar com outro, se as circunstâncias não tivessem mudado.

O nervo exposto do governo autoritário está na massa de cidadãos descontentes com a economia combalida e as opressivas regras morais, cooptada pelo chamado ao boicote às urnas.

Pezeshkian, nesse sentido, pode ser usado pelos teocratas se sua gestão amalgamar o apoio de minorias étnicas, reduzir a insatisfação popular com a perda do poder de compra nos últimos anos e rever normas exorbitantes, em particular as impostas às mulheres.

Um voo mais ambicioso seria abrir algum veio de diálogo com o Ocidente sobre a retomada do acordo nuclear firmado em 2015, visando a eliminação das sanções internacionais que prejudicaram a economia do país.

Mas, embora o presidente iraniano tenha a prerrogativa de orientar as políticas econômica e exterior, não há dúvidas de que caberá ao líder supremo, Ali Khamenei, as decisões cruciais nesses setores. E não se vê, até o momento, nenhuma perspectiva de mudança de rota por parte do aiatolá.

Fato é que a teocracia saiu derrotada do pleito. Khamenei reprimiu os protestos de 2022 e 2023 com brutalidade. Se ignorar o recado das urnas, ao menos há alguma chance de estimular a oposição popular ao regime autoritário que há décadas subjuga os iranianos, notadamente as mulheres.

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