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Fabiano Contarato

Para mais ordem, o caminho é mais progresso

Direitos humanos significam civilização, estão acima de espectros ideológicos

Fabiano Contarato

Senador pelo Espírito Santo (PT), advogado, professor de direito e delegado aposentado da Polícia Civil

Há no senso comum uma ideia equivocada de que direitos humanos seriam "coisa de esquerda" e que tratar de polícia e segurança pública seria "assunto de direita". Essas são grandes mentiras que, de tanto serem propagadas, cresceram a um ponto que agora demandam um esforço imenso para que a verdade seja restaurada.

Esse trabalho em prol da verdade, no entanto, precisa começar logo —antes que seja tarde—, porque sabemos o quão letal as mentiras podem se tornar. Mentiras são armas usadas por grupos organizados que não têm compromisso com o país e a população. Trabalham disseminando o medo e o ódio, num sistema que cresce e se retroalimenta do caos.

Fui delegado de polícia por 27 anos e entendo que passou da hora de o campo progressista retomar o protagonismo da discussão. Devemos voltar a responder �� altura aos anseios da sociedade, que pede legitimamente por mais segurança. Dou o exemplo da lei, de minha autoria, que determina a prisão do motorista embriagado que matar ou lesionar no trânsito. Ainda quero acabar de uma vez por todas com a possibilidade de fiança para quem provocar acidente nessas condições.

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Polícia reconstitui acidente com Porsche que provocou a morte de motorista de aplicativo em São Paulo - Ronny Santos/Folhapress

Agora, chamo as outras lideranças progressistas para também abraçar esse esforço. Precisamos escutar a Polícia Militar, a Polícia Civil, a Polícia Federal e todas as instituições de segurança pública e da sociedade civil para entender onde e como podemos proteger melhor a população —que muitas vezes se sente vilipendiada. É necessário derrubar os muros invisíveis do Parlamento, sermos mais acessíveis, para assim acolher as demandas reais do Brasil.

Após 22 anos de tramitação, aprovamos sob minha relatoria, em 2023, a Lei Orgânica das Polícias Militares e dos Bombeiros Militares. Também aprovamos a Lei Orgânica dos Policiais Civis, depois de 17 anos de tramitação. São medidas que trazem reconhecimento a esses profissionais e trazem diretrizes para as forças em todo o país.

Ainda temos muito que avançar, principalmente na construção de polícias mais humanas e eficientes. Nesse sentido, tenho orgulho de ser autor da proposta, aprovada no Senado, que determina a inclusão de conteúdos de direitos humanos —como a proteção aos princípios democráticos e o combate ao racismo, à violência de gênero e à xenofobia— nos cursos de formação e capacitação de agentes de segurança pública ou privada.

Juntos, teremos de lutar para trazer de volta a razão. Ao contrário do que essa onda reacionária falsamente alega, o aumento de penas sem nenhuma lógica não resolve. Na Comissão de Segurança Pública, quiseram aumentar de 5 para 19 anos a pena para estelionato —um crime sem violência ou grave ameaça. Ora, o maior bem jurídico é a vida humana, e a pena para homicídio varia de 6 a 20 anos. Não é razoável que a pena para um crime patrimonial seja maior que a de homicídio. Com muito esforço, consegui chamar a atenção dos meus colegas, mas só concordaram em ajustar essa pena de estelionato para 12 anos.

O problema é que, curiosamente, a discussão emperra quando proponho também penas mais rígidas para os crimes de colarinho branco e de corrupção. São crimes que afetam milhares de vidas e retiram recursos da saúde e da educação. Por que ainda não são crimes hediondos? Nesses casos, entendo que hoje a legislação é branda demais e precisa ser revista, porque não ampara o Estado com normas responsáveis e realmente justas. Na prática, serve para criminalizar ainda mais a pobreza e a cor da pele.

Direitos humanos são conquistas da nossa civilização, acima de espectros ideológicos. Temos que proteger esse legado obstinadamente, da mesma forma com que temos que defender a Constituição, que estabelece segurança pública como um direito de todos e um dever do Estado.

Só dessa forma podemos avançar em direção a um país em que segurança pública seja tratada com a seriedade que merece: como um pilar fundamental na construção de uma sociedade livre, justa e solidária, que promova o bem de todos, sem qualquer forma de preconceito ou discriminação.

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