Em um mundo que segue esquentando, em guerra, com fome e concentração de riqueza crescente, seria mais fácil desacreditar a ONU. Mas teria sido pior sem ela. Assim como será muito melhor com ela, se consertada para o futuro.
A Organização das Nações Unidas foi criada logo após a Segunda Guerra Mundial para "preservar as gerações vindouras do flagelo da guerra, unir forças para manter a paz e a segurança internacionais e promover o progresso econômico e social de todos os povos". É o que está no preâmbulo de sua Carta, datada de 1945. No documento, lê-se o "econômico" 38 vezes, e o "social", 33. E, até hoje, o "ambiental" segue sem menção alguma. Zero! Visivelmente a ONU não está dando resposta à altura face a maior ameaça de todos os tempos: a das mudanças climáticas.
Como consequência, o fracasso no enfrentamento da aniquilação da biodiversidade, desertificação e emergência climática está intensificando secas e chuvas torrenciais, ondas letais de calor, incêndios florestais, deslocamentos populacionais por elevação do nível do mar e por eventos meteorológicos extremos, conflitos por água e demais recursos escassos, colapso dos recifes de corais e de cardumes por sobrepesca, aquecimento, desoxigenação e poluição dos oceanos, diminuição de espécies polinizadoras, com queda potencial da produtividade agrícola e quebras recorrentes de safras, redundando em carestia e insegurança alimentar.
Essas crises trarão mais sofrimento e mortes também por incidência de câncer, dada a ação de perturbadores endócrinos, além de mais pandemias e zoonoses decorrentes da destruição continuada dos habitats selvagens. Desde 2007, o boletim do Atomic Scientists declara que "os perigos representados pelas mudanças climáticas são quase tão terríveis quanto os representados pelas armas nucleares".
Problemas globais demandam governança global. Só que o sistema institucional da ONU ainda é insuficiente frente à urgência climática. Os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança concentram todo o poder da ONU e são os maiores emissores de CO2. É inegável a importância das COPs pelo diálogo entre povos, setores, ciência, valores civilizatórios e caminhos para a descarbonização. No entanto estão longe de produzir os resultados necessários. Suas decisões precisam ser empoderadas. A lógica segue baseada em compromissos voluntários, não satisfatoriamente mandatórios, nem vinculantes. Não cumprir metas não implica sanções.
Se a ONU foi criada para ser a condutora da governança global, é urgente uma nova ordem mais adequada aos novos tempos. Isso pode ser possível através do artigo 109 da sua Carta, que prevê a instalação de uma grande conferência para revisá-la por maioria simples das nações membros e sete países quaisquer do Conselho de Segurança (como são 15 no total, não precisaria dos permanentes para tal alteração).
Essa revisão poderia ter como objetivo de incorporar os termos, as regras e reformas para uma efetiva governança global do clima. O governo e a sociedade brasileira poderiam abraçar e liderar tal causa, conclamando governos, organizações sociais e científicas a apoiar tão importante e vital iniciativa.
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