Paga-se muito imposto no Brasil, o que é um fato sabido, e dados recém-divulgados indicam que nunca se pagou tanto quanto no ano passado. Leituras precipitadas ou oportunistas dos números, no entanto, tendem a produzir decisões desastradas como as que já ensaia o governo Jair Bolsonaro (PL).
Segundo cálculo do Tesouro Nacional, a carga tributária —correspondente à arrecadação de União, estados e municípios como proporção da renda nacional— chegou a 33,9% do Produto Interno Bruto, um patamar sem dúvida elevado para um país emergente.
Percentuais mais altos, chegando a rondar os 45% do PIB, praticamente só são encontrados em países europeus mais ricos e de histórico social-democrata, como França, Suécia e Itália. A carga brasileira supera a de potências econômicas como Estados Unidos e Japão.
Isso dito, cumpre qualificar o recorde do ano passado —uma alta de mais de 2 pontos percentuais sobre os 31,77% de 2020.
Esse aumento não se deveu a alguma ofensiva do governo em busca de receita, à criação de tributos nem a aumento de alíquotas. Trata-se, principalmente, de um efeito da retomada de atividades após o pior momento da pandemia.
Em recuperações assim, não é incomum que a arrecadação cresça por algum tempo em ritmo superior ao do PIB. Nesse caso, partiu-se de uma base muito deprimida: a carga de 2020 foi a mais baixa medida desde 2010, quando começa a série estatística do Tesouro.
Com outras fontes, nota-se que o indicador tem variado pouco desde meados da década de 2000, após forte elevação no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e no início do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
É no mínimo precipitado, pois, concluir que a arrecadação vá subir continuamente —e, pior ainda, imaginar que haja dinheiro sobrando no governo. Conceder generosos benefícios tributários a esta altura, como se começa a fazer com o IPI, vai elevar um déficit orçamentário já excessivo.
Sem um controle da despesa e da dívida pública, a margem para cortar a carga tributária é estreita. Pode-se, sim, melhorar sua distribuição, reduzindo o peso dos impostos sobre o consumo e ampliando o da taxação direta da renda.
Essa reforma deve privilegiar normas estáveis e compreensíveis a todos, em vez de benesses distribuídas a setores escolhidos a dedo pelas autoridades de turno.
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