O recuo do ex-juiz Sergio Moro na disputa pela Presidência da República em outubro e a comédia de erros encenada pelo tucano João Doria para manter-se na corrida pelo Planalto acentuam a contraposição entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o atual mandatário, Jair Bolsonaro (PL).
A força gravitacional dos dois polos por ora vai destruindo ou enfraquecendo tudo o que possa ameaçar o seu protagonismo, numa espécie de profecia que se autorrealiza —a expectativa de mau desempenho estimula a defecção e subtrai apoio dos desafiantes, o que por sua vez reforça a polarização.
No caso de Moro, que com 8% das intenções de voto apareceu empatado na terceira colocação com Ciro Gomes (PDT) no mais recente Datafolha, a redução de ambições foi drástica. Trocou o Podemos pela União Brasil e agora pode disputar uma vaga de deputado federal no estado de São Paulo.
Dá uma vez mais vezo o ex-julgador da Lava Jato a quem o critica por ajustar-se docilmente a conveniências mesquinhas da política. Deixou a magistratura para ser ministro de Bolsonaro; muda de partido como quem troca de camisa; abala-se para a opção que mais facilmente lhe assegure um cargo nos próximos quatro anos.
É possível também que a capitulação de Sergio Moro reflita em parte o cálculo de otimização de bancadas de que se ocupam as legendas. Quem não tem candidato presidencial forte para impulsionar a eleição de deputados inclina-se a aliar-se com mais fluidez nos estados e a gastar mais com campanhas de postulantes ao Legislativo.
Fluidez, aliás, abundou nas oscilações vertiginosas do governador paulista em torno de seu destino político nesta quinta (31). O dia começou com a notícia de que ele desistiria de concorrer ao Planalto, sairia do PSDB e cumpriria até o final o seu mandato no estado.
Terminou com tudo isso desfeito e o plano original retomado, numa autêntica "guinada de 360 graus".
Se não passou de subterfúgio para solidificar o apoio de seu partido, rachado, e atrair atenção para seu discurso de despedida, o tiro pode ter saído pela culatra. O João Doria que saiu desse episódio rocambolesco inspira ainda menos confiança do que o que nele entrou, marcando 2% no Datafolha.
Pela primeira vez na República, ao que tudo indica, disputarão o cargo político mais elevado do país um ex-presidente e o presidente na função. São, ademais, duas figuras populares, sobejamente conhecidas do eleitor. Seria normalmente dificultoso uma outra candidatura competir nessas condições.
A escassez de opções, porém, não é boa para o Brasil, que só viu crescer nos últimos anos a pilha de obstáculos ao seu desenvolvimento.
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